Covid-19: Comerciantes da Guarda reabriram lojas com receio e sem “grande esperança” no negócio

Alguns comerciantes do centro histórico da cidade da Guarda reabriram hoje as portas dos estabelecimentos com “nervosismo”, com receio de contaminação da covid-19 e sem “grande esperança” nas vendas.

Depois de uma paragem nos negócios decretada pela situação de emergência vivida no país, vários comerciantes da zona mais antiga da Guarda regressaram hoje ao trabalho e abriram as lojas a um período de “incertezas” e marcado por cuidados redobrados em termos de segurança.

“Estou muito nervosa. Estou na loja há 30 anos e nunca vivi uma situação destas”, disse à agência Lusa Cristina Godinho, de 50 anos, funcionária da loja de artigos para desporto “Nova Era”.

A mulher, que hoje de manhã, antes da abertura de portas, limpou, lavou e desinfetou o estabelecimento, disse que toma todas as medidas de segurança recomendadas, mas sente “insegurança em relação aos clientes”, apesar de só deixar “entrar uma pessoa de cada vez e com máscara”.

Em relação ao negócio, Cristina Godinho disse que a firma perdeu muito dinheiro por ter encerrado, indicando, como exemplo, que tem artigos de futebol “ainda nas caixas” que não foram levantados pelos clientes.

Mesmo em frente da “Nova Era” fica a “Retrosaria do Senhor Manuel”, fundada em 1963, que agora pertence a uma jovem, Joana Serrão, de 25 anos.

A comerciante reabriu a porta da loja “um bocadinho como se fosse a primeira vez”, porque sente “muita preocupação” com o futuro, por “não saber se as pessoas virão, se vêm preparadas e como é que isto vai ser, se os comércios já ficam sempre abertos ou se voltam a encerrar”.

A modista Helena Maia, de 64 anos, contou à Lusa que regressou hoje ao ateliê de costura na Rua Rui de Pina “sem vontade” para trabalhar e para encarar os próximos tempos.

“Estou sem vontade, porque trabalho para casamentos e festas e isso não vai acontecer durante este ano. Nos próximos meses, não tenho esperança no negócio e o maior problema são as despesas, que são certas”, disse a mulher, que começou a ocupar o tempo a fazer máscaras reutilizáveis em tecido.

Preocupada com o futuro, garante, vencida pela incerteza que, se não tiver clientela, irá continuar a fazer máscaras “nem que seja só para pagar as despesas”.

Quem não tem “mãos a medir” para tanto cliente é o barbeiro Norberto Coelho, de 67 anos, estabelecido há 33 anos na Rua Francisco de Passos, também conhecida como Rua Direita.

O barbeiro começou hoje a receber “os clientes que já tinham marcação” e garante que não vai ter descanso: “Para hoje, já tenho tudo marcado e para amanhã [terça-feira] também já está tudo”.

No setor do pronto-a-vestir, o desalento é transmitido por António Gonçalves, de 60 anos, proprietário de três lojas na cidade, que fecharam no dia 16 de março.

O empresário, que a Lusa encontrou a preparar a loja “Lanidor”, na Rua do Comércio, para a reabertura, conta que teve “um prejuízo enorme”, pois as coleções de verão “não se vendem e é preciso pagá-las”.

António Gonçalves diz que ainda “tem esperança”, mas vaticina que as dificuldades “continuarão cada vez mais, porque as pessoas estão confinadas e têm medo e receio”.

António Lopes, de 73 anos, também regressou ao balcão da “Casa do Bom Café”, situada no Largo da Sé, com alguma “expectativa”.

“Temos que encarar as coisas como elas são e temos que fazer os possíveis por não desanimar”, disse o comerciante que logo de manhã se dedicou a moer café para clientes que “já tinham saudades” do produto.

António Lopes, que gere uma casa com 95 anos, lembra que no período da Páscoa teve “o grande prejuízo”, porque fez um grande investimento em amêndoas e não as vendeu.

Quem se deslocou hoje à loja propositadamente para comprar amêndoas foi Sara Reis. “Já tinha saudades das amêndoas, porque na Páscoa não as dei a quem as devia ter dado. Levo um quilo para distribuir e para ajudar o senhor Lopes a despachar estas amêndoas”, justificou, acrescentando que também “já tinha saudades de poder andar na rua”.

A mulher assume que não se sente segura a 100%, mas alerta que as pessoas não podem “entrar em pânico” por causa da doença da covid-19.

Também Celeste Boavista saiu hoje de casa com a neta para ir às compras. “Já tinha saudades de ver as lojas abertas”, disse a mulher que circulava na Rua do Comércio onde, durante a manhã, o movimento de pessoas foi reduzido.


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