Câmaras desafiam Governo e mantêm 35 horas para os seus trabalhadores

Autarcas e sindicatos exigem acesso ao parecer da PGR que o Governo usa para argumentar que as câmaras, por si só, não podem negociar horários mais curtos.

A maioria das câmaras que assinaram acordos com os sindicatos para aplicar as 35 horas semanais de trabalho vai manter esse horário, apesar do Ministério das Finanças ter avisado, na sexta-feira, que as autarquias que o fizerem estão a violar a lei geral, que estabelece 40 horas.

“A nossa intenção é manter as 35 horas, mas temos de analisar melhor o comunicado do Ministério das Finanças, que é um pouco ambíguo”, diz o presidente da Câmara de Sintra, Basílio Horta. Mas defende: “Uma coisa é o comunicado das Finanças, outra coisa é a lei e está dentro da nossa liberdade negociar estas matérias”. Além disso, Basílio Horta refere que, no caso de Sintra, o horário das 40 horas “é prejudicial para todos”.

Para o presidente da Câmara de Loures, Bernardino Soares, não há qualquer dúvida: “Nós temos acordos com os sindicatos e foi-nos recusado o depósito na Direção-Geral da Administração e Emprego Público (DGAEP) e, por essa razão, recorremos aos tribunais. Até haver decisão, aguardamos serenamente e é óbvio que mantemos as 35 horas até porque acredito que os tribunais vão dar-nos razão”, diz Bernardino Soares. “O Ministério das Finanças não manda nas autarquias”, frisa o autarca.

Também o presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, já tinha vindo a público, em fevereiro deste ano, sublinhar que os trabalhadores da maior autarquia do país iriam cumprir 35 horas semanais, conforme acordado com os sindicatos. Segundo apurou o Diário Económico, também outras câmaras municipais como é o caso de Cascais, Vila Franca de Xira ou Aveiro deverão manter as 35 horas de trabalho.

O aviso das Finanças foi publicado na sexta-feira em forma de comunicado, no qual o Ministério anunciava a homologação do parecer pedido à Procuradoria-Geral da República (PGR) em fevereiro, sobre o qual não se conhece até hoje o seu conteúdo. O parecer chegou às mãos do secretário de Estado José Leite Martins em maio mas, apesar dos insistentes pedidos dos sindicatos e dos partidos da oposição, nunca foi tornado público.

No comunicado, as Finanças dizem que, segundo o parecer da PGR, os acordos assinados entre as autarquias e os sindicatos que permitem as 35 horas têm de contar com a intervenção do Ministério. E, por isso, terão de voltar a ser negociados com o Governo. Segundo os sindicatos, em causa estão cerca de 400 acordos. A decisão do Governo sobre a redução do horário terá de ter em conta o equilíbrio financeiro das autarquias e o não agravamento da massa salarial (incluindo horas extraordinárias), avançam as Finanças, no comunicado. Questionada pelo Diário Económico sobre se o parecer da PGR vai ser divulgado entretanto, fonte oficial das Finanças apenas disse: “Ainda não sei.”

O secretário-geral da Associação Nacional de Municípios (ANMP), Rui Solheiro, exige conhecer o parecer antes de aconselhar as câmaras. “Fazer referência a um parecer que está na gaveta há mais de quatro meses é inadmissível. Sem o parecer, não tomaremos posição. Não aconselhamos os nossos associados sem conhecer o documento da PGR”, sublinha Solheiro. “É uma situação inexplicável: como é que as partes interessadas não têm acesso ao parecer?”, questiona o dirigente da ANMP.

Para o dirigente da federação sindical Fesap, José Abraão, a atitude do Governo é” lamentável” sobretudo porque “as próprias câmaras que assinaram não querem o horário das 40 horas. O Governo arranjou aqui um conflito político”, defende José Abraão.


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