O trabalho representa um dos mais conceituados ícones das sociedades ocidentais actuais, uma vez que proporciona aos cidadãos os contextos indispensáveis ao seu sustento, bem como patenteia a “etiqueta” dos mesmos perante a sociedade. Todavia, em diversas ocasiões o ambiente no qual o trabalho é executado e desenvolvido é qualificado como bastante desagradável ou desadequado.
As empresas que perfilham uma dinâmica que aprecia em demasia a competição e o autoritarismo, apesar de o trabalho desenvolvido ter como alicerces algumas equipas, têm mais propensão para a edificação de ambientes de trabalho pouco sadios. Inúmeras organizações têm vindo a implementar normas e ritmos de trabalho com a singular finalidade do lucro. O planeamento do trabalho com a organização hierárquica, repartição de funções, turnos de trabalho, intensidades, espaços físicos, equipamentos, unissonâncias e comprometimentos desmesurados constituem condições que colaboram consideravelmente para desacorrentar um conjunto de perturbações aos colaboradores, tanto de cariz físico, como psicológico. Será que a competição acerada presente na sociedade capitalista em que vivemos não contribui para o aumento dos índices de insegurança e instabilidade em relação ao emprego? Será que as carregadas listas de desemprego que assolam a generalidade das Nações não espelham a volubilidade económica contemporânea?
Infelizmente, a procura destravada pelo poder metamorfoseia o íntimo de alguns cidadãos. Esta conjuntura contribui para a edificação de ambientes de trabalho desacordantes, negligentes e sem escrúpulos. Em algumas empresas, as dissemelhanças sociais, étnicas, físicas, psicológicas, culturais e políticas dos colaboradores transformam o local de trabalho num autêntico e pardacento lugar de segregação e aviltamento.
Em qualquer posto de trabalho, surge, com mais ou menos intensidade, a convergência de inúmeros riscos, delineamentos e acometimentos que acabam por influenciar a saúde física e mental dos trabalhadores. Será que o ambiente de trabalho nas empresas progride na direcção de atender e considerar as expectativas, contextos de conforto e enigmas dos colaboradores?
A evolução da inquietação com a saúde ocupacional escolta o entendimento e o aperfeiçoamento do conceito geral de saúde pública. O assédio, a perseguição, a violência e a crueldade contra a moral dos empregados constituem procedimentos tão antigos quanto o próprio labor. Contudo, esses “exercícios” tornaram-se cada vez mais enérgicos, graves e abrangentes. Será que os contratos de emprego não necessitam de uma meditação especial? Será que o grau de subordinação, adjacente aos mesmos, está correcto e “superiormente” explicado?
O assédio moral não está circunscrito unicamente à circunferência “civil”, podendo granjear as mais desiguais correspondências sociais. O assédio moral no local de trabalho ocorre quando um determinado trabalhador está subordinado a comportamentos capazes de imolar, desconsiderar, abreviar e amedrontar a sua auto-estima. As acções praticadas pelo assediador provocam sulcos para a saúde física e mental do assediado e, em certos casos, a perda do próprio emprego. Neste contexto, podemos afirmar que é de colossal relevância a compreensão deste fenómeno dentro das organizações.
Geralmente, os comportamentos do assediador estão intimamente associados ao abuso de poder ou ao seu uso impróprio. Será que o assédio moral é uma temática bastante discutida em sede doutrinária? Como ocorre o assédio moral? Quem são as vítimas? Quais as particularidades das mesmas? Quem são os agressores? Quais as características dos mesmos? Quais são os objectivos que rodeiam o assédio? Quais as suas consequências? Quais são os comportamentos a adoptar para aniquilar o assédio? Que protecção legal existe em relação ao assédio? Será que essa protecção é suficiente? Que tipos de assédio existem? Será que o assédio é mais comum em organizações de estrutura inflexível e discriminatória? Será que algumas práticas que ocorrem nas empresas não são confundidas com o assédio? Será que as mulheres são mais assediadas que os homens? Será que existem diferenças nos formatos de resistência e de reacção? Será que as questões culturais influenciam a resposta à agressão?
O desacordo no assédio agasalha alguns traços de subtilidade, pois a comunicação aos poucos vai ficando mais longínqua, começando a comparecer um conjunto de desfigurações e desconsiderações na linguagem. O agressor, ao pressentir que a sua vítima está a tentar resistir, passa a encurralá-la, surgindo, de modo claro e cinzento, o assédio moral. Este comportamento desprezível pode aconchegar agressões, ameaças, jogos sórdidos, vitupérios, manipulações, mentiras e enredos, condições que contribuem para quebrar as pontes entre o assediado e os restantes colegas. Será que existem elevadas doses de preocupação social no seio das empresas? Será que a cultura empresarial não promove exclusivamente a competição e os respectivos resultados financeiros?
O enquadramento legal em Portugal hospeda múltiplas nascentes de direito que protegem as vítimas de assédio moral. Será que o assédio moral é “juridicamente” importante? Será que a legislação sobre esta matéria não é ambígua e inconsequente? Será que na Constituição da República Portuguesa está consagrado, de modo cristalino e justo, o direito à integridade moral e física dos cidadãos? Será que o assédio moral, não ofende um bem constitucional?
Na verdade, a procura incessante de índices cada vez mais avantajados de eficácia e produtividade nos encadeamentos produtivos, confederada à globalização da economia, nunca poderá servir para justificar a desconsideração em relação aos valores sociais do trabalho. Com a finalidade da manutenção no mercado, as empresas não costumam desenvolver completas, profícuas e abrangentes políticas de gestão. Normalmente esta “indumentária”, por impulsionar franzinos ambientes de trabalho, consegue promover e propagar o assédio moral. Será que o Poder Legislativo não deve aligeirar a aprovação de uma lei mais específica sobre esta temática? Será que os funcionários não necessitam de uma protecção mais desafogada contra as ofensas psicológicas? Será que a deterioração do ambiente de trabalho não constitui uma condição que viaja no sentido oposto do da eficiência?
Existem inúmeros contextos para o aparecimento do fenómeno assédio moral como sejam: a personalidade e as características físicas do assediado; o carácter do assediador; o grupo no qual se interserem; e a cultura organizacional onde desenvolvem o seu trabalho. Na realidade não há um perfil psicológico padrão das vítimas, existem seguramente conjunturas profissionais nas quais os comportamentos de assédio moral podem derramar com maior facilidade e espontaneidade. Será que o assédio moral pode acontecer a qualquer trabalhador?
O assédio moral acarreta consequências nocivas em diversos níveis: colaboradores; empresas; e sociedade. Todavia, podemos asseverar que a sociedade constitui um dos níveis mais atingidos, uma vez que em diversas circunstâncias o assédio moral é acompanhado por altíssimos custos que estão ligados a hospitalizações, fármacos, atestados médicos por incapacidade, escassa produtividade e aumento do desemprego. Será que esta situação não é uma verdadeira e preocupante perda de recursos humanos?
A ressonância social que o assédio moral alcança no meio laboral contribui para um expressivo aumento do número de acções nos tribunais. Será que com o constante aumento dos casos de assédio moral não estará, num breve período de tempo, comprometido o desenvolvimento da sociedade? Será que as repercussões negativas que o assédio moral transporta não são extremamente difíceis de computar? Será que não é oportuna a concepção de uma moldura legal que defenda a saúde mental e física dos trabalhadores e que simultaneamente obrigue as entidades patronais a criar e conservar benignos “teores” de trabalho?