Agricultores e ambientalistas divididos sobre soluções para convivência com lobos

O lobo é mais do que um animal de contos infantis, sendo uma espécie protegida na Europa e em Portugal em particular, que tem estado no centro de uma disputa crescente entre criadores de gado e ambientalistas.

Se no começo do século passado o lobo “ocupava quase toda a Península Ibérica”, segundo documentos citados pelo último censo nacional do lobo (realizado em 2002 e 2003), aquele animal existia, no princípio deste século, em “apenas cerca de 20% da [área] original” em Portugal, no Norte e Centro do país, depois de desaparecer por completo a sul do Tejo.

Nos últimos anos, a presença do lobo em algumas zonas do Centro e Norte tem sido encarada pelos produtores de gado como uma ameaça aos seus rendimentos devido aos ataques que o gado sofre, gerando um conflito com entidades responsáveis pela conservação dos habitats.

Em declarações à Lusa, o investigador da Universidade do Porto Francisco Álvares explicou que “o denominador comum acaba por ser o facto de o lobo ter diminuído pontualmente ou então estar a ocupar algumas zonas em que a presença não era tão frequente há uns anos e isso faz com que as pessoas já não estejam tão habituadas a lidar com a presença do lobo, tenham formas de maneio do gado bastante deficientes e daí que gere tanto conflito, mas nada proporcional ao número de lobos”.

Isto porque, disse Francisco Álvares, as alcateias das zonas em causa (Viana do Castelo, Sabugal, Almeida e Montemuro) são “muito reduzidas”, com uma média de cinco ou seis elementos.

No entanto, os produtores de gado contactados pela Lusa mencionam a ocorrência de “situações dramáticas que levam a atos de desespero”, como disse Rui Matos, da Acriguarda.

“O maneio que nós temos não tem nada a ver com o que tínhamos há 30 anos. Não podemos voltar atrás. Os efetivos pecuários neste momento não pagam pastores”, declarou Rui Matos, respondendo às críticas segundo as quais os animais não podem ser deixados ao relento sozinhos durante a noite e recordando que, há 40, 50 anos, todos sabem “como é que se vivia nas aldeias”.

José Estevão, da Acrialmeida, estimava que, no espaço de duas semanas, teria havido quase um ataque por dia na zona da sua associação.

José Estevão considera que o único ponto de acordo possível é em relação ao preço a pagar pelo animal criado que seja morto por lobos, algo que ecoa as queixas dos restantes produtores, que lamentam que não se pague um montante mais elevado.

Por seu lado, Francisco Fonseca, presidente do Grupo Lobo, recorda que “há leis que não têm nada a ver com o lobo que obrigam os criadores de gado a cumprir determinadas coisas que eles não estão a cumprir”.

O também professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa realça que “há zonas do país que não têm prejuízos e os lobos estão lá, porque as pessoas ainda vivem com o lobo”, como é normalmente apontado o caso do território de Bragança.

Francisco Álvares sublinhou, ainda, que “há 20, 30, 40 anos havia uma população de lobos muito superior, que ocupava quase a totalidade do território nacional, em que a atividade pecuária era das principais atividades no mundo rural e coexistiam”.

Porém, José Estevão aponta para um problema que transcende a questão do lobo: “Hoje há uma grande divergência entre a cultura rural e a cultura urbana e vai-se acentuar”.


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