É habitual por esta altura ‘do campeonato’ apresentar-se oficialmente e discutir democrática e publicamente na Assembleia da República, na imprensa e nas redes sociais a questão do Orçamento Geral de Estado (OGE2022).

A proposta do Orçamento do Estado para 2022 (OGE2022) foi, como é habitual, entregue há poucos dias ao Presidente de AR, Ferro Rodrigues, um meu antigo colega de Faculdade (ISEG/UTL) e então, durante algum tempo, Presidente da Associação de Estudantes. Como é também usual tal foi feito nas últimas horas do prazo legal (11/10/2021) para o fazer e com as luzes da ribalta bem acesas para presenciarem o ato e o divulgarem. Por isso, ela já é conhecida de alguma dos media e opinião pública interessada. O próprio Governo divulgou, num site onde se pode ver um resumo dos principais eixos do documento.
Vejamos concretamente algumas das medidas que o documento traz de novo (ou renovado) para as famílias, os jovens, as empresas.

Para os trabalhadores prevê se, entre outras, as seguintes medidas:
• A concretização da Agenda do Trabalho Digno e de Valorização dos Jovens no Mercado de Trabalho, com vista a promover um emprego sustentável, com mais direitos e a combater a desregulação e a precariedade. Em particular entre os mais jovens.
• Início da aplicação do Estatuto Profissional do Artista, aumentando a proteção laboral e social destes profissionais, até aqui sujeitos a uma grande precariedade e a muita informalidade.
• A subida do salário mínimo nacional em linha com o aumento médio dos últimos anos (mantendo-se a meta de 750 euros em 2023). Possivelmente ficará entre os 700 e os 705 euros mensais (ilíquido).
• Fixação de um valor mínimo para o subsídio de desemprego de 1,15 IAS (504 €) para um trabalho a tempo inteiro, majorado no caso de famílias monoparentais (uma pessoa) ou em que os membros do casal se encontrem ambos desempregados.
• Subida da massa salarial na Administração Pública em cerca de 3% em 2022, se tivermos em linha de conta progressões, promoções, atualizações e novas contratações.
• Um reduzidíssimo acréscimo geral médio de salários para os trabalhadores da Administração Pública de 0,9%, que para algumas classes pouco supera os 0% de aumento, ficando mesmo bastante abaixo da inflação. Nas palavras do governo, “retomando-se, assim, a regularidade da atualização salarial (?) da função pública (tantas vezes interrompida ou suspensa ao longo deste século) e assegurando-se (?) o normal desenvolvimento das carreiras. Assim, entre a atualização anual e outras valorizações remuneratórias, verificar-se-á um aumento do salário médio superior a 2,5%”. Este último valor percentual deixa-nos muitas dúvidas. Os pontos de interrogação acrescentados por nós também devem ser meditados.
• Valorização dos técnicos superiores, através da atribuição de um aumento de 50€ no salário base das carreiras até 2023. “E um aumento significativo da posição de entrada para quem tenha um doutoramento em área relacionada com as suas funções”. Da mesma forma também os assistentes técnicos e os assistentes operacionais irão ver “a sua carreira reconfigurada, designadamente por força da subida do salário mínimo nacional”.
• Simplificação do regime de acesso à função pública e dos procedimentos de seleção e recrutamento que irão ser agilizados.
• Proposta alteração das tabelas de retenção na fonte de forma a entrarem em vigor em janeiro próximo.
• Revisão dos escalões de IRS, com um “alívio transversal de impostos para todas as classes de rendimento”, revisão já prometido pelo Governo desde 2018 mas sempre adiada, possivelmente pelo efeito da pandemia COVID’19.
• “Devolução de mais de 500 milhões de euros às famílias portuguesas” só com o desdobramento dos escalões.
• Aumento extraordinário de pensões em 10 euros a partir de agosto de 2022 para os pensionistas que recebam até 658 euros por mês.

As medidas previstas para as empresas são, também entre outras, as que se indicam a seguir:
• Criação de um Incentivo Fiscal à Recuperação (IFR), para estimular o investimento privado no 1.º semestre de 2022, permitindo às empresas deduzir à coleta de IRC o montante do investimento por elas realizado até ao limite de 5 M€ (milhões de euros), nos seguintes termos: dedução de 10% das despesas de investimento habituais; e dedução de 25% do valor do investimento adicional (i. é, que supere a média dos últimos 3 anos).
• Vai ser Eliminado definitivamente, esperemos que sim, o Pagamento Especial por Conta (PEC), criado nos tempos de Manuela Ferreira Leite como Ministra das Finanças, pondo se, assim, termo a um “pesado encargo fiscal que onera sobretudo as micro e pequenas empresas”.
• Manutenção dos impostos sobre as empresas que não serão mais aumentados este ano (2022).
• Suspensão, em 2022, do agravamento das tributações autónomas para as micro, pequenas e médias empresas que habitualmente não tinham prejuízos e passaram a tê-los por força da pandemia.
• Criação do Fundo de Capitalização e Resiliência (FCR), com um capital até 1.300 M€, para ajudar a solvência de sociedades comerciais que tenham sido afetadas pela pandemia e reforçar o capital de empresas em início de atividade ou em processo de crescimento e consolidação.
• Previsão de cerca de 112 M€ no PRR em apoios às empresas no âmbito das denominadas Agendas Mobilizadoras para a Inovação Empresarial, que pretendem consolidar e expandir sinergias entre o tecido empresarial e o sistema científico e tecnológico constituído pelas universidades, politécnicos e laboratórios de investigação, com o objetivo de contribuir, desta forma, para o incremento da competitividade da economia portuguesa.
• Prorrogação e melhoria das condições de acesso à linha de apoio à tesouraria para micro e pequenas empresas já existente.
• Revisão do regime fiscal das stock options para as startups tecnológicas.
• Melhoria do regime fiscal aplicável às patentes (patent box) de forma a torná lo num “dos mais competitivos de toda a Europa”!, nomeadamente, isentando de IRC, 85% com royalties e quaisquer outras receitas provenientes da exploração de propriedade intelectual, inclusive da venda de software.
• Continuação da majoração do mecenato cultural para investimentos no património cultural e museológico, em especial no interior, podendo até beneficiar entidades com fins lucrativos que se dediquem a atividades culturais.
• Fixação do mesmo prazo para as obrigações declarativas e de pagamento relativas ao IVA que passam, assim, a ter o mesmo prazo de cumprimento, independentemente do regime – mensal ou trimestral – aplicado.
• Possibilidade de adoção de um plano de pagamento em prestações até 60 meses para as empresas em processos de execução fiscal.
• Sistema de cobrança automática, i. é, sem necessidade de requerimento expresso, pela AT-Autoridade Tributária e Aduaneira de planos prestacionais de empresas dispensadas de garantia, incluindo os que se encontrem em fase de cobrança coerciva.
• Prometida alteração dos prazos de duração dos contratos a prazo, medida que não será certamente, do agrado dos empresários, mas que é defendida pelos sindicatos e trabalhadores.
De referir, para terminar, que o que apresentamos é o que está na proposta de OGE22 que foi, há poucos dias, apresentado na AR mas que pelo facto de o Governo não ter suporte maioritário na AR, poderá sofrer grandes alterações consequência da pressão exercida pelos ‘aliados mais naturais’, os de esquerda ou que apoiaram o chamado governo da geringonça (BE, PCP/PEV e PAN), com vista à sua viabilização. Se estamos bem recordados no ano transato o conjunto dos partidos da AR apresentaram milhares de propostas de alteração em sede de discussão na especialidade, incluindo a imposição da abolição de 50% das portagens nas autoestradas (AEs) (que na prática resultaram num desconto real de cerca de 35%, uma vez descontados os impostos e taxas incluídos nas portagens). A viabilização do OGE22 é fundamental para evitar uma crise política com eleições à mistura e para evitar a governação por duodécimos e o adiamento da utilização dos ambicionados fundos disponibilizados pelo PRR-Plano de Recuperação e Resiliência. A terem que se realizar eleições antecipadas, este facto, vai adiar a utilização dos fundos do PRR e isso trará para a economia portuguesa custos dificilmente quantificáveis, neste momento, mas que são, sem dúvida alguma, de enorme monta. Dentro de dias saber-se-á se o OGE22 passou na generalidade (o debate na generalidade acontecerá a 26 e 27 de outubro) e dentro de pouco mais de um mês (a votação global acontecerá a 25 de novembro) conhecer-se-á o resultado final das difíceis negociações que estão a ser levadas a cabo nos bastidores da AR…