Devido ao facto de a comercialização dos medicamentos contrafeitos não estar circunscrita ao País onde os mesmos são produzidos, a contrafacção de medicamentos representa um problema à escala mundial. A contrafacção de medicamentos é claramente um fenómeno em crescimento.
Neste sentido, podemos seguramente afirmar que a cooperação internacional no combate à contrafacção apresenta-se como “disciplina” fundamental. Infelizmente em inúmeros mercados, os medicamentos contrafeitos são comercializados não só no seio da cadeia de distribuição legal, como também na ilegal.
Será que a liberalização do comércio em todo o mundo não edificou contextos para que práticas como a falsificação e o mercado negro medrassem? Será que cada Estado, uma vez que se trata de um fenómeno que envolve todos os Países, não deve criar e perfilhar um conjunto de medidas capazes de amputar a entrada nas suas fronteiras de mercadorias que contundam a saúde das populações?
Será que a abertura ao comércio e a concepção de condições para pessoas e bens circularem não são escoltadas, em variadíssimas ocasiões, por procedimentos e condutas ilegítimas. Será que a entrada de produtos contrafeitos, nomeadamente medicamentos, não adquiriu enorme vigor em todo o mundo?
Um dos maiores entraves no combate à contrafacção de medicamentos, e que afecta consideravelmente a cooperação internacional, reside na falta de unanimidade quanto à definição de medicamento contrafeito. Trata-se de um problema conceptual, ou seja, o significado de contrafacção de medicamentos varia de País para País e espelha as dissemelhantes configurações que o fenómeno agasalha no Mundo.
Esta conjuntura está intimamente associada a configurações de protecção de propriedade industrial, de propriedade intelectual e de conveniências comerciais, que, em variadíssimas circunstâncias, ofuscam as “dimensões” de saúde pública. Numa perspectiva mais circunscrita, podemos certamente afirmar que o conceito de contrafacção refere-se unicamente à produção de um artigo farmacêutico por entidades não autorizadas, reproduzindo o original sem o consentimento legal e com o propósito de logro através da venda do produto como se do original se tratasse.
A contrafacção de medicamentos é feita com propósitos dolosos e deliberados de adulterar a sua origem e essência, encobrindo a condição de os medicamentos não alojarem os benefícios terapêuticos desejados. De realçar que a contrafacção pode ser efectivada em produtos de marca ou em genéricos. Este conceito, no âmago de uma perpectiva meramente comercial, acaba por constituir uma “adaptação” daquilo que acontece com a contrafacção de bens de consumo.
Contudo, o problema da falsificação de medicamentos transpõe, sobretudo nos seus efeitos, a produção e venda ilegal de “tecnologia” ou de roupas e de sapatos de marca. Será que este facto não embaraça a análise e a abordagem global do problema?
Será que os medicamentos contrafeitos não representam uma autêntica cominação para a saúde pública? Será que os mesmos não podem promover o aparecimento de pandemias? Será que a falsificação de medicamentos não constitui um crime grave que coloca constantemente em causa a integridade física das pessoas?
Nos Países em desenvolvimento, as autoridades esbarram com uma cadeia de distribuição bastante frágil e permeável a medicamentos falsificados. As constantes rupturas de stock e os preços elevados praticados pelas farmácias privadas fazem com que a população mais desprotegida recorra ao mercado informal de modo a adquirir medicamentos a preços mais módicos.
Esses medicamentos são, na maioria das vezes, contrafeitos ou possuem defeitos de qualidade não intencionais e resultantes de erros de fabrico ou de distribuição. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), os medicamentos falsificados patenteiam uma incorrecta apresentação da sua identidade, origem ou história.
Na medula desta definição ficam excluídos os defeitos de qualidade considerados não intencionais, assim como configurações inventariadas com os direitos de protecção da propriedade intelectual. Nos Países em desenvolvimento boa parte dos medicamentos são contrafeitos, especialmente os medicamentos para o tratamento de doenças transmissíveis, ou seja, as doenças preeminentes no caixilho epidemiológico desses Países.
Será que a identificação do tipo de contrafacção e da origem dos medicamentos contrafeitos com maior impacto no mercado farmacêutico não é determinante?
O “pertinaz” aparecimento de novos medicamentos, eficazes no tratamento ou no controlo de doenças com um grau de gravidade elevado, tem contribuído para a melhoria da qualidade de vida das populações.
Todavia, existem algumas condições que autorizaram a expansão de negócios ilegais, nos quais se inclui o comércio de medicamentos contrafeitos, como sejam: as desigualdades na distribuição de riqueza; a falta de legislação específica; a falta de meios ou de vontade para implementar a lei; a livre circulação de bens dentro de grandes espaços económicos; as disparidades no acesso à informação; os desequilíbrios no acesso às plataformas de saúde; e os progressos tecnológicos no cabimento industrial.
Será que não é imprescindível revisar a comensuração e as ressonâncias do problema da falsificação de medicamentos? Quais são os contextos e os agentes que simplificam o processo da falsificação de medicamentos? Quais são os instrumentos de controlo desenvolvidos? Quais são os conselhos e as advertências sobre os cuidados a ter na compra de medicamentos que atravessam as ruas fora das passadeiras, ou seja, fora dos circuitos habituais?
Existe um mercado inextinguível que “abraça” milhões de cidadãos com parcas condições económicas e com contextos de saúde bastante instáveis. Estas condições são responsáveis pelo aumento constante dos índices de procura de medicamentos, índices esses bastante superiores aos da oferta legal de medicamentos.
De salientar também que a procura de medicamentos baratos, aliada ao lucro fácil, amplia, de modo significativo, as oportunidades de falsificação. Às populações mais desprotegidas aglutinam-se inúmeros indivíduos dispostos a adquirir medicamentos para usos ilegais, produtos esses impossíveis de obter pelas vias legais ou habituais.
Alguns desses produtos são: esteroides; anabolizantes; psicofármacos; auxiliares de emagrecimento; e auxiliares da disfunção eréctil. Será que a esmagadora maioria dos indivíduos tem os conhecimentos suficientes para reconhecer a qualidade do produto farmacêutico adquirido?
Será que a produção ilegal de medicamentos, omitindo ou copiando os seus componentes activos, requer instalações e meios dispendiosos? Será que nestes casos ter instalações sóbrias não é sinónimo de maior sucesso? Será que os lucros não são enormes, mesmo num contexto em que os produtos são vendidos a preços bastante mais baixos?
A existência de legislação que regule a implementação de benignos procedimentos industriais para a fabricação de medicamentos fará com que a implementação de pérfidos procedimentos ou condutas tenha mais dificuldade em medrar. Será que as penas previstas para o crime de contrafacção de medicamentos agasalha algum efeito dissuasor?
Em alguns Países, a sanção por falsificar o logótipo de uma t-shirt é bastante superior do que a conjecturada para a contrafacção de medicamentos. Algumas potências do comércio mundial promulgam diferentes exigências e procedimentos, no que toca às boas práticas industriais na fabricação de medicamentos, para as empresas exportadoras e para aquelas que produzem para o seu próprio mercado.
Com o objectivo de coordenar diligências na esfera internacional e de auxiliar Países com menos recursos financeiros, a OMS lançou em 2006 o projecto IMPACT concebido como um grupo de trabalho que procura reduzir ou eliminar a contrafacção de medicamentos.
Torna-se fundamental a elaboração de legislação que regule o circuito do medicamento de forma mais eficaz; a garantia da acessibilidade e disponibilidade de medicamentos de qualidade; e a criminalização da contrafacção de medicamentos.