Tribunal absolve os dois acusados de vandalizar gravura no Parque Arqueológico do Côa

O Tribunal de Foz Côa absolveu hoje os dois homens acusados de vandalizar uma gravura no Parque Arqueológico do Vale do Côa (PAVC), assim como do pagamento de um pedido de indemnização, de cerca de 125 mil euros.

Na primeira audiência de julgamento, em setembro de 2020, os arguidos, de 37 anos, afirmaram que não tiveram “a perceção que na rocha onde fizeram o desenho e inscrição ‘BIK’ houvesse alguma gravura rupestre.

Já hoje, na leitura da sentença, a juíza referiu que, após ouvir peritos e testemunhas envolvidas, classificava os factos como uma “atitude lamentável” por se tratar de património classificado, contudo, determinou a absolvição dos dois arguidos.

Segundo o advogado de defesa, Fernando Silva, “foi feita justiça”, porque “jamais os arguidos sabiam que a rocha em causa continha material classificado”.

“Estamos perante um crime de dano qualificado que só é punível a título de dolo e não a título de negligência. Nessa medida, não se provou que houvesse dolo por parte dos arguidos. A meu ver, e bem, os arguidos foram absolvidos dos crimes de que eram acusados, bem como do pedido de indemnização por dano de cerca de 125 mil euros”, vincou a defesa.

Por seu lado, a advogada de acusação que representa a Fundação Côa Parque, Susana Branquinho, não colocou de lado um recurso logo após analisar a sentença proferida pela juíza do tribunal de Vila Nova de Foz Côa, no distrito de Guarda.

“Os atos praticados pelos arguidos põem em causa o património e entendemos que esta absolvição pode ter outras repercussões a nível nacional, porque as pessoas ficam com a ideia de que podem destruir o património e que nada lhes acontece, o que não pode ser”, justificou.

No início do julgamento, em 20 setembro de 2020, os dois homens confessaram a prática do crime em tribunal.

“O ato foi uma coisa de segundos e só nos apercebemos da dimensão do caso pela comunicação social e pelas redes sociais, alguns dias depois”, afirmou um dos arguidos.

O outro dos acusados disse, no decurso da audiência, que durante o passeio de BTT, que juntou cerca de 30 praticantes, não viu nenhuma placa naquele local [Ribeira Priscos] a indicar que por ali houvesse gravuras rupestres.

“Vim para casa de consciência tranquila. Só depois ficamos em pânico quando nos apercebemos do sucedido”, descreveu ao tribunal de Foz Côa.

Para os dois arguidos, “tudo não passou de um impulso irrefletido”, e nunca tinham ouvido falar na existência da gravura em causa (Homem de Priscos).

Os factos remontam ao dia 25 de abril de 2017 e foram denunciados no dia 28 pela Fundação Côa Parque, que gere o PAVC e o Museu do Côa, e o Ministério Público (MP) imputou aos dois arguidos o crime de “prática de dano qualificado, punível com pena de prisão de dois a oito anos”.

O MP deduziu ainda um “pedido de indemnização cível, em representação do Estado, reclamando o pagamento de valores de reparação das rochas e perda de receitas que ascendem a 125 mil euros”, indicava, em 10 de dezembro de 2019, a página oficial da Procuradoria-Geral Distrital de Coimbra.

Segundo contou à Lusa um representante da Fundação Côa Parque, na altura do sucedido, “um grupo de ciclistas amadores fez um passeio de BTT com início em Vila Nova de Foz Côa e passagem no núcleo de arte rupestre da Ribeira de Piscos, um dos mais importantes núcleos arqueológicos da Arte do Côa, onde foi feita a inscrição ‘BIK’ numa dos painéis de gravuras”.

Na ocasião, a Polícia Judiciária (PJ) anunciava ter identificado dois homens suspeitos do vandalismo de que foi alvo uma gravura do PAVC, sítio arqueológico da ribeira de Priscos.

Segundo aquela polícia, os suspeitos foram considerados “responsáveis pela produção de dois desenhos e uma inscrição sobre o Painel Central de Arte Rupestre da Ribeira de Piscos, vulgarmente conhecido pela representação do ‘Homem de Piscos’, classificado como monumento nacional e como património mundial pela UNESCO”.

Fonte da PJ adiantou à Lusa, à data da investigação, que os homens, residentes em Torre de Moncorvo, no distrito de Bragança, eram suspeitos da prática de “um crime de dano qualificado”.

Esta situação levou ao reforço das medidas de segurança no PAVC, com algumas forças políticas a pedirem esclarecimentos sobre o sucedido ao então ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes.

Os arqueólogos do PAVC garantiram que se trata de um conjunto de gravuras que sobreviveram intactas mais de 10.000 anos e que foram “miseravelmente mutiladas pela ignorância de alguém”.


Conteúdo Recomendado