Os principais obstáculos com que os agentes turísticos de produtos culturais se deparam resumem-se à gradual propensão para a amálgama dos conceitos produção artística e produção comercial, e à forte possibilidade da perda de autenticidade.

Em alguns Países a questão do analfabetismo é quase tão grave como a pobreza e a veemência. No nosso País, o esquema da educação e a consequente parca formação dos indivíduos devem ser interpretados como um problema cultural, pedagógico, político, económico e social. O analfabetismo é certamente um dos maiores embargos à afirmação da capacidade competitiva; ao desenvolvimento científico e tecnológico de uma Nação; e aos vigorosos índices de leitura. A função dos livros devia ser muito relevante em todas as sociedades, uma vez que ninguém deveria conseguir viver sem os livros. Os livros ajudam-nos a compreender, a amar, a bem-querer, a viajar e a crescer.
A sociedade concebe instituições, como é o caso das bibliotecas, que lhe proporcionam equilíbrio e que a impulsionam para novos “palanques”. As bibliotecas acompanham e ajustam-se às mudanças da sociedade, contudo mantêm-se “virgens” na divulgação da sapiência, e na protecção das memórias e identidades culturais. Portanto, podemos afirmar que as bibliotecas são constituídas por diversos serviços estruturados que reforçam os vocábulos informação, vivência, cultura, educação, conhecimento e ócio; desenvolvem o pluralismo de interesses, a liberdade e a independência cultural; minimizam a exclusão social; e explicam o vocábulo democracia.

As bibliotecas públicas contribuem para que essa informação esteja ao alcance de todos de uma forma célere, convincente e, sobretudo, equitativa. As bibliotecas exercem um encanto misterioso sobre o homem, pois quando entramos numa biblioteca há como que uma inquietação entre a ambição ilusionista e a impotência real de estudar o “ecuménico”. Ao contrário do vinho ou do azeite, que estão intimamente ligados aos espaços geográficos onde são produzidos, os livros agasalham a independência de não ter limites regionais ou nacionais. Acredito e defendo que tanto o objecto “livro”, como o espaço que o acolhe exercem um monumental magnetismo sobre a existência dos homens.

A criação literária pode ser definida como sendo um processo através do qual se produz a literatura, compreendendo a análise, a investigação e o exercício prático dos géneros e formatos literários. As bibliotecas de escritores assumem elevadas doses de interesse e de pertinência para o entendimento dos percursos perfilhados por poetas, ficcionistas, cronistas, críticos ou jornalistas. Será que as bibliotecas de escritores não contribuem para a história e promoção da leitura? Será que as mesmas não são autênticos e importantes espaços de criação? Será que esses espaços de criação não estão relacionados, de forma subentendida ou explícita, à origem das obras? Será que as bibliotecas de escritores não oferecem informações sobre a “vida literária”? Será que as mesmas não abordam e sublinham a superfície cultural da época a que os escritores pertencem?

As bibliotecas públicas ao incluírem, nos seus projectos de temperamento cultural, actividades que procuram a promoção e a divulgação dos escritores e das suas obras estão a saciar as carências e as pretensões de leitura de inúmeros utentes. Vulgarmente essas actividades assumem a designação de encontros, de tertúlias ou de conversas. Nessas sessões, os escritores expõem as suas obras; narram experiências; dão conselhos a jovens escritores; fomentam a criação literária; despertam o gosto pela leitura; reforçam a importância dos livros; destapam alguns vértices incógnitos para os leitores; e explicam o processo editorial em Portugal. Os leitores estão, em múltiplas ocasiões, na base das motivações dos autores, levando-os a escrever determinados textos.

As bolsas de apoio à criação literária; a projetos de circulação de um ou mais escritores; à programação de saraus ou de encontros literários; à formação literária; à residência literária; e à pesquisa literária deviam desfilar em outro tom, e tal como acontece em outros Países, no panorama artístico e literário português. Fomentar a produção de textos inéditos correspondentes aos géneros lírico ou narrativo; promover a apresentação e divulgação de obras literárias em configurações diversas de publicação; convocar bibliotecas públicas, livrarias e universidades; valorizar, fortalecer e realizar acções de promoção e disseminação da literatura em espaços físicos diferentes e conjunturas sociais diversas; realizar cursos livres de formação de autores alicerçados no desenvolvimento de habilidades e de métodos de criação literária, bem como no aperfeiçoamento da escrita literária; patrocinar intercâmbios de escritores em Portugal de forma a possibilitar a permuta de experiências e de vivências, e a imersão em novos contextos socioculturais que despertem a experimentação e a inovação na superfície da criação e produção literária; e apoiar projectos de dissertações de mestrado e teses de doutoramentos na área da literatura que versem temáticas contemporâneas e que promovam o desenvolvimento da literatura portuguesa constituem condições essenciais para a existência de verdadeiras cidades literárias.

O turismo deve gerar impactos no meio e correspondências entre visitantes e visitados. A cultura, no seu plano semiótico, possibilita a compreensão da forma como as comutações culturais consequentes da actividade turística influenciam a cultura do visitante e do visitado. A Literatura deve valorizar o papel do leitor, pois é o leitor que outorga significado e importância à obra literária, sendo, por essa razão, “colaborador” da mesma. O “leitor turista” faz com que a obra literária valorize e pigmente a paisagem. Por sua vez, a paisagem aformoseia a leitura da obra. Será que não é fundamental conhecer a relação entre leitor, obra literária e geografia literária? Será que não devemos reforçar a conexão entre turismo, cultura e literatura?

Os principais obstáculos com que os agentes turísticos de produtos culturais se deparam resumem-se à gradual propensão para a amálgama dos conceitos produção artística e produção comercial, e à forte possibilidade da perda de autenticidade. É importante aclarar os inconvenientes dessa amálgama e destacar os pontos convergentes que esses dois conceitos agasalham para o turismo cultural e literário. Realçar que o conceito de cultura é abrangente, confuso e desordenado. Será que actualmente o termo cultura, pelo facto de ser tão amplo, não está despejado de sentido? Será que todo e qualquer pensamento, na circunferência da cultura, não deve começar pela reconstrução do vocábulo cultura?

Numa perspectiva ampla, podemos afirmar que a arte, a religião, o desporto, a ciência e a tecnologia são configurações da cultura. Num sentido mais circunscrito, cultura pode ser uma matéria de investigação da antropologia, quando compreendida e degustada como sendo o conjunto de actividades recreativas, utilitárias, funcionais, intelectuais e emotivas que qualificam uma determinada comunidade.
A cultura envolve as conquistas mais férteis, criativas e inventivas do homem, sendo a história da cultura um género de viagem repleta de aventuras e peripécias intelectuais e espirituais Esta viagem embrulha a arte, o pensamento e os “vigores” económicos, políticos, religiosos e sociais que circunscreveram e transformaram o homem.

A resistência à hegemonia do “global” tem originado pelejas pela liberdade e pela heterogeneidade linguística, política e identitária. Infelizmente a sociedade de massas tem substituído e destituído o povo, a Nação e o artista enquanto produtores culturais, com a sequente e preocupante perda dos contextos éticos da cultura e do entendimento de cultura. Será que o global não originou um novo imperialismo cultural? Será que as indústrias culturais não utilizam e transformam a cultura moderna numa ferramenta de avigoramento do sistema capitalista? Será que esta conjuntura não coloca entraves à produção cultural? Será que esta condição não fragiliza o turismo cultural? Será que o abandono desse caminho não pode evitar a “exterminação” da própria cultura? Será que alguns agentes do turismo, conduzidos por motivações e objectivos meramente económicos, não acabam por desfear a essência e a natureza da cultura a favor do lucro?

As diferenças interculturais devem ser metamorfoseadas em mananciais de enriquecimento tanto daquele que visita, como daquele que é visitado, descerrando novas perspectivas e ângulos, e executando a função da cultura que é humanizar e sociabilizar. Deste modo, não só se transpõe a barreira da homogeneização, ou da única dimensão, da civilização, como também se promove a comunicação intercultural. Será que a cultura não pode ser definida como um poderoso sistema de trocas? Será que a compreensão intercultural não possibilita a valorização do turismo cultural e do papel dos mediadores culturais na medula do próprio turismo?

O turista hodierno situa-se num interessante escalão de escolaridade e de educação, condição que facilita o respeito pelas configurações de confraternização recíproca fundadas de modo democrático e que favorece o saber, a compreensão e o conhecimento sobre a existência de heterogeneidade cultural e civilizacional. Será que o mundo e a indústria turística não estão cada vez mais estandardizados e inautênticos? Será que o turismo cultural, ao proporcionar a comunicação intercultural entre visitantes e visitados, não simplifica a compreensão e o mergulho na cultura do “outro”? Será que o turista cultural não procura o prazer intelectual? Será que esse prazer não sacia o desejo humano de conhecimento? Será que o turismo cultural não nos faz aumentar a consciência sobre a nossa própria identidade?