Em Portugal, a greve é um direito potestativo apoiado pela própria lei, ou seja é um direito que não admite contestações. Será que a greve não pode ser contemplada como uma espécie de entidade com natureza jurídica mista na circunferência mundial? Será que a mesma não é um acto jurídico? Será que o objecto do direito de greve não é a sua concretização?
A greve é um direito “aplaudido” no texto constitucional, sendo permitido aos colaboradores decidir sobre a oportunidade ou vontade de executá-lo. Os propósitos da greve acabam por ser: o aumento salarial; a garantia dos direitos sociais dos trabalhadores; a participação dos funcionários nas políticas elaboradas pelos empregadores; os superiores contextos físicos de trabalho; a salvaguarda das garantias constitucionais; a edificação de serviços sociais dentro das instituições que zelem pelos funcionários; a procura de melhores condições no sistema de produção; a comunicação ascendente no seio das organizações; a prevenção de acidentes de trabalho; etc… Será que a greve agasalharia vigor, resistência e salvaguarda jurídica se fosse efectivada por um único indivíduo? Será que a greve é uma arma ou um fim?
A greve somente despontou, em configurações efectivas, com o aparecimento da revolução industrial. Começaram a edificar-se as associações profissionais e os movimentos estruturados. A conglobação das massas proletárias, sobrevinda do nascimento e desenvolvimento da indústria, coligada à precariedade e instabilidade da sua conjuntura socioeconómica frente à entidade patronal, propulsionada pela disseminação dos arquétipos e cânones socialistas, cooperaram para a constituição e solidificação das associações profissionais, que aclamavam a greve como meio de instruir os labutadores, de reclamar e de conquistar melhores contextos de labor. Será que não é na medula do grupo que a prática ou o exercício do direito de greve granjeará a sua finalidade final e principal?
Nos “desdobramentos” da greve existem direitos assegurados aos grevistas durante a greve como sejam: a proibição de a empresa perfilhar mecanismos sombrios para obrigar os empregados ao comparecimento nos postos de trabalho para laborarem; a interdição de violação ou de repressão sobre as garantias constitucionais; a proibição de mecanismos e paradigmas capazes de desarmar a vulgarização do movimento grevista; a obstrução da possibilidade de o contrato de trabalho ser anulado durante a greve; e a impossibilidade de a entidade empregadora contratar outros trabalhadores para colmatar o “espaço” daqueles que aderiram legitimamente à greve.
Aos trabalhadores que aderem à greve são asseverados direitos para o exercício da mesma, todavia aos grevistas também é exigido o cumprimento de determinadas incumbências com o propósito de contrabalançar as conveniências envolvidas no próprio movimento de greve. Nesse sentido, o emprego de instrumentos de indumentária violenta, com a finalidade de provocar prejuízos a bens e máquinas do empregador, é evidentemente interdito. Será que o exercício do direito de greve não se submete a determinados limites jurídicos?
A análise da eficiência dos princípios constitucionais necessita, rapidamente, de uma investigação rigorosa sobre as circunstâncias de aplicabilidade de certos vértices jurídicos, com o objectivo de clarificar algumas terminologias empregues nesta temática. Será que as normas não são unicamente lícitas quando se acomodam e adaptam com os imperativos da constituição? Quais são os critérios, por parte dos trabalhadores, para o legítimo exercício do direito de greve?
A greve pode ser degustada como um acontecimento social com consequências que impactam o espaço específico das correspondências de trabalho e, por essa razão, agasalha uma capacidade intempestiva capaz de revolucionar os alicerces que legitimam o exercício do poder. Ao longo dos tempos, a greve mereceu, por parte do sistema político, tratamento discriminado, começando pela interdição legal explícita, passando pelo seu exercício legítimo, até conquistar o estatuto de direito esculpido até nos textos constitucionais. Será que os princípios da liberdade e da igualdade não delimitam toda a estruturação jurídica? Será que a integração da greve, como direito dos trabalhadores, não foi escoltada por antinomias, conflitos e discórdias? Será que conhecemos verdadeiramente a dimensão daquilo que é o direito à greve? Será que, e apesar de ser profusamente utilizado o direito à greve, não existem algumas deficiências na sua interpretação? Será que existem estudos sistematizados, estruturados e pluridisciplinares suficientes sobre esta temática?
A conquista do direito de greve está intimamente associada com as reacções, resistências e acomodações provocadas pelos injustificáveis contextos de exploração do trabalho que distinguiram o período da revolução industrial e que acabaram por coincidir com o período de elevação e avigoramento do capitalismo como sistema hegemónico nos encadeamentos de produção das sociedades hodiernas.
Para compreendermos o direito à greve de forma pertinente e adequada a um arquétipo de Estado que alberga a ambição de edificar uma sociedade equitativa e solidária, e que procura desarraigar a pobreza, a segregação, os preconceitos e as disparidades sociais, impõe-se considerar não só o recheio histórico de construção e estabilização do direito à greve, como também os regulamentos constitucionais que direccionam o próprio ordenamento e são pressupostos essenciais de significação e emprego de todo o direito, de forma a garantir-se o esguardo ao lícito exercício da greve, sem atentar contra os direitos elementares da população.
Todas as conquistas de direitos, assim como a compreensão do direito de greve e as fronteiras da sua aplicação, sempre estiveram ligados a conjunturas históricas específicas, sejam de disposição jurídica, política, social ou cultural num género de altercação oculta entre o capital e o trabalho. Os trabalhadores procuram incessantemente melhores condições de vida, enquanto o capital procura persistentemente conservar a sua organização de produção.
Entretanto, Estado e sociedade civil procuram condições de vida adequadas e harmonizadas para toda a população, atingindo os objectivos delineados no texto constitucional, na sua extensa lista de direitos sociais. Na realidade, as greves, numa perspectiva comum, são inconvenientes, e em determinadas ocasiões angustiantes, aos utentes de serviços públicos, como transportes, saúde, saneamento e educação.
Objectivos difusos, extensos, colectivos e individuais de toda a sociedade são atingidos, em face da salvaguarda de conveniências de uma determinada classe ou categoria profissional. Essas conveniências, que também constituem direitos sociais, pois são direitos do trabalhador, acabam por entrar em conflito ou divergência com o pressuposto constitucional de materialização dos direitos sociais. Evidentemente, no âmago de uma sociedade democrática, o direito de greve não pode ser absoluto e irrestrito, devendo as suas limitações ser regulamentadas por lei. Logo, sem nunca se contestar o direito à greve, deve-se harmonizar o exercício da mesma aos princípios que superintendem a nossa comunidade política, para que possamos asseverar categoricamente, e em cada caso concreto, que o direito à greve está a ser concretizado sem qualquer temperamento abusivo ou excessivo.
Para terminar, realçar que as greves nos transportes colectivos provocaram sempre sisudos transtornos a uma densa parcela da população que necessita desses serviços, para se deslocar para a escola, para o trabalho ou até mesmo para férias. Na verdade, sem a existência de transportes colectivos “adequados”, particularmente nas grandes cidades, as actividades sociais imobilizam-se e a vida da colectividade pode metamorfosear-se numa autêntica desordem.
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.