Pois por muito que se discuta a bondade das leis produzidas, há duas coisas que teimam em acontecer: ignora-se o primado das leis, por um lado, e ditam-se normas sem conhecimento da realidade, por outro.
Entrámos num modo “fazer para aparecer”, bem ou mal.
Veja-se, então, a Lei n.º 49/2012, de 29 de agosto – que aprovou o Estatuto do Pessoal Dirigente da Administração Central, Regional e Local do Estado – que obrigou os municípios a promover a reorganização dos seus serviços, até 31 de dezembro de 2012, em obediência a critérios de densidade ali previstos. A intenção seria a redução (imediata) de chefias, porque para os nossos responsáveis políticos, isso traduziria uma poupança real para a respetivas administrações. Ignorando, claro está, que uma maioria de dirigentes, já exerceria as funções pela remuneração de origem, logo, o regresso a este lugar, em termos remuneratórios não aconteceria, mas antes, a redução de uma chefia. E numa virada, num diploma que recolhe 28 artigos em 6 páginas, dá-se o arranque de uma “reforma”, que acena às pretensões da Troika. Aparentemente.
Assim, os municípios só têm direito a chefias, consoante o requisito populacional que preencham, sendo que o mínimo, é uma chefia por município. Não se procurando salvaguardar uma exceção para os municípios que em 2010, haviam promovido, por força do Decreto – Lei n.º 305/2009, de 23 de outubro, a organização dos serviços (sim, em menos de dois anos desarrumámos duas vezes a estrutura), com rigor. Tratou-se tudo por igual. Do trabalho realmente feito (onde a contenção já acontece desde 2010) ao copy paste de DRE.
Todavia, este diploma admite numa norma transitória, que, querendo o dirigente máximo, se ”ignorará” a regra, mantendo no ativo as chefias.
Ou seja, um município que à luz das novas regras só possa ter 4 chefes de unidade orgânica, mas que à data tenha 8, estes, por período transitório, podem manter-se pelo tempo que reste até ao final da comissão de serviço.
A razão de ser da norma poderá prender-se com dois aspetos, um financeiro e outro político. Quanto ao financeiro, o facto de as chefias estarem com uma comissão de serviço, com duração de 3 anos, e que a cessar antes de decorrido aquele tempo – por força de uma reorganização (como será o caso presente) – conferirá ao dirigente uma indemnização, e dado que os municípios (alguns) enfrentam dificuldades de tesouraria, manter as comissões seria, para já, a solução.
Quanto à opção politica, este é um ano marcado pelo calendário eleitoral, em que alguns Presidentes de Câmara deixarão de vez o mandato, e outros há, que poderão perder aquele. Nestas circunstâncias, que Presidente planeia com estratégia a arrumação da sua estrutura, sabendo que em outubro, tudo poderá mudar? Que Presidente assume a cessação de comissões de serviço do futuro e potencial eleitorado?
E depois temos aquelas questões (minudências para quem está ao longe a ditar leis) básicas e elementares para a boa gestão dos recursos humanos: como poderei implementar um SIADAP com uma chefia? Ignoro as regras daquele diploma a favor deste? Sobreponho no dirigente a responsabilidade de acumular várias unidades orgânicas (ganhando uma só remuneração, claro)?
O papel do dirigente é determinante para o bom andamento da organização humana, seja em molde público ou privado. A arrumação da casa, através de várias “divisões” é, por isso, essencial para dar resposta aos desafios que se colocam ao poder local. E lançando mão da falta de mérito que se cultiva por entre as chefias (cujo tema já abordei), importa refletir que num tempo de mudança e responsabilidade, o dirigente de hoje enfrenta uma lei dos compromissos, um Siadap, e uma mobilidade especial, matérias sérias, melindrosas e transversais à administração. Do assistente operacional ao vereador. E sempre debaixo da tutela do Presidente.
Conclusão: reformar por reformar, tem de ser mais do que parecer, importa conhecer, sob pena de exigirmos do outro, aquilo que não lhe demos.