A castração química, também intitulada de tratamento hormonal ou de terapia antagonista de testosterona, pode ser definida como a aplicação de hormônios anti-andrógenos no indivíduo, tencionando impossibilitar a produção do hormônio testosterona e, desse modo, reduzir a libido, ou seja travar a actividade ou o desejo sexual. Procura-se, desta forma, combater os aterradores e perversos casos e contextos de crimes sexuais. Na realidade, alguns Países, como a França, a Alemanha, os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, homologaram, na sua disposição jurídica, a aplicação da pena de castração química, ainda que em alguns Estados em formatos facultativos. Qual é a viabilidade de se perfilhar a castração química como um direito ao condenado por crime sexual? Será que a administração dos inibidores hormonais, de modo insulado, não é capaz de prevenir alguns formatos de criminalidade? Será que a castração química não pode ser degustada como uma forma complementar de punição? Será que a eficácia da castração química não está relacionada com as dissemelhantes motivações que levam os criminosos sexuais a perpetrarem a sua conduta? Será que a mesma também não está coligada às distintas configurações pelas quais pode acontecer o crime sexual? Será que para os agressores sexuais em que não é reconhecido um apetite sexual desajustado, proveniente de patologias ou de desvios hormonais, a castração química exerce algum tipo de influência? Será que a castração química deve substituir a pena efectiva de prisão? Será que a mesma não deve ser adicionada a essa pena de prisão? Será que a castração química não deve hospedar carácter obrigatório? Será que as “abordagens” em torno da castração química não envolvem crimes sexuais hediondos, sórdidos e repugnantes? Será que a adopção da castração química deve ser um direito concedido ao agressor sexual e, por essa razão, facultativa? Será que o agressor sexual não deve ter como único direito o acompanhamento médico, dentro do estabelecimento prisional, para a ministração das injecções nos prazos convencionados? Como se administra a castração química? Quais são os medicamentos utilizados no campo da castração química? Qual foi o desenvolvimento da mesma ao longo dos tempos? Quem elabora a previsão da pena de castração química nos Países que já acolhem o seu uso?
Torna-se necessário analisar e compreender o temperamento psicológico do criminoso sexual, bem como todos os cenários caracterizadores e “maquilhadores” da pedofilia. Paralelamente é indispensável interpretar e “envolver” a eficácia do tratamento hormonal e os resultados procedentes da aplicação da castração química nos indivíduos. Será que em crimes de natureza sexual, principalmente aqueles que envolvem crianças, nos devemos preocupar com a dignidade da pessoa humana e a autonomia da vontade do indivíduo violador? Será que a castração química não deve constituir uma punição imposta pelos Estados? Será que a mesma não deve ser complementar à pena de prisão efectiva? Será que este tipo de criminosos alguma vez se preocupou com a dignidade da pessoa humana e com a autonomia da vontade dos outros?
Talvez também seja oportuno abordar o tema castração física. A castração física, e tal como o seu próprio nome indica, consiste na remoção cirúrgica dos órgãos reprodutores. Trata-se de um procedimento de carácter irreversível que acaba por incapacitar, de modo ininterrupto, o indivíduo. Diferente da castração física, a castração química caracteriza-se pela administração de substâncias que circundam e bloqueiam a produção do hormônio testosterona nos criminosos sexuais masculinos, reduzindo a libido, e controlando o desejo e os estímulos sexuais. Portanto, a castração química, para além de não ser definitiva e de ser caracterizada pela reversibilidade, também não implica a amputação de órgãos. Será que a castração química não pode ser degustada como um caminho para a ressocialização? Será que a mesma não constitui um tema contemporâneo e controverso em todos os cantos do mundo?
Salientar que nos casos em que a pena de prisão efectiva é permutada pela castração química se encontram múltiplas dificuldades no tratamento, uma vez que o requisito da obrigatoriedade da administração dos inibidores hormonais em circunstâncias que a apresentação habitual não seja cumprida pelos agressores sexuais, pode fazer aumentar nos mesmos os índices da produção da testosterona, provocando uma maior ocorrência na prática de crimes sexuais.
A partir da última década do século XX, e depois de incalculáveis relatos que mostravam os “descomedimentos” constantes e indecorosos perpetrados contra crianças e adolescentes, teve início, à escala global, um movimento que pretendia o agravamento das penas aplicadas aos crimes praticados contra a liberdade sexual. Os actos de abuso sexual que provocavam maior inquietação, sofrimento e repulsão à sociedade em geral eram os praticados contra as crianças e os adolescentes. Nestes casos, o abusador sexual era diagnosticado como “portador de pedofilia”.
A pedofilia, compreendida como desarrumação mental e desordem de personalidade do indivíduo adulto, incorpora o conjunto das cognominadas parafilias, ou seja o aglomerado dos comportamentos sexuais desviantes daquilo que habitualmente é admitido pelas convenções sociais, podendo abranger comportamentos significativamente diferentes e com distintas categorias de “inaceitabilidade” social.
A pedofilia embrulha contactos sexuais, impulsos, desejos, estímulos, fantasias ou excitação sexual em relação a crianças até aos treze anos de idade. Este comportamento pode estar associado a toques genitais entre o agressor e a vítima; masturbação; concretização de desejos sexuais pela penetração vaginal, anal ou oral; e uso de outros objectos com propósitos sexuais. Será que para um indivíduo ser considerado pedófilo não devem estar reunidos determinados requisitos? Será que todos os autores de crimes sexuais contra crianças não devem ser considerados clinicamente pedófilos? Será que a generalização do termo pedófilo é desacertada? Será que os pedófilos não se aproveitam da fragilidade das vítimas? Será que os pedófilos não são autênticos animais irracionais? Será que a reabilitação de um “transgressor” sexual não depende de factores culturais, educacionais e psicológicos, bem como da aplicação da castração química? Será que a castração química, em ambiente de prisão efectiva, não é importante para reduzir o desejo e a violência sexual desses indivíduos? Será que a castração química, mesmo depois de cumprida a pena efectiva de prisão, não deve ser prolongada? Será que a castração química não é eficaz no impedimento da prática de crimes sexuais? Será que esse tratamento não deve ser perpétuo, para que o desejo sexual e o hormônio testosterona não regressem ao seu nível anterior? Será que em casos específicos, e depois de aplicada a castração química, não pode ser utilizada a castração física?
Sem ingressar em nenhuma espécie de paradoxo, podemos seguramente asseverar que o tratamento hormonal agasalha a finalidade de impedir ou dificultar a capacidade de erecção dos indivíduos submetidos ao mesmo. Todavia, nem todas as agressões sexuais são perpetradas por meio de penetração vaginal ou anal, podendo o criminoso sexual praticar outros padrões de violência sexual, independentes da erecção. Logo, o facto de a castração química impossibilitar a erecção peniana não impede que outros crimes sexuais sejam realizados pelos condenados. Será que não existem várias formas de violência sexual? Será que alguma dessas formas é tão grave quanto a própria penetração peniana?
Na realidade, existem algumas condições que alicerçam as condutas sexuais criminosas como sejam: elevados níveis de testosterona; inaptidão para preservar um encadeamento conjugal seguro, pigmentado e equilibrado; dificuldade no controlo dos impulsos e do apetite sexual; atraso mental; psicopatias; alterações de personalidade; incapacidade para lidar com contextos de humilhação, de frustração, de violência e até de poder; consumo abusivo de álcool e de drogas; e ausência de consciência moral, ética e humana. Será que a castração química não encontra mais “sucesso” quando é ministrada em abusadores sexuais com diagnóstico de pedofilia? Será que a pedofilia, no perímetro das “perversidades” sexuais, não pode ser considerada como a mais horrenda, nefasta e pardacenta? Será que enquanto a produção normal de testosterona nos criminosos condenados redundar numa inclinação para a prática de crime sexual, a ministração de hormônios inibidores não deve prosseguir? Será que nos devemos preocupar com os efeitos irremediáveis, se é que eles existem, que o uso prolongado da medicação pode provocar? Quais foram os efeitos irremediáveis que estes criminosos sexuais provocaram nas suas vítimas? Será que as configurações de preocupação não devem ser encaminhados para as vítimas? Será que a finalidade da medicação não passa pela extinção destes crimes hediondos? Será que a castração química não devia ser administrada de modo a impossibilitar, de modo definitivo, a recuperação de toda a potência sexual do criminoso? Será que o emprego compulsório da castração química afecta os princípios da liberdade e da igualdade? Será que não devemos qualificar o criminoso sexual como um ser medíocre e inferior? Será que devemos ter medo das palavras? Será que devemos ser sempre politicamente correctos?
O artigo é da exclusiva responsabilidade do autor.