Uma espécie de terapia: Feliz Dia do Pai, no meio do Caos!

É um jogo de estratégia sem regras definidas, um salto para o incerto, sem rede e sem manual de instruções.

“Olha as estrelas, os grandes reis do passado, olham para nós lá das estrelas. E sempre que te sentires sozinho, procura lembrar que aqueles reis estarão sempre lá para te guiar, e eu também sempre estarei…” Mufasa – O Rei Leão


Dizem que ser pai biológico ou de afetos é a melhor coisa do mundo. Mas esquecem-se de avisar que também é a mais caótica. É um jogo de estratégia sem regras definidas, um salto para o incerto, sem rede e sem manual de instruções.


Tudo começa muito antes de ouvirmos o primeiro choro ou de segurarmos esse ser frágil. Começa na inquietação silenciosa de quem, sem saber como, já se sente responsável por um amor, seja lá o que isso significa. Há uma coisa que nunca me convenceu. Quando alguém me diz que sente um amor incondicional por um filho que acaba de nascer/adotar, hesito. Porque ninguém ama, ou deveria amar, o desconhecido. O amor não acontece de forma plena e definitiva, como um milagre. Ele constrói-se, molda-se, desafia-nos. No início, talvez amemos mais a ideia do que o próprio ser. Criamos um esboço mental, um reflexo de nós mesmos. Projetamos sonhos e esperanças num pequeno ser que ainda não tivemos o privilégio de conhecer. Talvez seja um ato egoísta: desejamos que os nossos filhos sejam extensões do que somos, mas na verdade serão tudo aquilo que nunca imaginámos. Ser pai é, antes de tudo, um ato de desapego. Entramos neste papel carregando certezas, mas logo percebemos que o amor não é uma construção nossa, é uma resposta que nasce no inesperado. Amamos, não porque os filhos correspondem às nossas expectativas, mas porque, aos poucos, ensinam-nos que o amor real não tem e nem deve ter condições. Se assim não for, a obsessão toma o lugar do afeto e o medo impede-nos de viver o presente.


Entre noites mal dormidas, das birras sem sentido e das gargalhadas espontâneas, aprendemos que ser pai não é apenas orientar ou ensinar, é ser guiado e reaprender todo um mundo pelos olhos deles. Cada gesto, cada descoberta, cada queda, vai apagando a projeção do que queríamos que fossem e revelando quem realmente são. Ser pai é ter humildade para nos perdermos para depois nos encontrarmos. É aceitar o caminho e amar pelo que são.


Quando a primogénita nasceu, percebi que nunca mais estaria sozinho. Mesmo nos momentos em que o silêncio se tornava ensurdecedor, o seu carinho e a sua voz tornaram-se visceralmente o meu refúgio. Quando nasceu a do meio, aprendi que no amor não se faz “contas de menos” e não se divide, multiplica-se. E aquelas birras, de “bradar aos céus”, eram saradas por aquele sorriso e um olhar terno. Agora, prestes a ser pai de três, sei que vou viver num estado de emergência constante. Onde a fadiga e a felicidade andam de mãos dadas, como velhos compinchas que se provocam, mas nunca se abandonam, trazendo-me uma nova aurora! A primeira ensina-me sobre a responsabilidade. A segunda, sobre a paciência. A terceira, já me doutrina sobre a arte de improvisar. Ser pai de três é ser três vezes mais do que alguma vez fui.


Sinto nos ombros um peso invisível. Como criar alguém para um mundo que, muitas vezes, nos parece irreparável? Pensar demasiado nisso torna-se assustador! Ser pai de três não será apenas um jogo de estratégia e logística. Não é só aprender a dividir o tempo entre choros, trabalhos de casa e perguntas sem resposta. É entender o universo individual, com sonhos, medos e esperanças que serão tão diferentes. E que serão elas a trilhar o seu caminho e que o Simba não estará sempre lá para as proteger dos perigos do mundo e dos príncipes ou princesas desencantadas!


Ser pai é isto: um treino constante de equilíbrio desequilibrado. Entre o ser rígido e ser justo. Entre proteger e permitir que errem. Entre segurar e soltar. Mas ninguém é pai sozinho. É uma construção coletiva, feita de muitas mãos, de muitos corações, de muitos momentos partilhados.


Há dias em que sinto que falhei. Dias em que a paciência se esgota, o cansaço vence e o medo de errar pesa mais do que o orgulho de acertar. Mas depois vejo-as ali. A crescer. A descobrir o mundo. E percebo que ser pai não é saber tudo, nem nunca falhar. É estar presente. É tentar todos os dias. É plantar raízes num chão incerto e acreditar que, mesmo quando já não estivermos aqui, algo permanecerá. Porque ser pai não é apenas dar a vida. É ensinar que a vida, mesmo nos dias mais difíceis, vale sempre a pena. Ai terei cumprido a minha missão.


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