A chegada dos Sorraias ao Grande Vale do Côa

Uma manada de dez cavalos Sorraia chegou ao Vale Carapito (Vilar Maior) no primeiro fim de semana de maio.

O primeiro passo para recuperar a importância que estes grandes herbívoros têm na gestão e modelação da paisagem. Esta raça autóctone tem apenas cerca de duas centenas de indivíduos contabilizados em todo o mundo.

Um marco importante para o rewilding no Grande Vale do Côa
O passado dia 1 de maio ficou marcado como um momento importante para os esforços de conservação e rewilding levados a cabo pela Rewilding Portugal e parceiros, no território nacional. O Vale Carapito, localizado em Vilar Maior (concelho do Sabugal) e propriedade da Rewilding Portugal, recebeu os seus primeiros grandes herbívoros, uma manada de cavalos Sorraia, uma raça autóctone portuguesa. Esta manada de dez animais irá viver em estado semisselvagem, e terá um papel fundamental na transformação da paisagem. O impacto destes animais vai ser estudado para demonstrar os resultados da abordagem rewilding de conservação da natureza.

Para marcar este momento, foi realizada uma cerimónia de libertação dos cavalos na propriedade que, cumprindo todas as normas de saúde pública atualmente em vigor, contou com muitos interessados presentes, individuais e em representação de entidades que não quiseram perder a oportunidade de ver a libertação destes animais no seu habitat natural, e o primeiro momento da sua nova vida em estado semisselvagem. Um grande momento também para a comunidade local, que pôde ver as novas dinâmicas que a filosofia de rewilding está a trazer à região e mais concretamente à sua aldeia. O evento começou com pequenos discursos de Pedro Prata, líder de equipa da Rewilding Portugal, assim como do presidente da União de Freguesias de Aldeia da Ribeira, Vilar Maior e Badamalos, António Cunha, e ainda do vice-presidente da Câmara Municipal do Sabugal, Vítor Proença.

Pedro Prata, assinalou a ocasião, referindo “Os grandes herbívoros são fundamentais na gestão dos ecossistemas e promoção da biodiversidade. Hoje assinalamos um marco importante para a equipa da Rewilding Portugal, que está de parabéns pelo excelente trabalho neste projeto.”. Já para a junta de freguesia, este momento “trouxe uma nova vida à freguesia, dinamizando a região e atraindo pessoas”. Também Vítor Proença destacou a importância de iniciativas como esta, referindo que estas “valorizam ainda mais o incrível património natural que o concelho do Sabugal tem à sua disposição, principalmente na zona de Vilar Maior”.

Os Sorraia passaram a noite restritos a um cercado e foram libertados no sábado no Vale Carapito, prontos a cumprir o seu papel de grandes herbívoros. Em corrida ritmada, passaram em redor do considerável grupo de pessoas presentes e seguiram o seu caminho. Um sinal de esperança para a natureza em Portugal e mais uma prova de que existe um novo caminho para a sua conservação através duma abordagem rewilding.

O cavalo Sorraia e a sua função
O cavalo Sorraia, raça autóctone portuguesa, tem uma população de apenas cerca de 200 exemplares em todo o mundo. Por esse mesmo motivo, a escolha desta manada de dez espécimes para o Vale Carapito consiste num esforço e contributo para a sua conservação e valorização. Estes vieram da Reserva Natural do Cavalo Sorraia, situada em Alpiarça, um importante centro de valorização desta raça.

Tido como uma reminiscência do ancestral selvagem do cavalo ibérico, o Cavalo Sorraia tem este nome por ter sido uma espécie recuperada a partir dum núcleo de animais que foi encontrado no vale do Rio Sorraia, em Coruche. São cavalos de pequena estatura (1.44 a 1.48m em média), com uma pelagem de baio pardo ou rato, com lista de mulo e maior ou menor evidência de zebruras na cabeça e nos membros. No caso da manada agora a habitar no Vale Carapito, existem oito fêmeas e dois machos, sendo que cinco deles são já adultos, enquanto os restantes são potros ou juvenis. Também são diferentes quanto à sua pelagem, já que dois deles são baio pardo, enquanto os restantes são rato.

Os Sorraias são cavalos selvagens extremamente resistentes às condições ambientais, algo que herdaram dos seus primitivos ancestrais, cuja função se pretende recuperar nos ecossistemas. Enquanto herbívoros, têm um papel fundamental, porque ajudam a modelar a floresta, mantendo pastagens e áreas abertas, através do pastoreio natural. São ainda ótimos aliados para diminuir o risco de incêndios florestais e rurais, uma das maiores ameaças em Portugal que se tem agravado nos últimos anos.

O objetivo atual passa por continuar a utilizar esta espécie e as suas funções semisselvagens enquanto grande herbívoro, pois têm uma enorme importância no consumo e gestão da biomassa, criando novos mosaicos na vegetação.

Vale Carapito, nova área rewilding
O Vale Carapito, uma propriedade adquirida pela Rewilding Portugal para executar ações de conservação que reforçam o corredor ecológico do Grande Vale do Côa, é a nova área de aplicação prática de rewilding em Portugal. Localizada perto de Vilar Maior, promete ser o novo mostruário dos benefícios que o rewilding tem para a natureza e quais os resultados que pode atingir em escalas cada vez maiores. Além disso, para além da renaturalização da paisagem e dos ecossistemas, terá ainda uma importante função de turismo baseado na natureza e sustentável, com o objetivo de ser um verdadeiro showcase de aplicação de rewilding e dos seus efeitos.

Outro ponto muito positivo a destacar tem sido a adesão da comunidade local, nomeadamente das entidades oficiais da freguesia, que têm apoiado a Rewilding Portugal e respetivos parceiros em todas as ações dos seus projetos quando necessário, demonstrando recetividade em ajudar nesta missão de tornar esta região de Portugal num lugar mais selvagem e natural, e atrair turismo de natureza sustentável e de qualidade, fazendo com que a região se destaque pelos melhores motivos para se tornar escolha regular dos visitantes. Através das ações de promoção do território e das suas mais valias, num âmbito que respeite a conservação de natureza a ser levada a cabo neste local, desenvolvidas pela Rewilding Portugal, existem possibilidades muito interessantes de o Vale Carapito contribuir ativamente para valorizar este território, apoiando os tecidos económicos e sociais locais.

Várias ações de conservação já ocorreram nos últimos meses, nomeadamente a monitorização de flora e fauna, para estudar a biodiversidade vegetal e animal da propriedade, assim como da paisagem e dos solos, algumas delas com o apoio da Terra Prima. O objetivo destas ações de monitorização é conhecer o território em que nos encontramos a trabalhar e poder comparar níveis atuais com os níveis após aplicação de medidas de rewilding (passivo ou de gestão ativa em casos específicos). Estão ainda planeadas ações de promoção de pastoreio natural, através da utilização de herbívoros em estado semisselvagem; ações de remoção de estruturas obsoletas, que funcionam como barreiras para a fauna selvagem da região; ações de controlo de espécies invasoras; ações de gestão ativa de combustível e ainda ações de vigilância do território.

De acordo com Pedro Prata, Líder de Equipa da Rewilding Portugal, “Este trabalho em Vilar Maior é o primeiro passo concreto no terreno de uma estratégia de conectividade do corredor ecológico do Grande Vale do Côa. O nosso trabalho aqui vai permitir afinar a estratégia de renaturalização a nível da paisagem.”

O projeto Promover a Renaturalização do Grande Vale do Côa é financiado pelo Endangered Landscapes Programme, que é gerido pela Cambridge Conservation Initiative e financiado pela Arcadia, um fundo de caridade de Peter Baldwin e Lisbet Rausing.

Este projeto é realizado em parceria pela Rewilding Portugal, Rewilding Europe, ATNatureza, Universidade de Aveiro e Zoo Logical.


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