Fábio Silva, astrónomo português da University College London, descobriu pela orientação de construções megalíticas com seis mil anos que o nome da Serra da Estrela tem origem na estrela Aldebaran.
As entradas dos dólmens construídos há seis mil anos em volta da maior montanha da Serra da Estrela estão todas viradas para o lugar onde, no horizonte, a estrela Aldebaran nasce em abril, e explicam a origem do nome da mais alta serra de Portugal Continental. Quem descobriu o segredo guardado por aquelas construções megalíticas foi o astrónomo português Fábio Silva, investigador na University College London, onde está a fazer um doutoramento em arqueologia, depois de se ter doutorado em astrofísica na Universidade de Portsmouth, também no Reino Unido. Num artigo publicado na revista científica de referência internacional “Papers from the Institute of Archaeology”, Fábio Silva revela a importância da estrela Aldebaran, a mais brilhante da constelação do Touro, para os povos pré-históricos e explica de que forma as lendas locais da Serra da Estrela confirmam a sua tese.
À procura de um padrão nos dólmens
Em 2010 o investigador, que estudou na Universidade de Aveiro, iniciou na região entre os rios Mondego e Douro um projeto de prospeção dos dólmens, monumentos megalíticos pré-históricos construídos há cerca de 6000 anos, que também são conhecidos por antas ou orcas. “O objetivo era verificar se existiria algum padrão a nível de orientação e implantação na paisagem, e se esse padrão corresponderia a algum evento astronómico como acontece, por exemplo, em Stonehenge”, conta Fábio Silva. Stonhenge, o famoso monumento megalítico localizado no Reino Unido, encontra-se alinhado com o nascer do Sol no solstício de verão e com o pôr do Sol no solstício de inverno.
Orientadas para a serra
Três anos depois de ter começado o projeto, o astrónomo já tinha estudado mais de 50 antas e concentrou-se no vale do Mondego, na região de Carregal do Sal, “que tem vários monumentos megalíticos em bom estado de conservação e restauro”. Foi então que detetou um padrão comum: todas as antas ou dólmens estão orientados para a Serra da Estrela. O passo seguinte foi “tentar perceber se a zona da Serra da Estrela que é observável dentro de todos os dólmens – uma encosta – poderia ter algum significado especial relacionado com o nascimento de um astro”, prossegue Fábio Silva. E de facto tinha, porque há cerca de 6000 anos a estrela Aldebaran, a mais brilhante da constelação do Touro, nascia exactamente sobre a Serra da Estrela no final de abril, princípio de maio.
Ciência confirma lendas locais
“O nascimento desta estrela muito brilhante e vermelha, no período em que os dólmens foram construídos, ocorria numa altura em que as comunidades do vale do Mondego iam passar os meses mais quentes do ano nos prados da Serra da Estrela”, onde alimentavam os seus rebanhos de ovelhas e cabras, revela o astrónomo. “A observação astronómica funcionaria, assim, como um perfeito marcador sazonal para estas comunidades”. As lendas locais contam a história de um pastor que vivia no vale do Mondego e ao ver uma estrela nascer sobre uma serra no horizonte, decide ir atrás dela. Quando chega à serra decide dar-lhe o nome de Serra da Estrela. Fábio Silva explica que “esta narrativa é bastante semelhante ao que a arqueologia e a arqueoastronomia nos dizem: as comunidades neolíticas do vale do Mondego que praticavam a pastorícia, ao observarem a estrela Aldebaran a nascer, deslocavam-se para as cotas mais elevadas da serra, onde permaneciam durante os meses quentes”. Estamos, assim, perante um caso em que o folclore “pode ter mantido viva a memória de algo de extrema importância há 6000 anos atrás”.