Com a deslocação da racionalidade financeira para o espaço ecuménico da vida, a eutanásia social leva a competitividade ao seu auge, defendendo a aniquilação de qualquer “subproduto demográfico” que não seja lucrativo. Vivemos uma preocupante e perturbadora hipersensibilidade de apoquentação em relação a qualquer género de dependentes.
Os crescentes desequilíbrios sociais e económicos acarretam resultados desvirtuados para a humanidade. Infelizmente aqueles que são mais indigentes acabam por aceitar com magnificente indiferença e inércia todas as condições e injunções de um sistema socialmente perigoso e mortífero.
Há em muitos pensamentos uma interpretação da vida que é absurdamente estéril, epidérmica, rasteira e lamentavelmente desguarnecida. Resume-se em contemplar a existência de uma forma utilitária, com assentamento numa compreensão interesseira e em preceitos unicamente económicos.
Lamentavelmente ainda há quem pense que se uma determinada vida não é profícua, não é lucrativa e não consegue oferecer todo o conforto que se deseja, então não tem fundamento vivê-la.
Esta “intelectualidade” nem é frequente nos indivíduos muito enfermos, ou nos anciãos que estão próximo da morte, mas sim nos outros cidadãos, naqueles que, não só estão encasquetados de que irão permanecer para sempre neste mundo, como se acham no direito de edificar uma sociedade com regulamentos que lhes parecem mais completos do que os da natureza, regimentos esses isentos e libertos de quaisquer critérios, estimações e valores que não sejam os económicos, os da afiguração e os da comodidade.
Neste formato, afasta-se a independência aquando da nomeação do próprio destino, e as pessoas tornam-se meros objectos à inteira disposição das conveniências económicas e dos adulterados mecanismos de utilidade social.
A verdade é que os excluídos são destituídos dos direitos elementares que tinham por obrigação acautelar o bem-estar dessas populações “estandardizadas”.
A exclusão social acentua-se nas sociedades em que o desemprego está bastante pigmentado, ou quando os empregos efectivamente existem, mas o rendimento que os mesmos proporcionam não é suficiente para caucionar a satisfação das indispensabilidades primárias.
O comportamento preventivo dos profissionais ligados à saúde torna-se imprescindível, sobretudo para patrocinar uma superior qualidade de vida às populações mais estéreis e indefesas. Convém não omitirmos que em diversas ocasiões o óbito social precoce está profundamente amarrado ao “negócio” das políticas públicas de saúde.
O “decreto” da morte vai conquistando periferias na crescente desconsideração em relação ao ser humano, na instabilidade e insuficiência da assistência médica, e no derramamento das circunstâncias de decessa.
Será que os prospectos e programas de saúde devem ser desenvolvidos de forma separada? Será que os mesmos não devem fazer parte de um plano integral de aperfeiçoamento? Será que, e apesar de os meios de comunicação desenvolverem investigações sobre a eutanásia social, a ambivalência, a ambiguidade e a obscuridade da temática são debatidas?
Facilmente constatamos que a correspondência entre os cidadãos e o sistema político tem sido caracterizada por sentimentos de distanciamento e por um enfraquecimento da confiança dos cidadãos nos seus actores políticos.
Também será importante salientar que nem todos os agentes políticos são semelhantes no que respeita a atributos como a incorruptibilidade, a inteligência na decomposição dos problemas, o sentimento de pertença e a coragem.
Contudo, a política não é meramente uma questão de boa ou má gerência, ela também envolve preferências entre determinados valores e tomadas de posição complexas e incertas, nas quais alguns ganham e outros perdem.
Por exemplo, para certos indivíduos o aquecimento global é “aprovado” se tal originar maior desenvolvimento económico e logicamente melhorias no bem-estar material dos cidadãos; para outros, a conservação do ecossistema deve sempre impor-se às tendências economicistas.
Apesar de o Estado possibilitar em certa medida a diminuição das desigualdades na aproximação dos serviços de saúde, a verdade é que em variadíssimas ocasiões a “circunscrição” pública desfruta de um papel desajustado no atendimento hospitalar.
Com a crescente complexidade da realidade, verifica-se que os instrumentos de direcção estão cada vez mais desfocados da mesma e muitos dos enigmas da governação transcendem as fronteiras nacionais, não podendo por essa razão ser resolvidos unilateralmente.
No processo de governação exige-se o crescente envolvimento de mais agentes. Em Portugal, onde existe a ideia de que muitas leis não passam do papel, esta necessidade torna-se ainda mais relevante.
O desagravamento da rejeição e da marginalidade poderá depender do efectivo comprometimento da sociedade com cada pessoa e com a própria existência humana.
Torna-se extraordinariamente complicado acautelar a dignidade e a respeitabilidade no final da vida, quando se vive numa permanente indignidade.