Quando o café veio para Portugal os clientes do café “A Brasileira”, em Lisboa, queixavam-se diariamente que o café era extremamente amargo. O dono do estabelecimento após matutar no assunto, no final do dia de trabalho ao encerrar o estabelecimento, chegou a uma conclusão: colocar um letreiro grande à frente do café com a palavra BICA. Na manhã seguinte um cliente habitual bastante intrigado, com tal letreiro, questionou-o sobre o seu significado. O dono do estabelecimento, após tirar um café e com um sorriso de orelha a orelha, disse-lhe: “Aqui tem o seu cafezinho amigo, mas, por favor, Beba Isto Com Açúcar”. Depois da explicação, ambos sorriram. Assim nasceu a famosa “BICA”.
Nunca fiz, nem pretendo fazer, nenhuma pesquisa aprofundada relativamente à veracidade desta história pois, como foi contada por um grande amigo meu e gostei tanto da explicação, vou considerá-la como uma verdade inquestionável.
Hoje, para além da “BICA”, existem mil e uma maneiras de pedirmos um café. Pode ser, “normal”, “cheio”, “curto”, “pingado”, “sem princípio”, “sem fim”, “sem princípio e sem fim”, “em chávena escaldada”, “em chávena fria”, “com gelo”, “com açúcar”, “sem açúcar”, “cimbalino”, “cafezinho” ou simplesmente “um café, por favor”. Certamente que no seu dia-a-dia se revê numa destas palavrinhas mágicas.
A International Cofee Organization em 2016 estudou o consumo de sacos de café entre 2012 e 2015 no mundo. Olhando para os dados da Europa, deparamo-nos com um consumo de 50,1 milhões de sacos de 60 kg de café. Segundo o mesmo relatório, existiu um aumento de 0,4% do consumo desde 2012 até 2015. Felizmente que estes sacos consumidos não tem todo o mesmo destino, “As Cápsulas”.
Entre comigo numa aventura simples.
Imagine uma empresa com 50 trabalhadores que labora 5 dias por semana e que tem na sua copa uma máquina de café de cápsulas. Destes 50 trabalhadores, 40 bebem café sendo que, 30 bebem 2 cafés por dia e os restantes 10 bebem apenas 1 café por dia. Resumidamente: no final do dia são consumidos nessa empresa 70 cafés (30×2 + 10×1). No final da semana são consumidos 350 cafés (70×5), no final de um mês 1.400 cafés (350×4) e no final do ano 16.800 cafés (1.400×12).
O problema não está no facto de os trabalhadores tomarem café aliás, até existem estudos internacionais que afirmam que o consumo desta bebida ajuda na prevenção do Alzheimer. O grande problema está na quantidade de resíduos produzidos e acima de tudo na grande complexidade da sua reciclagem.
Uma simples cápsula é constituída, variando de marca para marca, por: 1g de alumínio; 4g de plástico e 3g de borras de café. Se cruzarmos estes dados com as cápsulas consumidas anualmente na empresa – 16.800 – obtemos as seguintes quantidades de resíduos produzidos: 16.8 Kg de alumínio, 67.2 Kg de plástico e 50,4 Kg de borras de café. Ficou surpreendido com a quantidade de resíduos produzidos? Agora imagine em todas as empresas e em nossas casas. Bem, até assusta!
Com as formações e as campanhas que nos últimos anos surgiram em Portugal, os trabalhadores das empresas e a população em geral estão devidamente consciencializados e educados para o tema da reciclagem. É verdade que, pela complexidade em separar cada um dos resíduos de uma só cápsula torna-se uma missão impossível e o mais fácil e apetecível é coloca-la “onde calhar”. Tendo consciência que apesar de existirem lojas que aceitam estes resíduos, a grande percentagem destas cápsulas não entram novamente no circuito. Ou seja, não são reciclados.
John Sylvan que inventou as cápsulas K-Cup em 1995, tendo vendido a patente em 1997 à empresa Keurig Greeb Mountain, atualmente “sente-se mal” pelas consequências ambientais causadas pelas cápsulas. Hoje, a polémica em torno das cápsulas está na ribalta depois de ter sido lançada uma campanha intitulada “Kill the K-Cup”, que acusa a empresa de ter produzido cápsulas suficientes para dar a volta à Terra 10,5 vezes anualmente. Veja AQUI.
Infelizmente, em Portugal este é um assunto que não tem sido debatido na praça pública. Não existindo, para já, uma cápsula 100% amiga do ambiente e olhando para o problema de frente, no meu ponto de vista, poderão existir três soluções que surtiram efeitos a curto prazo: 1) fomentar através da comunicação social, numa linguagem simples e acessível, que a cápsula de café, quando não entregue nos locais específicos, a longo prazo, tornar-se-á “inimiga ambiental”, 2) aumentar o iva deste tipo de produtos com o objetivo de minimizar o consumo e 3) como o Estado deve dar sempre o exemplo, através de legislação específica, proibir a utilização de cápsulas de café nas empresas públicas, seguindo assim o exemplo da cidade de Hamburgo, a segunda maior da Alemanha.
Até lá, se beber café na “inimiga ambiental” – a cápsula -, por favor, não se esqueça no final da semana ou do mês, entregar as suas cápsulas em fim de vida nos depósitos das lojas específicas. Caso não exista nenhuma loja por perto, e como último recurso, no ecoponto amarelo.
Bom café ou se preferir, “Boa BICA”.
Este artigo é da exclusiva responsabilidade do autor.