Homem de 73 anos é o último tamanqueiro de Pinhel, onde o ofício já teve grande expressividade

Um sapateiro reformado de 73 anos é o último artesão tamanqueiro da aldeia de Alverca da Beira, no concelho de Pinhel, distrito da Guarda, onde o ofício teve grande expressividade até meados do século XX.

Armando Santos foi sapateiro em Lisboa e quando se reformou, há oito anos, regressou à terra natal, onde decidiu dar continuidade a uma arte que está em vias de desaparecer.

O artesão fabrica tamancos (para os homens) e tamancas (para as mulheres) com a colaboração de António Almeida, também reformado, de 75 anos, que sempre esteve ligado à feitura dos “paus” utilizados nas solas, pois trabalhou para as três fábricas do setor que existiram na localidade.

“Sou o último [tamanqueiro], mas espero que não seja. Mas, neste momento, sou”, disse à agência Lusa Armando Santos, contando que foi um antigo artesão da terra, já falecido, que lhe deu “umas luzes” sobre a arte.

O antigo sapateiro refere que gosta “muito” de fazer tamancos e que a sua função consiste em juntar o cabedal aos “paus” utilizados no fabrico daqueles sapatos tradicionais.

“Começa tudo com o corte. A escolha da pele, depois o talhar, o coser, alinhavar e acabar. Leva muito tempo”, disse, admitindo que o fabrico de um par levará “três ou quatro horas”.

Armando Santos faz a segunda fase da produção dos tamancos, pois a primeira está por conta do “pauzeiro” António Almeida, que faz os moldes em madeira, a partir de troncos de amieiro.

“Antigamente, fazia 15 pares por dia”, referiu o artesão à Lusa, contando que “um par de ‘paus’ leva mais de uma hora a fazer”.

Os “paus” que vai fazendo “a pouco e pouco”, dão “muito trabalho” e exigem muita paciência, disse.

Os dois artesãos não produzem tamancos para venda ao público, sendo apenas comercializados anualmente, na Feira das Tradições, em Pinhel, no expositor da Junta de Freguesia de Alverca da Beira/Bouça Cova, a 60 euros (tamancos) e a 30 euros (tamancas).

“Embora isto não se use, as pessoas gostam de ter. Compram mais por saudade”, justificou Armando Santos.

O presidente da Junta de Freguesia, Pedro Ruas, disse à Lusa que, se depender da autarquia, a arte da tamancaria não desaparecerá de Alverca da Beira, admitindo contactar o Instituto de Emprego e Formação Profissional para ajudar a “incentivar os jovens a pegar outra vez nesta arte”.

Em sua opinião, a continuidade da tamancaria “é importante para o concelho, para a freguesia e até para o país”.

“Com a falta de emprego que há, até pode ser que seja o meio de sobrevivência dos jovens que queiram pegar nisto”, referiu.

O tamanqueiro Armando Santos gostava que os jovens se interessassem pela profissão: “Se depender de mim, isto não morre, assim haja quem queira seguir”.

O “pauzeiro” António Almeida também se prontifica a ensinar os mais novos, mas adverte que “isto tem muito que se lhe diga”.

Pedro Ruas, o autarca local, deseja que o ofício volte a ter a pujança de outrora, quando a terra era conhecida como “o paraíso das mulheres e o inferno dos cavalos”, porque “as mulheres só cozinhavam para os homens que estavam nas tamancarias” e os cavalos “andavam sempre carregados com tamancos para as feiras, para um lado e para o outro”.


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