A 19 de Janeiro de 2012, um grupo de deputados convidou o Tribunal Constitucional a conhecer e a declarar a inconstitucionalidade da suspensão do pagamento dos subsídios de férias e natal, previsto no artigo 21.º do Orçamento de Estado 2012 – aprovado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro – aos trabalhadores que exercem funções públicas e aposentados. A opção pela suspensão do pagamento daqueles subsídios, no lugar de reduzir mensalmente os vencimentos, deveu-se, nas palavras do Relatório do Orçamento de Estado de 2012, à preocupação em salvaguardar «a mais-valia que a estabilidade remuneratória mensal proporciona, dado que alternativas de reduções remuneratórias que implicassem uma diminuição dos montantes que a cada mês fazem face às despesas dos agregados seriam certamente mais penalizadoras e de muito mais difícil gestão». No entanto, tal argumento colide com a noção que resulta, hoje, do artigo 70.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, onde se estabelece que a remuneração anual é paga em 14 mensalidades, correspondendo uma delas ao subsídio de Natal e outra ao subsídio de férias, nos termos da lei. Significa isto, que a ablação dos respectivos subsídios, de uma forma inicialmente encapotada, traduziu a redução percentual do rendimento das pessoas seleccionadas. Se a declaração de inconstitucionalidade do Acórdão n.º 353/2012, de 5 de Junho, traduz “vitória”, o mesmo não se dirá quanto à produção de efeitos. Catarina Sarmento e Castro, de entre os oito juízes, na sua declaração de voto aponta com clarividência, «que a solução equilibrada seria ressalvar da declaração da inconstitucionalidade que agora se opera, somente os efeitos produzidos pelas normas até à publicação do presente acórdão.» Mas porque por maioria se decide, a maioria decidiu uma espécie de inconstitucionalidade que é constitucional. Confuso? Na prática, a bem da execução orçamental (alegam eles que não há tempo para enxertar remendos) para o ano de 2012 “finge-se” que a suspensão dos pagamentos é viável. Não obstante, na viragem da noite de 31 de Dezembro de 2012 para 1 de Janeiro de 2013, por entre as 12 passas, à nossa espera estará, então, um novo ano protegido pela Constituição da República Portuguesa. Aceitando, sem esmiuçar, esta frieza constitucional, há no entanto uma questão que merece análise e atenção ao nível do processamento das remunerações em causa, neste ano de 2012. Se é “pacífica” a suspensão do pagamento dos subsídios em relação ao ano de 2012, convirá ter presente que a norma do artigo 21.º dispõe, também, para o futuro, porquanto chama à suspensão o pagamento de proporcionais referentes aos subsídios, sobre férias que se venham a vencer, ou seja, referentes ao ano de 2013. Tal acontece, quando estamos diante da cessação da relação jurídica de emprego público – ou porque a contratação a termo atingiu o limite máximo, ou por força de uma aposentação -, porque a par do que acontece nos sistemas publico e privado, nós trabalhamos num ano, para adquirir férias no outro. Ora, quando a relação de emprego público cessa, há lugar ao pagamento do que fica por gozar, que se terá vencido a 1 de Janeiro de 2012 (pelo trabalho prestado no ano de 2011) assim como, os proporcionais devidos por cada mês de trabalho completo, e que, se o trabalhador estivesse ao serviço em 2013, iria receber. Se a declaração de inconstitucionalidade opera efeitos para o ano de 2013, neste cenário, poderemos admitir que é devido tal pagamento ainda este ano, a todos os trabalhadores que tenham cessado, ou venham a cessar no ano de 2012, as suas funções. Por último, poder-se-ia invocar que o Tribunal declarou para este ano a constitucionalidade da letra do artigo 21.º, e nessa medida (mesmo dispondo para o futuro) as consequências práticas seriam passíveis de se admitir. Contudo, e sem perder da vista o enquadramento inicial, da norma em apreço não se conhece a palavra “pagamentos”, mas antes a concretização de direitos que já se venceram (2012), e venham a vencer-se posteriormente (2013), direitos, estes, já acautelados, sem erro temporal, no dito Acórdão.
Se a declaração de inconstitucionalidade do Acórdão n.º 353/2012, de 5 de Junho, traduz “vitória”, o mesmo não se dirá quanto à produção de efeitos.