Ucrânia: De Portugal para o centro do conflito, sociedade civil mobilizou-se para levar ajuda

De norte a sul do país, multiplicam-se iniciativas semelhantes que tanto partem de empresas, paróquias, autarquias, movimentos cívicos e associações. A Guarda não é exceção.

De Portugal para a Europa de Leste, a sociedade civil mobilizou-se para levar ajuda humanitária até à Ucrânia e fronteiras, com locais improvisados a encherem-se diariamente com caixas e sacos à espera para seguir viagem.

Foi no Palácio Baldaya, em Lisboa, que a Junta de Freguesia de Benfica montou o centro de operações para a recolha de bens, que arrancou na segunda-feira e, por ter superado as expectativas, se vai prolongar até sábado.

Na biblioteca, as prateleiras de livros têm estado escondidas por detrás de centenas de sacos e caixas com doações, que foram entretanto organizadas na quarta-feira e guardadas num armazém anexo, que ainda está a acabar de ser construído.

Estes bens esperam para serem transportados por dois camiões que seguem hoje à noite para a Ucrânia, país que desde há uma semana enfrenta um conflito armado depois da invasão russa.

“Já recolhemos mais de 60 toneladas e já entregamos 20 toneladas”, contou à agência Lusa o presidente da Junta de Freguesia, Ricardo Marques, relatando que, desde segunda-feira, aquela sala do palácio se enche diariamente com comida, medicamentos, brinquedos e, sobretudo, roupa.

À entrada, Filomena Gaspar carrega dois sacos grandes com roupa. Foi aquilo que conseguiu trazer sozinha e, por isso, ficou satisfeita quando o próprio presidente lhe disse que iam estar a recolher bens até sábado.

“Acho que toda a solidariedade é boa, porque nós não sabemos o dia de amanhã e podemos vir a precisar”, disse.

Pouco antes, Deolinda Ribeiro também tinha chegado com bens para doar. Já lá tinha estado na quarta-feira e ainda há de voltar, disse à Lusa, sublinhando que quer ajudar tanto quanto lhe for possível.

“Tem sido, de facto, esmagador a reação e o contributo”, notou Ricardo Marques, antecipando que além dos dois camiões que já foram entregues às igrejas de Arroios e de Nossa Senhora do Amparo e seguiram depois para a Polónia, daqueles que partem ainda hoje para uma base militar no sul da Ucrânia e do que, na terça-feira, fará o percurso entre Benfica e a Roménia, será necessário um sexto para assegurar que todos os bens são enviados.

Antes de saírem, Filomena e Deolinda ainda se cruzaram com Oksana, uma ucraniana a viver em Portugal, e o sobrinho Andriy, que chegou no sábado da Ucrânia.

No final da semana, vai receber mais familiares que conseguiram fugir do país e a ajuda que recebeu nos últimos dias foi tal que quis partilhar com os compatriotas que ainda estão na Ucrânia ou nas fronteiras.

“Numa situação destas ninguém pode ser indiferente. E mesmo nós, que temos esta dificuldade… No sábado vamos ser nove pessoas numa casa, vai ser um pouco difícil, mas queremos dar tudo o que podemos porque eles lá não têm nada”, disse.

A família estava preparada para abandonar o país e assim que o conflito chegou à cidade de Lviv, onde vivem, alguns pegaram naquilo que puderam – pouco mais além da roupa que traziam vestida, segundo Oksana – e partiram para a fronteira com a Polónia. Muitos ficaram para trás, para combater ou porque não queriam abandonar filhos e maridos.

“Nós tivemos muita sorte que outras pessoas não tinham”, sublinhou emocionada, referindo que o apoio demonstrado pelos portugueses a tem comovido. “Vocês têm um coração enorme e não consigo descrever, não tenho palavras para agradecer a cada um”, acrescentou.

Do outro lado, as doações foram recebidas por voluntários como João Santos, um entre centenas.

“Estou desde o primeiro dia”, contou à Lusa, relatando que o trabalho foi-se intensificando a cada dia, sobretudo na quarta-feira, quando todos os esforços se concentraram para preparar os camiões de hoje: “Tivemos um dia muito intensivo, com uma entrega muito grande, tínhamos imensos voluntários a trabalhar e conseguimos ter aqui muito material organizado para fazer a entrega”.

De norte a sul do país, multiplicam-se iniciativas semelhantes que tanto partem de empresas, paróquias, autarquias, movimentos cívicos e associações.

Em Lisboa, outro dos vários pontos de recolha é na Farmácia Miranda que, depois de ter falado com uma cidadã ucraniana a viver em Portugal que conseguia assegurar o transporte dos bens, decidiu juntar-se à ajuda à Ucrânia.

Ali, a adesão também superou as expectativas da diretora clínica e a pequena sala onde são guardados os bens doados, e de onde saem diariamente para um armazém em Loures, já estava bem ocupada a meio da manhã.

“As pessoas estão mesmo a mostrar muita união e muita compaixão por quem neste momento mais precisa”, explicou Mariana Noronha, contando que têm conseguido entregar muita coisa, entre roupa e alimentos, mas também muitos medicamentos e material de primeiros socorros.

“Temos tido uma generosidade imensa da classe médica”, acrescentou, referindo que já receberam vários médicos que se oferecem para passar receitas médicas de fármacos que só assim podem ser disponibilizados.

Também na Guarda há vários pontos de recolha para ajudar a Ucrânia, nomeadamente, nos quartéis dos bombeiros de cada município e no Instituto Politécnico da Guarda.


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