Numa altura em que o Governo prestou contas na AR sobre o Estado da Nação e que movimentos e partidos se afanam numa tentativa para ver quem promete mais ao interior encalhado – não esquecer que estamos a um ano de novas eleições legislativas – é oportuno fazer ma reflexão sobre o tema e das suas implicações para o interior.
É essa reflexão que aqui é deixada.
1._A nível nacional vejamos qual foi o comportamento recente das principais variáveis macroeconómicas. Comecemos pelo Pib e deficit: depois de ter sido um sucesso o ano passado com um crescimento em 2017 de quase 3% desta vez, a acreditar no que diz o próprio Governo, o Banco de Portugal, o FMI e o Eurostat/BCE/UE, continuamos e continuaremos até ao fim do ano com o PIB a crescer esperado de 2.2%, e em linha com a maioria dos países da UE e do Eurogrupo.
Por sua vez o déficit público baixou para valores abaixo dos 3% e atingiu no fim do 1º trimestre 0.5% do PIB (Eurostat), estando este valor no nível registado na média da U.E. e 0,4% abaixo do registado na Zona Euro. Ambas variações muitíssimo positivas. A meta imposta por Bruxelas para o déficit é alcançar 0%/pib num horizonte curto.
Dívida pública e privada: a dívida privada está demasiado elevada e não tem dado sinais de querer baixar significativamente já que as empresas e os privados estão demasiado descapitalizados. Relativamente à dívida pública ela baixou dos 131% para cerca de 126.4% no fim do 1º trimestre deste ano.
Espera-se que continue a baixar já que a meta – difícil de alcançar – é 60%/PIB. Consumo privado: o consumo embora estando a baixar ligeiramente é um dos fatores que explicam o crescimento da economia. Vai continuar a crescer, mas atenção para que as importações não superem novamente as exportações.
Investimento: com as restrições orçamentais o governo tem tido alguma dificuldade em relançar o investimento público apesar de algum dinamismo ao nível do investimento privado. Seria bom que o público também pudesse crescer particularmente nos serviços fundamentais que dependem do Estado (Saúde, Educação, Justiça, …) e que terminasse a sua asfixia aumentada pelas cativações, um instrumento para conseguir manter o equilíbrio orçamental dentro dos limites aconselhados e muito usado pelo atual governo.
Deverá ficar-se próximo dos 4 ou 5% quando países concorrentes estão a investir cerca de 15/20%. Exportações: as exportações têm-se portado bem crescendo trimestre após trimestre. Estão e vão continuar a crescer até ao fim do ano a ritmos razoáveis.
Importações: as importações também têm estado a crescer, particularmente os automóveis, bens de equipamento, produtos alimentares e outros. É preciso é que o Saldo (exp-imp) seja positivo para que as nossas contas externas apresentem ou mantenham o desejado superavit.
Outras variáveis: Taxas de juro: felizmente para as nossas contas e dívidas pública e privada as taxas de juro têm estado muito baixas (e até negativas) consequência da política do “quantitative easing” adotada pelo BCE /compra da nossa dívida e também da recuperação económica nacional.
Espera-se que venham a subir e que não seja demasiado… Preço do petróleo e outros bens energéticos: o preço do petróleo está longe dos valores de 140 dólares por barril que já atingiu em tempos recentes, mas com oscilações conjunturais para cima e para baixo, tem tendência a subir.
O crescimento das energias renováveis, nomeadamente o bom ano hidrológico, tem alguma cota de responsabilidade na sua evolução. Os preços dos outros produtos energéticos (gás natural, carvão, …) evoluem também em função da evolução do preço do petróleo, logo com alguma tendência para subir, embora moderadamente…
Mercado de trabalho e Emprego: De acordo com os dados da Situação do Emprego do 1º trimestre de 2018 divulgados na passada semana (69,2%) situou-se 1% acima do total dos países da OCDE e 0,9% abaixo dos 7: Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e USA/EUA.
Quando comparado com o período homólogo a taxa foi superior em 2,4%. O emprego, aliás, tem tido um ótimo desempenho com criação líquida de dezenas de milhares de postos de trabalho embora com vínculos precários e com salários bastante baixos, o que tem feito regressar alguns milhares de emigrantes (à força) que não tiveram outra solução senão saírem do conforto do seu país e do seu lar quando acabaram os seus cursos.
A facilitação do desemprego e a flexibilização da legislação laboral impostos pela troika tiveram muita responsabilidade no que está a acontecer neste mercado.
Desemprego: concordante com o que acabamos de dizer o desemprego que não há muito andava pelos 17 ou 18% viu o seu valor baixar recentemente para cerca de 7%. Esperemos que continue a baixar para bem de todos e sobretudo dos jovens que ainda se encontram sem emprego e sem estabilidade laboral. Salários e contratação: os salários têm estado praticamente estabilizados, sem crescimento, fruto do desemprego elevado e das facilidades concedidas pela legislação laborar.
Por isso os salários da maior parte do emprego criado não se afastam muito do salário mínimo. Contratação / emprego: a liberalização da legislação laboral imposta pela troika, e bem acolhida pelas empresas, tem facilitado muito a criação de mais postos de trabalho, a redução do desemprego, os baixos salários praticados e também a precarização do emprego, particularmente dos mais jovens.
Confiança dos consumidores e clima económico: Segundo o INE veiculados pelo Económico de 27-5-2018 os níveis de confiança dos consumidores regressaram em abril para um valor muito próximo do máximo histórico. Depois de uma estabilização no arranque do ano, o indicador subiu pelo segundo mês consecutivo para 2,4 p., apenas uma 0.1 a menos do verificado em julho de 2017, quando foi atingido o pico da confiança. Já o clima económico estabilizou.
O aumento do indicador de confiança dos Consumidores verificado em abril refletiu o contributo positivo das perspectivas relativas à evolução do desemprego e da situação financeira do agregado familiar, de forma mais expressiva no primeiro caso” (INE).
Já as expectativas relativas à evolução da situação económica do país e da poupança contribuíram negativamente. Mas olhando para o clima económico, verifica-se, contudo, uma estabilização. O INE dá conta de uma retração da confiança na indústria transformadora, que já se verifica desde o início do ano.
Em contrapartida, a confiança na construção e obras públicas aumentou precisamente desde janeiro, tendo agora atingido o valor máximo desde maio de 2002. No comércio, a confiança diminuiu ligeiramente nos últimos quatro meses, diz o INE, tendo em abril pesado as piores perspectivas sobre a atividade e o volume de vendas. E nos serviços a confiança também está a baixar, já desde fevereiro.
Outras – Sectoriais. Construção e imobiliário: a construção e atividades imobiliárias têm estado nos últimos tempos em constante ebulição nos grandes centros de Lisboa e do Porto com os preços de venda de casa e os de arrendamento a atingirem valores impensáveis há cerca de 2 anos.
Já surgem até avisos de eventuais bolhas imobiliárias (Banco de Portugal e FMI). A esta evolução não é estranha a facilidades de despejo ditada pela lei das rendas de 2013, a procura de estrangeiros (fundos de investimento e pessoas) e a conversão de casas em turismo local.
Nos outros centros de menor dimensão e urbanidade e em geral no interior do país começa a ver-se alguma retoma quer do mercado da reabilitação quer da construção nova. Mas moderada pois os preços de venda e arrendamento permanecem quase inalterados.
Turismo: fruto das crises políticas do norte de África e dos países do Médio Oriente, como a Turquia, o turismo virou-se decididamente para Portugal que nos últimos anos, e um pouco por todo o país, viu aumentar quer o número de turistas, quer o volume de receitas e até a permanência média em terras lusas.
Agricultura e pecuária: a agricultura continua nalgum entorpecimento de que ainda pouco acordou fruto da adesão à UE em 1986, dos subsídios dados para não trabalhar, do abandono dos campos para as cidades nacionais e estrangeiras. Mas vai-se adaptando lentamente impulsionada um pouco pelo regadio e barragem do Alqueva e por outros ares de modernização.
O sector fruteiro e o dos vinhos têm vindo a atravessar bons momentos e a conseguir aumentar mesmo as exportações. A pecuária também se tem vindo a adaptar, apesar de continuar a viver muito dependente dos subsídios à criação de vacas, ovelhas e cabras… Os aramados e a construção de estábulos melhores e mais modernos são alguns dos sinais dessa mudança nas paisagens portuguesas.
Indústria transformadora: O INE dá conta de uma retração da confiança na indústria transformadora, que já se verifica desde o início do ano. Ela está a tentar recuperar da perda que o VAB do sector já teve e que fruto da adesão à CEE/UE perdeu (cerca de 2/3). Há sectores tradicionais que se adaptaram e têm dado boa conta do recado sendo até alguns casos de estudo internacionais, o do calçado, e outros como o têxtil laneiro que tem tido dificuldade em se relançar em novos moldes e capaz de suportar a concorrência imposta pela globalização.
Há também sectores competitivos novos (automóvel e outros). A indústria transformadora de frutos e derivados e a dos derivados de carne têm se vindo a afirmar progressivamente havendo já hoje boas empresas a laborar no mercado, algumas até já multinacionais.
Serviços: O sector dos serviços é habitualmente dos mais dinâmicos em termos quer de abertura quer de encerramentos de empresas e assim tem estado também no corrente ano.
Situação no interior do país
Geral: Numa altura em que pululam por aí movimentos para fomentar o desenvolvimento do interior e os partidos se desmultiplicam em iniciativas que prometem acabar com o marasmo da maior parte do país (quase abandonado) – desconfiamos que seja por causa da proximidade das próximas eleições para a AR, mas oxalá estejamos enganados! – mas em que as portagens das AE não descem teimosamente mais do que os 15% do ano anterior, é interessante discutir como se comporta a atividade económica e social deste interior profundo.
Nesse âmbito pode dizer-se que a situação no interior do país segue em linhas gerais a trajetória das variáveis nacionais acabada de referir, mas sempre com algum desfasamento ou atraso face ao litoral, com a exceção talvez do sector dos call-centers que se instalaram decididamente no interland, dos lacticínios e derivados de carne, vinhos e frutas e criação de gado.
Contudo, julgamos estar em condições e ter elementos seguros para afirmar que há sectores que têm apresentado algum dinamismo em termos de criação de empresas e de empregos, como é o caso da construção, reabilitação, mercado do arrendamento e atividades imobiliárias – embora a ritmo muito inferior ao registado em Lisboa e Porto, da aeronáutica em Évora, do calçado, dos plásticos na BI, dos componentes de automóveis, e de outros. Nos restantes sectores temos as eternas duas velocidades: a do litoral, a mais rápida, e a do interior, a mais lenta, agravando cada vez mais o fosso litoral-interior (que representa 80% do país).
Emprego e desemprego: tem sido criados alguns postos de trabalho nas empresas e serviços da região o que tem feito com que os números absolutos do desemprego e inclusive a taxa de desemprego dos principais centros urbanos tenham vindo a decrescer sustentadamente (nos mais pequenos o desemprego é sempre muito baixo porque a maior parte das pessoas, descrentes das oportunidades de emprego nesses locais, saem para as cidades e é nas listas dos centros de emprego dessas cidades que eles estão inscritos).
No caso dos contratos de trabalho, predominam os contratos a termo certo e outros ainda mais precários como os recibos verdes, com os valores dos salários oferecidos a não se afastarem grande coisa do salário mínimo nacional.
Investimento público: anunciaram-se e estão já em execução importantes investimentos nas linhas de caminho de ferro dos distritos do interior, o troço Covilhã-Guarda na BB e o traço Guarda-Cerdeira na BA. Isto são duas boas notícias. (Escrito em julho de 2018)