Lítio: Presidente da Câmara do Fundão vê no processo “alguma intransigência” e “tiques de arrogância”

O autarca deu o exemplo do caso da Serra da Argemela, nos concelhos do Fundão e Covilhã, que, apesar da contestação e dos pareceres negativos, já tem contrato de concessão assinado.

O presidente da Câmara do Fundão, Paulo Fernandes, saiu desiludido da reunião realizada com o ministro do Ambiente sobre a prospeção do lítio e revelou ver no processo “alguma intransigência” e “tiques de arrogância”, disse hoje o autarca à agência Lusa.

“Sentimos que isto é um assunto fechado, o que demonstra alguma intransigência e até, eventualmente, aqui ou acolá, com alguns tiques de arrogância relativamente a todo o processo”, apontou Paulo Fernandes (PSD), a propósito das conclusões da reunião realizada na quarta-feira.

O ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes, promoveu esta semana reuniões com os autarcas das áreas que foram aprovadas para a prospeção e pesquisa de lítio.

Paulo Fernandes disse hoje que foi com “desilusão” que ouviu as respostas dadas pelo governante, nomeadamente no que concerne aos pareceres dos municípios.

“Foi com enorme desilusão que ouvi da parte do senhor ministro que os pareceres dos municípios não terão valor vinculativo, contrariando o que está na ‘lei das minas’ recentemente aprovada”, afirmou.

Paulo Fernandes disse que se trata de uma “reinterpretação”, que põe em causa “o espírito e a letra da lei” e que quer “impor” uma decisão.

“Há uma preocupação acrescida que decorreu desta reunião e, simultaneamente, alguma frustração por considerarmos que o nosso papel como gestores do território está evidentemente a ser posto em causa”, acrescentou.

A manter-se a ideia de que os pareceres das autarquias serão apenas consultivos, Paulo Fernandes disse que os municípios terão de “avaliar juridicamente” a situação.

“Perante esta reinterpretação da lei, obviamente teremos de analisar em termos jurídicos para ver se de facto há mecanismos legais para tentar parar este processo e para que seja corrigido o mapa final”, apontou.

Segundo esclareceu, a questão já está a ser analisada coletivamente, no âmbito da Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela (CIM-BSE), que agrega 15 municípios, boa parte dos quais presentes nas áreas de prospeção aprovadas.

Frisando que a maioria dos pareceres não é contra a prospeção de lítio em si, mas sim relativamente às “incompatibilidades” que existem nas zonas abrangidas, este autarca destacou o facto de a área de prospeção prevista para os concelhos de Belmonte, Covilhã e Fundão coincidir com o Regadio da Cova da Beira.

“O setor agrícola e agroindustrial da nossa região vale seguramente mais de 100 milhões de euros por ano e ter uma possível exploração mineira no coração agrícola da região comporta um risco muito grande de desvalorização de todas as cadeias de valor do setor. Atenção que não estamos a falar de algo melhor ou de uma teimosia”, fundamentou.

Para Paulo Fernandes, as contrapartidas prometidas de “alguns milhares de euros” não compensariam as perdas.

O autarca destacou ainda que este não é um mero “processo de prospeção” e que, caso se confirme a existência de recursos, os procedimentos avançarão para a exploração.

Perante isso, reiterou a importância de o projeto ser parado e “corrigido” já nesta fase, porque posteriormente será muito difícil.

O autarca deu o exemplo do caso da Serra da Argemela, nos concelhos do Fundão e Covilhã, que, apesar da contestação e dos pareceres negativos, já tem contrato de concessão assinado e que só depende da Avaliação de Impacto Ambiental.

Depois das reuniões com os autarcas, Matos Fernandes anunciou que o Governo vai fazer sessões de esclarecimento nos concelhos onde haverá pesquisa para eventual exploração de lítio, para “que se perceba” que “tem mesmo regras ambientais” e quais são os “ganhos económicos”.

O Ministério do Ambiente anunciou no dia 02 que a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) em áreas com potencial de existência de lítio viabilizou a pesquisa e prospeção em seis zonas, propondo nestes locais uma redução da área inicial para metade.

A decisão de avançar com a prospeção tem sido contestada por autarquias e associações ambientalistas.

Segundo o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, as regras da exploração deste metal vão incluir a proibição de venda em bruto e “nem um grama deste lítio vai ser processada fora de Portugal”.

A AAE promovida pela Direção-Geral de Energia e Geologia viabilizou as áreas denominadas “Seixoso-Vieiros”, que abrange os concelhos de Fafe, Celorico de Basto, Guimarães, Felgueiras, Amarante e Mondim de Basto; “Massueime”, que atinge os municípios de Almeida, Pinhel, Trancoso e Mêda; “Guarda-Mangualde C (Blocos N e S)”, que inclui Belmonte, Covilhã, Fundão e Guarda; “Guarda-Mangualde E”, que abrange Almeida, Belmonte, Guarda e Sabugal; “Guarda-Mangualde W”, que inclui Mangualde, Gouveia, Seia, Penalva do Castelo e Fornos de Algodres, bem como “Guarda-Mangualde NW”, com Viseu, Penalva do Castelo, Mangualde, Seia, Nelas e Oliveira do Hospital.


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