É seguramente pertinente afirmar que uma das grandes metas da actualidade é a da igualdade dos direitos entre homens e mulheres, entre as diversas raças, entre as diferentes religiões e entre as classes sociais. Ainda subsiste, ainda que em moldes diferentes, a velha ideia de que as mulheres, independentemente do grupo social a que pertencem, têm uma dificuldade acrescida na sua promoção profissional, conquistando um número substancialmente mais reduzido de cargos de administração e recebendo um vencimento inferior ao do trabalhador masculino. Este encadeamento poderá ser propício à subsistência de uma dependência da mulher em relação ao homem. Será que a exclusão das mulheres não está intimamente ligada ao âmago da nossa própria cultura, bem como à fragrância da nossa comunidade?
O verbo discriminar, na sua definição preambular, significa prejudicar uma pessoa ou um conjunto de pessoas, com dissemelhantes características, em relação a outros. Todavia, também existe a discriminação positiva que mais não é do que beneficiar um indivíduo ou um grupo de indivíduos, que numa primeira fase estariam numa situação de desvantagem, com o ilustrado propósito de conquistar um patamar de igualdade. A tão desejada e longínqua sociedade igualitária não possuirá indivíduos ou grupos favorecidos, optará sim pelas insígnias do equilíbrio, da harmonia e da paridade.
Com o aparecimento dos movimentos feministas, a função do homem, como único ser fundamental à colectividade, foi colocado em causa. A Declaração Universal dos Direitos Humanos determina que todos os indivíduos, independentemente do sexo, têm direito a ter um papel activo na comunidade e no Governo do seu País. Com a finalidade de reduzir as injustiças e promulgar as ambicionadas mudanças legislativas, muito se tem reivindicado pelos quatro cantos do mundo. Contudo, e se estivermos atentos, podemos observar que em muitas nações onde há progressos legislativos de “apoio” à mulher, há uma série de dubiedades e uma ausência de rigor aquando da sua implementação institucional pela máquina de Estado, que certamente será responsável pelo enfraquecimento da força normativa dessas leis reformistas. Jamais se pode colorir, unicamente com textos legislativos, o “tecido” da igualdade.
As ambiguidades que envolvem o nosso quotidiano devem contribuir para uma cogitação desabrochada sobre os desejos e as expectativas que o homem social pode ter, particularmente para aqueles que estão subjugados às regras “adamadas” pelos grupos mais fortes. Paralelamente, ao aumento das incertezas, não só nos afastamos a passos largos do protótipo da igualdade entre os homens, como também do quadro da cooperação social.
Apesar de defender uma sociedade mais justa, racional e equilibrada, pertenço ao grupo daqueles que discorda com a discriminação positiva para a consecução dessa mesma comunidade. Julgo que não é lógico, nem íntegro, fomentar a “semelhança”, empregando um veículo discriminatório. O favorecimento de um determinado grupo, que à partida está fragilizado, implica, variadíssimas vezes, o prejuízo e a violação dos direitos de outros grupos. Acredito que a descriminação positiva, como por exemplo a da mulher na política, em vez de colaborar para o desmembramento de alguns “clichés” poderá mesmo amamentá-los.
Compreender os motivos responsáveis pela desigualdade social exige uma penetrante e perspicaz discussão política sobre as instituições que socializam os sujeitos e que permitem a convivência dos mesmos com uma infinidade de estereótipos. Esta condição também reivindica que a igualdade de oportunidades passe do lápis e papel para a prática, através do estabelecimento de normas e regulamentos que celebrem o “apuramento” imparcial dos indivíduos para as funções de chefia e de administração.
Não me parece que seja necessário “patrocinar” os grupos em inferioridade, o que será essencial, apesar de mais demorado, é deixar de prejudicar esses mesmos grupos e, somente neste contexto, conseguiremos edificar uma sociedade em que ninguém ficará prejudicado.
A discriminação positiva pode arrogar perfis de uma “ocasionada” configuração, com base na “engenharia” social e quando se discursa sobre as quotas para as mulheres, que eventualmente pode ter consequências indecorosas. A política das quotas alberga o risco da possibilidade de conivência com uma discriminação inversa. A implementação das quotas “instintivas”, sem ter em conta as competências do indivíduo, é uma doutrina antagónica ao direito comunitário. Talvez e infelizmente, adjacente à discriminação positiva esteja uma injustiça invertida em que os habitualmente favorecidos se transformam em sub-privilegiados; ou se estruture uma segmentação inflexível que aniquile a sociedade civil; ou ainda a existência da incerteza, se serão realmente as mulheres as verdadeiras e mais eficazes defensoras delas próprias.