A abertura das grandes superfícies acabou por trazer aos consumidores portugueses uma nova óptica de consumo, com um acesso acessível aos produtos.

Qualquer que seja o tema ou a dissertação é quase obrigatório principiar uma análise da contemporaneidade a mencionar a palavra crise. O assunto comércio de proximidade não foge à esta máxima, representando, concomitantemente, um resultado e uma oportunidade neste período austero.
O mercado português é bastante exíguo e peculiar, tendo ficado, e de um modo veloz, sobrecarregado de hipermercados. Esta saciedade levou, por exemplo, o grupo Jerónimo Martins a apostar em configurações mais reduzidas. Será que os actos de compra em hipermercados tem tendência a diminuir? Será que os mesmos em supermercados, muitas vezes localizados perto de centros habitacionais ou de escritórios, ou seja com acesso facilitado têm propensão a aumentar? Será que este tipo de comércio tradicional agasalha espaço para se robustecer, virilizar e conquistar espaço em relação às médias e grandes superfícies? Será que vamos assistir ao desaparecimento dos hipermercados e ao regresso do comércio tradicional?
Como meio de ultrapassar a inclinação de decrescimento do acto da compra nos hipermercados, estes tendem a presentear os seus clientes com novos serviços. As parafarmácias das insígnias Jumbo e Continente, assim como as gasolineiras das insígnias Jumbo e Pingo Doce constituem alguns desses exemplos. A abertura das grandes superfícies acabou por trazer aos consumidores portugueses uma nova óptica de consumo, com um acesso acessível aos produtos. Esta conjuntura era inimaginável noutros tempos. Todavia, este progresso ocorreu em prejuízo do comércio tradicional, que ainda continua a “fraternizar” com as grandes superfícies em formatos perfeitamente desequilibrados e desajustados. Será que a legislação aplicada à abertura destas lojas foi a mais adequada?
Em variadíssimas circunstâncias os consumidores não abdicam de comprar no comércio tradicional determinados produtos perecíveis como sejam as verduras, as frutas, o peixe e a carne, contudo a maior parte do bolo de compra realiza-se nas grandes superfícies de maneira a aproveitar os preços geralmente mais franzinos.
Existem múltiplos padrões de relacionamento. As relações alicerçadas na cooperação ou entreajuda em que a finalidade é que todas as partes saiam a ganhar acabam por ser as mais importantes e profícuas. Para que uma relação se fortaleça de forma saudável e duradoura é necessário que ambas as partes estejam direccionadas para o mesmo objectivo. Na realidade, muitos cidadãos compreendem a relação comercial de produtor e distribuidor como uma relação de dominado e dominante, na qual para que exista um vencedor há inevitavelmente um derrotado. De um modo bastante sintetizado, podemos afirmar que o produtor circunscreve as necessidades do consumidor, procurando saciá-las, e o distribuidor torna acessível ao consumidor as respostas do produtor para as suas indispensabilidades. Nas últimas décadas, a posição de dominante está nitidamente do lado dos distribuidores e a negociação tem vindo a encurtar em benefício de uma espécie de injunção. Será que os papéis de cada um não são complementares porque são parceiros?
O conceito Grossista despontou como sendo um intermediário entre o produtor e o retalhista. O grossista comprava grandes quantidades de produtos e vendia-os em quantidades menores aos retalhistas, consentindo uma superior aclimatação entre a oferta e a necessidade de consumo devido, sobretudo, à normalização dos fluxos. Este arquétipo mais recente tinha como suporte a edificação de uma rede de mercearias, ou minimercados, com horários ampliados, em parceria com o próprio comércio de proximidade.
Os símbolos de distribuição alimentar dos grupos têm como principal propósito redarguir as inclinações de consumo, preservando preços franzinos graças a uma gestão convincente e eficiente dos custos e economias de escala alcançadas através de uma administração rigorosa em gastos como lojas, embalagens e produtos, assim como de uma proximidade constante com os consumidores.
Os estudos sobre economia portuguesa e demografia da população revelam que ainda é necessário existir uma maior contiguidade das “insígnias” junto dos consumidores, o que de certa forma acaba por explicar o crescimento do segmento supermercado nas zonas mais residenciais ou de escritórios. Este projecto acaba por não ser um franchising, mas sim um naming das lojas que são reconvertidas, consonadas e harmonizadas, mas sem perder as particularidades do negócio e o efectivo atendimento personalizado. Será que o comércio tradicional e os valores que lhe estão associados não têm espaço para renascer?
A loja de mercearia tem que albergar permanentemente produtos frescos, bem como produtos que satisfaçam as necessidades elementares dos consumidores. O temperamento destas lojas passa por disponibilizar o que “cirurgicamente” os consumidores procuram, mesmo que desfilem menos produtos na prateleira. Torna-se salutar manter activa a tradição do comércio alimentar de proximidade, fidelizando e aumentando a nosso catálogo de clientes, assim como aprofundando os encadeamentos comerciais já existentes.
Nas lojas de proximidade, o ambiente é agradável, elegante e bastante mais tranquilo do que nas grandes superfícies. A oferta dos produtos corresponde às necessidades primárias diárias, os produtos têm qualidade elevada e os preços são dignamente competitivos.
Embora seja uma mercearia, a finalidade é oferecer uma experiência agradável e recriar um ambiente próximo, circunjacente e familiar. As lojas são manifestamente contemporâneas e devido à sua dimensão não perdem personalidade, carácter ou notabilidade. Neste tipo de lojas existe mesmo plafom de actuação para a utilização de elementos ou recursos decorativos tendo em conta os espaços. Do ponto de vista de estruturação interna, verificamos que a velhinha e típica mercearia com os apontamentos e contas feitas em papel ou em caixa registradora desapareceu, dando lugar a superfícies absolutamente informatizadas, assingelando assim os métodos de gestão. Como funciona o mercado de distribuição em Portugal? Será que a legislação que o embrulha é a mais adequada? Quais os motivos que contribuíram para a tomada da deliberação de expansão do comércio tradicional? Quais as consequências para o mercado português dessa mesma deliberação? Será que não é relevante definir um conjunto de métricas e diagramas que autorizem a mensuração da implementação da estratégia? Como funcionam as influências do comportamento de consumo? Será que não é fundamental compreender o desenvolvimento estratégico das insígnias?
Os consumidores fazem contas às despesas mensais e verificam que o poder de compra é cada vez menor. Comprar mais perto poderá trazer determinados benefícios e ser uma boa solução para o consumidor. Desmanchando algumas alegorias, desengane-se quem pensa que a variedade, frescura e preços baixos só existem nas grandes superfícies. Será que não chegou o momento de corrigirmos os nossos hábitos de compra? Será que não devemos reconquistar as memórias e tradições?
O comércio de proximidade não estará inevitavelmente condenado a sucumbir à proliferação das grandes superfícies nas periferias se deliberarmos outorgar-lhe uma nova oportunidade. Será que o comércio de proximidade não nos pode permitir um consumo mais responsável e ponderado? Será que o mesmo não coloca e vende mais produtos de origem nacional e até local quando comparado com as grandes superfícies comerciais?
É imprescindível reconsiderarmos alguns hábitos que nos permitam readquirir tradições que nunca deviam ter sido deslembradas. Na realidade, são cada vez mais os empreendedores locais que apostam na valorização do que é nosso e abrem as portas a um consumo mais próximo, mais verdadeiro e mais sustentável.