Felizmente que essa barreira foi largamente ultrapassada. Mas como chegámos a este ponto? Vamos por partes.
Parte 1: Os elos de ligação.
Lembra-se do famoso mergulho no rio Tejo, em 1989, nas autárquicas para Lisboa, do então candidato à Câmara Municipal de Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa, com o objetivo de alertar para a grave poluição do rio? Facto 1: O rio Tejo, hoje, continua extremamente poluído. Facto 2: O atual Presidente da República é o Professor Marcelo Rebelo de Sousa. Agora, resta ao nosso Presidente tomar conhecimento do primeiro facto. E sabem que mais … o elo de ligação estará para breve.
O rio Tejo que nasce na serra de Albarracín em Espanha e desagua no Oceano Atlântico em Lisboa, é mais um dos elos de ligação entre Espanha e Portugal. Nesta longa viagem e antes de entrar em Portugal, o rio mais extenso da Península Ibérica é alvo de vários problemas ambientais e vicissitudes, fruto da imaturidade de muitas decisões.
As águas antes de chegarem a Portugal são confrontadas com inúmeros obstáculos que afetam a quantidade e qualidade da água. Para além de serem desviadas em grandes quantidades para a agricultura, as águas, perdem parte da sua qualidade quando 1) banham os reatores das 3 centrais nucleares; 2) recebem os efluentes urbanos da gigante cidade de Madrid e 3) acolhem as várias descargas (i)legais do setor industrial.
Chegado a Portugal, já com uma deterioração enorme, é injetada “nova” poluição no rio. Estão patentes descargas ilegais de estações de tratamento de águas residuais (ETAR) não monitorizadas, esgotos urbanos e, claro, efluentes industriais que pela calada da noite penetram nas águas do Tejo. Um dos focos principais destas descargas reside na zona de Abrantes. Por um lado, as duas empresas de celuloses – Celtejo e Centroliva – que em pleno século XXI descarregam os seus efluentes diretamente no rio Tejo. Por outro lado, também já detetado, encontra-se uma fossa séptica pertencente à Câmara Municipal de Vila Velha de Rodão que apresenta fugas na sua estrutura.
Perante isto, o “azar” dos responsáveis prevaricadores é que os efluentes descarregados diretamente nas águas do rio Tejo estão à vista de todos, ao contrário de muitas contas offshore.
Parte 2: Comunicação Social, Entidades Competentes e a Sociedade Civil
A comunicação social, ao contrário do tema da Central Nuclear de Almaraz, ainda está bastante adormecida para esta triste realidade. É verdade que já se debruçou algumas vezes – não tantas quanto eu desejaria – sobre o assunto emitindo alguns programas para alertar estes crimes ambientais.
A 26 de setembro de 2015 o programa Linha da Frente da RTP1, no episódio ”Tejo: O Rio Perdido”, ajudou a compreender de uma forma simples e cuidadosa os problemas que o Tejo encontra ao longo do trajeto de mais de 1000 Km, entre Espanha e Portugal. Nesse documentário, que aconselho a sua visualização, o então Secretário Estado do Ambiente, Paulo Lemos, afirmou já ter o problema devidamente identificado e notificado as empresas e Câmaras Municipais para o facto de ao longo da bacia hidrográfica se cometerem estes crimes. Conclusão. Nada foi feito. Cessou funções e no entretanto o problema não ficou estagnado.
A 8 abril de 2016 o programa Sexta às Nove, também da RTP1, emitiu um episódio intitulado ”Crimes ambientais no Tejo”. Esta reportagem expôs, com documentação, os crimes ambientais que as empresas já citadas neste artigo praticam, e como tendem a ignorar os valores limites legais de emissão estipulados pela legislação Portuguesa. Bastante interessante. Vale a pena ver, AQUI.
Estes alertas a juntar às assinaturas já recolhidas da petição do movimento proTEJO – que levará o assunto ao Parlamento -, urge a necessidade de um programa Prós e Contras para sentar frente a frente os responsáveis das empresas – Celtejo e Centroliva -, Câmara Municipal de Vila Velha de Rodão e das entidades competentes – Agência Portuguesa do Ambiente (APA); Inspeção-Geral do Ambiente (IGAMAOT) e Ministério do Ambiente.
A sociedade civil precisa conhecer detalhadamente estes crimes ambientais. Já lá vai o tempo em que o povo só se preocupava com Fado, Fátima e Futebol. Os tempos são outros. Existem preocupações ambientais em cada um de nós e não só num leque apertado da população. Um desses exemplos corajosos vem do cidadão Arlindo Marques Ortiga Mação que, por iniciativa dele, publicou no passado dia 6, 8 e 21 de fevereiro de 2017 o estado lastimável em que a espinha dorsal da Península Ibérica se encontrava. Para além de serem chocantes, estas gravações, são inaceitáveis numa Europa – aparentemente – desenvolvida. É obrigatório ver, AQUI (06/02/2017), AQUI (08/02/2017) e AQUI (21/02/2017).
Parabéns pela iniciativa. É caso para sermos todos #JeSuisArlindo.
Parte 3: Acalmar a tempestade no rio Tejo
De acordo com fontes do Ministério do Ambiente, o expresso noticiou no passado dia 18 de fevereiro de 2017 que, “os suspeitos do costume foram identificados e a dois deles foram levantados autos de notícia que serão enviados para o Ministério Público”. É um bom caminho e um bom presságio.
Mas chegou o momento de acalmar a tempestade no rio Tejo como Jesus acalmou a tempestade no mar da Galileia? Não me parece.
Para acalmar a tempestade teremos de aguardar com expetativa que as entidades competentes, com todos os prevaricadores já devidamente identificados, travem urgentemente as descargas ilegais. Estes crimes ambientais para além de estarem afetar fortemente as atividades económicas da região – turismo, agricultura e pesca -, prejudicam a biodiversidade pondo em causa a saúde pública e o bem-estar das pessoas.
Solução? A luz ao fundo do túnel chegou da parte do Ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, na Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local no passado dia 21 de fevereiro de 2017 afirmando que, “a empresa Celtejo antecipou em largos meses a construção da ETAR” para o tratamento final dos efluentes.
Provavelmente, tanto para a construção da ETAR como para a reparação da fossa sética o Programa Operacional de Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (PO SEUR) dará um forte empurrão na resolução deste problema. Admito que seja um caminho correta mas, seria plausível não cometer erros passados tendo em atenção a fiscalização por técnicos competentes e implementação de um programa apertado de monitorização.
A tempestade só ficará completamente calma, quando os nossos vizinhos Espanhóis cumprirem o acordado na Convenção de Albufeira, ou seja, normalizarem os caudais mínimos ecológicos estabelecidos controlando, por exemplo, as transvazes para a agricultura. Com esta tempestade resolvida não tenho a mínima dúvida que a quantidade e qualidade da água ficará em valores desejáveis.
Não se esqueçam: sem fiscalização e monitorização, as descargas (i)legais são à segunda-feira e outros dias.
Este artigo é da exclusiva responsabilidade do autor.