Um grupo de entusiastas dos caminhos-de-ferro pretende ativar “para fins turísticos e de lazer” um troço desativado de nove quilómetros da linha do Douro, que liga o cais fluvial do Pocinho à estação do Côa, no distrito da Guarda.
Este troço de via férrea que serpenteia as margens do rio Douro na antiga linha que fazia a ligação entre as estações do Pocinho (Vila Nova de Foz Côa) e Barca d’ Alva (Figueira de Castelo Rodrigo) insere-se num traçado de cerca de 30 quilómetros por entre túneis e pontes “de grande imponência”, mas está ao “abandono”.
Só estes primeiros nove quilómetros é “que têm potencial para a circulação”, dado que daí para a frente houve derrocadas e furtos de dezenas de metros de carris da linha férrea.
No percurso realizado a bordo de dois veículos artesanais a motor, construídos para fazer este percurso, onde a Lusa viajou, não faltou uma série de “descarrilamentos controlados” devido ao mau estado do traçado desta via ibérica de bitola larga, mas que foi sendo reparado ao longo do percurso já que a bordo seguiam ferramentas para estes “percalços”.
Os aventureiros do denominado grupo ” The Braves Ones”, que junta entusiastas dos caminhos-de-ferro da região Norte, fizeram-se ao percurso naquele troço de ferrovia que está desativado e “abandonado” há mais de 30 anos, onde os sinais de degradação de infraestrutura são visíveis.
José Costa é o representante deste grupo “The Braves Ones” e disse à Lusa que esta linha férrea tem bons recursos para ser aproveitada e dinamizada, e há mais de 30 anos que nenhum veículo circulava na via, além de uma máquina que fez, em tempos, alguma manutenção no local.
“Desde 2017 que temos realizado aqui muito trabalho. Começámos por fazer a limpeza do troço de nove quilómetros, entre o Pocinho e estação do Côa, onde temos vindo a melhorar as condições da via”, vincou José Costa.
Este grupo de pessoas, que existe desde 2007, teve o cuidado de ao longo de três anos assinalar e registar todos os pontos “mais perigosos e degradados da via” para que a viagem “experimental” decorresse com toda a segurança.
Para fazer a viagem foram construídos dois veículos de pequeno porte e motorizados que podem transportar seis a sete pessoas.
Apesar de todas medidas de segurança tomadas e eventuais perigos, houve vários descarrilamentos “controlados”, provocados por diversos obstáculos devido ao mau estado daquela ferrovia, mas o percurso foi feito com sucesso e a iniciativa teve cerca de três dezenas de curiosos.
Os entusiastas do caminhos-de-ferro pretendem chamar a atenção para o estado desta via ferroviária que, em sua opinião, “tem um elevado potencial turístico e histórico”.
Na linha estão a ser testados dois veículos artesanais que podem servir de ensaio para outras composições ferroviárias do género.
Ao longo deste percurso experimental “foi impossível não ficar desolado” com o estado de abandono, vandalismo e degradação da linha.
“O avançado estado de degradação e abandono da via é evidente, a vegetação tomou conta dos carris em toda a sua largura. Ao longo destes últimos anos temos feito o corte de vegetação e a manutenção de carris, travessas e outros elementos do traçado”, vincou José Costa.
Os “The Barves Ones” deixaram a garantia de que a empresa Infraestruturas de Portugal, a detentora dos direitos sobre a linha férrea, está a par de todas iniciativas que têm sido levadas a cabo.
“Temos trocados e-mails com a empresa e estamos dispostos a colaborar na manutenção e vigilância da via”, acrescentou José Costa.
As travessas da via, algumas já desfeitas, foram consumidas pelas agruras do tempo e do fogo, e não falta o furto de várias peças do traçado ferroviário, que é possível verificar no terreno.
“Gostaríamos de manter este canal de linha aberto e tirar proveito do trabalho árduo que aqui tivemos. Comprometemo-nos perante a entidade proprietária da linha a relatar furtos ou atos de vandalismo que aqui possam acontecer”, indicou.
Por seu lado, João Moreira, um dos maquinistas de serviço que estreou a sua composição naquele traçado, relatou que nem sempre é fácil circular na via.
“Não temos os meios apropriados para os nossos intentos que passam por preservar a via. O que fazemos num dia, depressa se destrói pelo passar do tempo. Temos de conseguir mais meios e apoios ou vai ser complicado seguir com o projeto de tornar a via circulável para pequenos veículos ferroviários”, observou.
O “The Breves Ones” está em conversações com um grupo de entusiastas espanhóis das vias férreas da “Todavía” para levar o projeto desde o Pocinho a Barca d’ Alva até a estação de Fuentes de San Esteban (Espanha).
Os defensores da ferrovia do Douro, que fazia a ligação entre o Porto, Pocinho, Barca d’ Alva, Fuentes de San Estabam e Salamanca, garantem que não querem com as suas ações “denunciar” nada, mas apenas “atuar em defesa do património ferroviário”.
Segundo um especialista em ferrovias consultado pela Lusa, o troço de linha que liga a Estação do Pocinho a Barca de Alva foi construído em 1887, foi uma das grandes obras de engenharia ferroviária da Península Ibérica e funcionou quase um século, tendo encerrado em 1985.