A sinistralidade somente diminuirá se apostarmos na prevenção.

A colocação dissimulada de radares móveis deve ser interpretada como uma perniciosa e pardacenta excisão das garantias constitucionais de defesa dos arguidos em processo contra-ordenacional.

As provas devem ser recolhidas tendo como pano de fundo o total conhecimento e consciência, por parte do condutor, acerca da transgressão cometida. Nesse sentido, os radares não podem estar camuflados, devendo ser identificados por todos os automobilistas.

Os radares móveis encobertos não contribuem para o decrescimento das taxas de sinistralidade, pois a esmagadora maioria dos autos de contra-ordenação não são efectivados pelas autoridades na hora. Logo, o condutor contraventor não cessa a sua marcha em excesso de velocidade, bem como não sabe que foi “apanhado”.

Será que em Portugal não impera a hipocrisia? Será que essa hipocrisia não é transversal à classe política e às forças policiais? Será que a política de “caça à multa” não é indecorosa?

Será que as forças policiais, nomeadamente a Guarda Nacional Republicana e a Polícia de Segurança Pública, não perfilham a falta de ética para ajustiçar aqueles que não cumprem com as regras?

Será que os órgãos de comunicação social tiveram um papel diligente e activo contra este triste cenário, ou seja, a vulgarização da política de “caça à multa”? Quais são as vantagens para o Ministério da Administração Interna ao adoptar e aplicar a política de “caça à multa” em detrimento da prevenção?

Torna-se fundamental edificar legislação que obrigue à sinalização dos radares móveis, devendo a sua mobilidade estar unicamente associada à possibilidade de os utilizar em vários locais. A sinistralidade somente diminuirá se apostarmos na prevenção.

São as próprias forças de segurança a confirmar que os pontos negros da sinistralidade só excepcionalmente coincidem com os locais fiscalizados, ou seja, os locais onde as mesmas colocam os radares camuflados. Será que a prevenção rodoviária não deve constituir uma superfície elementar de actuação das autoridades?

Será que os critérios de prevenção e dissuasão não deviam ofuscar os critérios de castigo e punição? Será que em determinadas ocasiões a falta de civismo não desfila também nas forças de segurança? “Prevenção sim, caça à multa não!”

Nas estradas onde se sabe que há mais propensão para que os limites de velocidade sejam ultrapassados, especialmente pelas boas “condições de circulação” e não por especial perigosidade, aparecem amiudadamente as autoridades para concretizar a verdadeira e vergonhosa “caça à multa”.

Será que este procedimento desagua na prevenção, na pedagogia ou no “embargamento” de acidentes rodoviários graves? Será que cevar os cofres do Estado é mais importante do que diminuir os índices de sinistralidade?

Infelizmente a finalidade é “caçar” muitos infractores, quando na realidade a finalidade devia passar por um paradigma em que as transgressões não ocorressem. Os cidadãos devem ser cada vez mais conscienciosos, íntegros, conscientes e responsáveis, todavia, e de forma análoga, as forças de segurança também devem ser cada vez mais formadoras, preventivas e pedagógicas.

Seria certamente benigno que a condução inconsciente e a traiçoeira “caça à multa” fossem consideradas “maus hábitos do passado”. Desafortunadamente o caminho para que esta conjuntura se concretize parece ser bastante longo e sinuoso.

Será que a ideia de que os condutores portugueses devem ser castigados com multas substancialmente volumosas não é contraproducente? Será que a mentalidade de penalização do automobilista não é altamente nociva e ineficaz?