Vem isto a propósito das medidas anunciadas para fazer face aos esvaziamento do interior, para interromper o processo de desertificação em curso do interior do país que abrange cerca de 80% do país.

A recente aprovação do Orçamento Geral do Estado trouxe para a ribalta e a discussão as medidas que o Governo aí propõe para fazer face ao desenvolvimento do interior, que é como quem diz para estancar o processo de desertificação que 80% do país atravessa desde os anos 50-60 do século passado. É esse o objetivo deste apanhado onde elencamos as medidas anunciadas pelo governo – que até criou um Ministério para a Coesão Interna e descentralizou três Secretarias de Estado. Terminamos, tecendo alguns comentários pessoais, não muito abonatórios, sobre estas medidas.

Só há muito pouco tempo, e a muito custo sem a ajuda da geringonça, foi aprovado o Orçamento de Estado para 2020, e só há pouco tempo se vão anunciando as medidas mais emblemáticas nele contidas e muitas vezes anunciadas de forma distorcida por darem uma ideia risonha do que afinal não é bem assim. Vem isto a propósito das medidas anunciadas para fazer face aos esvaziamento do interior, para interromper o processo de desertificação em curso do interior do país que abrange cerca de 80% do país, isto é, tudo menos a faixa litoral Setúbal-Braga e mesmo aí com algumas exceções. Mas vejamos o que tem sido anunciado e tem sido veiculado pela imprensa e diplomas legais que vão sendo conhecidos.
Os apoios ao desenvolvimento do interior podem revestir a forma de subsídios, de descontos ou de benefícios fiscais. Destinam-se a três tipos de pessoas e empresas, a saber a quem queira trabalhar por conta de outrem, a quem queira criar o seu próprio negócio e a quem queira investir na expansão da própria empresa. Os apoios destinam-se a quer a quem queira mudar para o interior quer a quem já viva no interior, de famílias a empresas. O programa de apoio à mobilidade contém diversas medidas que se destinam a quem vive no litoral ou no estrangeiro e pretende mudar para o interior de Portugal.


Apoios para quem queira trabalhar por conta de outrem
Uma análise mais detalhada desses programas primeiro para quem queira trabalhar por conta de outrem refere que o trabalhador tem direito a um apoio à mobilidade até 4826.91 euros dependendo do número de familiares que envolver na sua deslocação a título permanente. O valor mínimo é €2632.86, a que acrescem €877.62 para despesas de transporte de bens e +20% de majoração por cada membro da família até €1316.43. Para os emigrantes que queiram regressar e radicar-se no interior do país o apoio começa nos €3291.08 de apoio inicial podendo chegar aos €7679.18.
Também estão previstos apoios ao nível do IRS. Viver no interior vai permitir maiores abatimentos ao IRS em termos de despesas com a renda da casa e a educação dos filhos, subindo de €502 para €1000 a dedução à coleta com o aluguer de habitação permanente no interior por um período de 3 anos.
Também sobe de €800 para €1000 a dedução à coleta com a educação de estudantes em escolas do interior sendo estas despesas majoradas em 10%. A este propósito o jornal Expresso do passado fim de semana refere alguns exemplos que vamos ver como é o caso de uma família da Guarda com rendimento declarado de €33600 com €7200 de renda de casa e €3000 com educação do filho que terá um desconto de IRS (logo pagará menos) de -€638 de IRS face a outro trabalhador que esteja radicado no litoral.
Está também previsto alguma apoio às empresas, nomeadamente apoios à contratação no interior. Nesse âmbito está contemplado no novo subsídio +CO3SO que pode render ao empregador até €82105.74 por posto de trabalho criado. Este empregador do interior também recebe mais do IEFP por cada estágio profissional (75%), pode ter um prémio emprego quando converta um estágio num contrato de trabalho sem termo, caso em que pode receber até €3291.08, ou beneficiar de contrato emprego para desempregados, caso em que pode receber até €6516.30.
As empresas que contratem pessoal altamente qualificado como licenciados, mestres ou doutores podem beneficiar de incentivos do Portugal 2020 candidatando-se a apoios a essa contratação. Neste âmbito é possível beneficiar de fundos comunitários que podem pagar 50% dos encargos com o salário base, descontos para a segurança social e seguro de acidentes de trabalho ao longo de um período de 3 anos.
Em vez da isenção total de portagens nas AEs pedida pelas populações do interior (reposição das SCUTs) o Governo anunciou um desconto nas portagens das AEs para o interior que pode ir até 25% para veículos de classe 1. O complicado esquema para dele beneficiar funciona assim: nos primeiros 7 dias de circulação não desconta nada, desconta depois 20% nas viagens realizadas entre o 8º e o 15º dias e desconta 40% a partir 16º dia e até ao fim do mês.


Apoios para quem queira criar o seu próprio negócio
Quem mude para o interior e crie o seu próprio emprego tem logo um apoio à mobilidade que pode ir até €4826.91 em função do número de familiares que levar consigo a título permanente. Este subsídio começa nos €2632.86 a que se somam €877.62 para mudanças e transporte de bens que também beneficiam de uma majoração de 20% por cada membro da família até €1316.43. Os emigrantes que regressem do estrangeiro para o interior do país beneficiam de um apoio que começa nos €3291.08 e pode chegar aos €7679.18.
Quem queira criar o seu próprio negócio também tem maiores abatimentos ao IRS em termos de despesas com a renda da casa e a educação dos filhos.
Caso constitua uma empresa pode beneficiar da redução do IRC pago pelas micro, pequenas e media empresas (MPMEs) do interior: os primeiros €25000 de matéria coletável ficam sujeitos ‘apenas’ a uma taxa especial de 12.5% (em vez dos 25% habituais). Usando um ex. também divulgado pelo semanário acima referido de uma empresa de Arraiolos com matéria coletável de 24000E chega-se à conclusão que ela passará a pagar -€1080 de IRC do que idêntica empresa radicada no litoral.
O empregador pode receber um subsídio de até €82105.74 por posto de trabalho criado, incluindo o próprio emprego no âmbito do previsto no programa +CO3SO emprego. Esse subsídio é recebido durante 3 anos em empresas novas, com menos de 5 anos. Podem beneficiar projetos de empreendedorismo social e com contratação de pessoal com deficiência, vítimas de violência doméstica, famílias monoparentais, etc. Para isso têm que Concorrer via portal dos fundos comunitários Portugal 2020 e solicitando incentivos ao empreendedorismo. O novo vale investimento paga 50% dos investimentos de MPME que substituam importações, que queiram digitalizar-se ou que queiram aderir à sustentabilidade Ambiental, mesmo sem necessidade de criar postos de trabalho.
Por cada estágio profissional o empregador do interior recebe uma comparticipação maior do IEFP (75%), ou, no âmbito do prémio emprego que converta um estágio profissional num contrato de trabalho sem termo, caso em que vai até €3291.08, ou no âmbito do contrato emprego para desempregados que pode receber até €6516.3.
Descontos nas portagens das autoestradas. Quem circule todos os dias do mês pelas AEs do interior num veículo classe 2 tem 25% de desconto nas portagens (após 7 dias de circulação com desconto de 0%, desconta 20% entre o 8º e o 15º dias e passa descontar 40% a partir 16º dia). Indo à mesma fonte colher um exemplo, para quem faça todos dias a viagem C. Branco-Covilhã pela A23 poupa €100.32/mês e €1203.84 por ano.

Programas de apoio para investir na expansão da própria empresa
O Portugal 2020 reserva pelo menos €110 milhões para fábricas, hotéis e outros projetos de inovação produtiva, €20.5 milhões para I&DT-Inovação e Desenvolvimento Tecnológico em parceria com universidades, institutos politécnicos e outros centros ou entidades do sistema de investigação e inovação, €13 milhões para parcerias internacionais de I&DT e €10 milhões para ações coletivas de transferência de conhecimento. Os micros e pequenos empresários têm até €50 milhões em vales investimento. As empresas têm até €10 milhões para contratarem recursos humanos altamente qualificados já antes referidos (licenciados, mestres e doutores) casos em que os fundos europeus pagam 50% dos encargos com o salário base, descontos para a segurança social e seguro de acidentes de trabalho, ao longo de 3 anos.
Os novos subsídios no âmbito do programa +CO3SO pode apoiar a contratação de trabalhadores em MPMEs já estabelecidas: para esse efeito estão previstos ate €125.3 milhões para o interior para comparticipar integralmente todos os custos diretos com os empregos criados ao longo de 3 anos; o valor do subsídio depende do número de postos de trabalho criados: cada um dos 3 primeiros empregos vale €68421.45, do 4º ao 6º vale €54737.16 e a partir do 7º cada um vale €41052.87. O máximo pode ir a €82105.74 caso haja contratações de algum deficiente, vítima de violência doméstica, família monoparental, etc..
Também por cada estágio profissional o empregador do interior recebe uma comparticipação maior do IEFP (75%) ou prémio emprego que converta um estágio profissional num contrato de trabalho sem termo – até €3291.08 – ou contrato emprego para desempregados – até €6516.3.
Igualmente neste caso as MPMEs do interior passam a pagar uma taxa de IRC de 12.5% nos primeiros 25000 euros de matérias coletável. Beneficiam ainda de uma majoração de 20% na dedução a coleta por lucros retidos e reinvestidos. Por exemplo uma empresa de C. Branco que reinvista €100 mil na aquisição de uma fábrica ou noutros ativos elegíveis paga -€2 mil de IRC face a outra instalada no litoral.
Os descontos nas portagens para veículos das classes 2, 3 e 4 destinados ao transporte de mercadorias aumentam de 30% para 35% de dia e de 50% para 55% de noite. O transporte de passageiros também pode beneficiar destes descontos. Por exemplo um bus que faça todos os dias o trajeto de VRS António a Lagos e regresse, pela A22, poupa €599.4 por mês e €7192.8/ano.
Esta listagem e descrição não dispensa a consulta das Comissões de Coordenação Regionais e do IEFP para obtenção de melhores esclarecimentos.


Comentários em jeito de síntese: Trata-se sem dúvida de medidas que temos que saudar se tudo correr como deve ser e forem aplicadas. Não é muito, mas é já alguma coisa. É nossa convicção, contudo, que a montanha vai parir um rato e que no fim do ano o processo de desertificação vai estar na mesma ou até pior. Isto porque criar medidas no papel como estas é fácil mas as limitações orçamentais são grandes, os plafonds estabelecidos são baixos e as regulamentação e burocracias para deles beneficiar que lhe vão estar associadas vão fazer com que muitos destes apoios fiquem pelo caminho. Lembremo-nos dos apoios do ano passado criados para apoiar quem quisesse regressar a Portugal e que no final do ano só abrangeram um pequeníssimo número de pessoas. As primeiras reações dos stakeholders ou interessados, particularmente dos estudiosos e empresários são de alguma desilusão sobretudo tendo em atenção que a criação destes apoios foi precedida pela criação de um Ministério para a Coesão Interna e da descentralização de três Secretarias de Estado localizadas em Bragança, Guarda e Castelo Branco, o que criou alguma expectativa de que, finalmente, se iria começar a encarar a sério este gravíssimo problema do país. Também o anunciado desconto nas portagens nas AEs que servem o interior criou algumas boas expectativas que foram defraudadas quando se anunciou o complicadíssimo esquema de descontos acima referido mas que afinal como foi criado e anunciado vai beneficiar muito pouca gente e com benefícios insignificantes para aqueles que conseguirem ter algum benefício.