António Silva dá conta da situação herdada e da recuperação da Cooperativa Agro-Pecuária de Celorico da BeiraVereador da Câmara Municipal de Celorico da Beira, António Silva é também presidente da direcção da Cooperativa Agro-Pecuária do Concelho (COCEBA). Um cargo que assumiu numa altura em que a estrutura se confrontava com graves problemas financeiros e em vias de entrar em falência.
Segundo António Silva, a Cooperativa fechou o ano de 2008 com um volume de facturação de meio milhão de euros e conseguiu liquidar oitenta por cento da dívida à banca. Crítica a gestão feita no passado e denuncia situações que conduziram às dificuldades, apontando mesmo o dedo a anteriores executivos da autarquia. “Celorico da Beira foi um somatório de maus comportamentos nas instituições. O problema foi politizar instituições. Esta Cooperativa não tem de ser politizada, mas sim liderada por profissionais”, diz o dirigente.
Nova Guarda – É presidente da direcção de uma cooperativa, a COCEBA, que chegou a fechar devido a problemas financeiros. Qual é a situação actual?
AS – Há cerca de um ano e meio, o edifício da Cooperativa Agro-Pecuária de Celorico da Beira estava encerrado e estava a entrar num processo de falência.
Havia processos em tribunal e vieram buscar uma carrinha nova à COCEBA. Além disso, foi preciso pagar indemnizações a funcionários que apresentarem despedimento por justa causa. Foi um acto de coragem. Eu, o Dr. João Nunes e o Eng. Paulo Mimoso pegámos nesta Cooperativa e puxámos por ela. E hoje sinto-me feliz, porque a Cooperativa de Celorico passou a ser, acima de tudo, um centro de negócios agrícolas e florestais do Concelho. Qualquer pessoa que precise de tratar sobre qualquer assunto agrícola, florestal ou produção animal tem tudo aqui [na Cooperativa]: os veterinários, o gabinete de serviços agrícolas, a CELFLOR, a COCEBA. Dentro em breve, vai dar-se também a transferência dos serviços da Direcção da Agricultura para este edifício.
Uma Cooperativa que estava falida fechou o ano de 2008 com um volume de facturação de meio milhão de euros. Isto, acho que é a expressão mais que suficiente para provar o trabalho que se faz em Celorico da Beira.
Esta casa [instalações da Coceba] hoje, contrariamente ao passado, dá tecto, no conjunto de todos os serviços, a 25 postos de trabalho. Há ano e meio estavam aqui sapadores com salários em atraso, os funcionários da COCEBA foram-se embora e meteram acções no Tribunal do Trabalho para virem a ser ressarcidos dos seus valores, que nós pagamos. Herdámos uma dívida à banca na ordem dos 120 mil euros, provocados aqui no tempo de executivos anteriores, onde esteve, nomeadamente, ligado o Dr. Júlio Santos.
Esta Cooperativa não precisa de empréstimos bancários, precisa é de seriedade de trabalho e dedicação. Auto-sustenta-se. E a prova disso é que, num ano e meio, esta direcção já liquidou 80 por cento da dívida à banca. Em relação aos fornecedores, está tudo controlado.
NG – No edifício da Cooperativa existe agora também um Espaço Internet. Como é que surgiu?
AS – Esse Espaço Internet está associado ao pelouro da tecnologia, que tenho no autarquia, em que procurei dar uma dinâmica ao investimento tecnológico no concelho de Celorico da Beira. É uma área à qual estou ligado há 18 anos. Posso dizer que Celorico da Beira também é um exemplo a esse nível, não só pelos espaços internet que já criámos, que são quatro (contando com o espaço no Castelo, que está praticamente pronto).
Procurámos criar aqui um Espaço Internet como um objectivo estratégico em termos de ordenamento urbano. Celorico da Beira tinha vila e aldeia e o marco era o largo do Tribunal. Do largo do Tribunal para baixo não se passava nada: não havia movimento, os cafés queixam-se da falta de pessoas… . Por isso, tivemos que posicionar nesta zona uma força de actividade, que foi, estrategicamente, centralizar serviços no edifício da COCEBA, tornando-se num centro de negócios agrícolas e florestais, bem como criar um Espaço Internet, que chama aqui jovens e menos jovens. Este é um espaço criado em protocolo com a Câmara. Aliás, a autarquia ocupa cerca de cinquenta por cento deste edifício, nos vários serviços.
NG – Não tem medo que venha a ser acusado de ‘confundir’ os cargos, enquanto presidente da COCEBA e vereador do Município?
AS – Desafio a comunicação social a promover uma mesa redonda, com antigos elementos da direcção da Cooperativa, para discutirmos essa questão. Desafio a esse debate para que se conheça a gestão feita no passado.
A Cooperativa, antigamente chamada de Grémio, sempre foi gerida por agentes ligados à agricultura, por pessoas que sabem o que é agricultura e quais são as condições no sector. Mas, em determinado momento da história de Celorico da Beira, passou por aí um presidente que cometeu autênticas loucuras. E, no meio dessas loucuras todas, entendeu que deveria tomar o poder de tudo o que era instituição. Estou a falar do mandato do Dr. Júlio Santos.
O Dr. Júlio Santos foi presidente desta Cooperativa e foi aí que começou a cair. Tanto que foi, que havia senhas de presença pesadas, e houve empréstimos bancários que não se soube onde eles pararam. Seguiu-se outro executivo que veio dar continuidade a esse trabalho, que acabou por levar a que esta Cooperativa fechasse.
Quero com isto dizer que entendo que o poder político não deve estar envolvido nestas entidades.
NG – Acontece que a Coceba é dirigida novamente por um membro do executivo municipal…
AS – Quando o actual executivo da autarquia tomou posse havia uma direcção nesta Cooperativa, constituída por pessoas que procuravam dar um destino positivo à Coceba. Só que envolveu-se a questão da política e as pessoas entenderam que a Câmara estava de costas voltadas para a Cooperativa.
Recordo uma reunião que tive com o presidente da direcção da altura. A Câmara de Celorico da Beira atribuía a esta casa um subsídio de cinco mil euros por mês, para estar fechada. O que eu disse ao presidente da Cooperativa foi que a Câmara não podia dar um subsídio de cinco mil euros sem ter um protocolo com objectividade. Na altura, desafiei essa direcção para que apresentasse uma estratégia de desenvolvimento comercial da Cooperativa e eu próprio disponibilizei-me para ajudar, porque sou cooperante da COCEBA desde 1983. O meu pai foi sócio, comprava nesta Cooperativa, e eu entendi que devia dar seguimento a alguns gostos que ele tinha.
Decidimos que a Câmara não iria pagar os cinco mil euros/mês enquanto não fosse apresentado um programa de funcionamento comercial da Cooperativa. Perante isso, a direcção da altura tomou uma atitude de, pura e simplesmente, entregar as chaves.
Esta Cooperativa tinha processos judiciais vários, tinha uma dívida monstra a uma instituição bancária e, portanto, era urgente que se tomasse uma posição. Caso contrário, ia para hasta pública e iria parar a mãos que poderiam dar outro destino a este edifício. Na banca havia até um fiador, que nem sequer era cooperante da Cooperativa, e que estava prontinho para pagar essa dívida à banca. Como a Cooperativa entrava num processo de falência, é óbvio que accionava a cobrança e ficava com este edifício por um terço do valor real. Eu chamo a isso oportunistas e oportunismos que surgem no mercado.
Celorico da Beira não está a saque de ninguém, Celorico tem dono, que é o povo. O património do Concelho não pode ser sacado, como houve maus exemplos no passado. Eu recordo o exemplo da Fundação de Celorico da Beira, que foi vendida a esse senhor, Dr. Júlio Santos, por cinco euros. Uma vergonha! Uma Fundação que nem sequer está reconhecida… . Eu chamo a isto autênticos roubos. E falo, porque não tenho uma carreira política, nunca dependi da política, felizmente, sou um cidadão sério deste Concelho, e quero seriedade na minha gestão e seriedade no Concelho. É por aí que nos pautamos, como executivo, e eu como presidente da COCEBA.
NG – Qual a razão que o levou a assumir a presidência da Cooperativa?
AS – Houve um movimento, iniciado por três munícipes do Concelho, que foram ter com o executivo a denunciar a situação. Nós mostrámo-nos disponíveis para ajudar desde que fosse apresentada uma estratégia. Essas pessoas constituíram a sua lista de candidatura, em que a Câmara estava completamente de fora.
A lista foi organizada, mas cerca de duas horas antes da assembleia para eleger a nova direcção a pessoa que era candidata a presidente foi à Câmara Municipal dizer que desistia. E começou aí o problema. Ou se procurava alguém para substituir essa pessoa ou, então, a Cooperativa ia mesmo para o ‘charco’. Atendendo a que eu era cooperante, e a pedido de algumas pessoas deste Concelho, assumi a candidatura a esta Cooperativa. E devo congratular-me com a equipa que tenho comigo, devo congratular-me pelas pessoas que se aliaram a essa força para recuperarmos esta casa. Falo de pessoas como o Dr. João Nunes, o Dr. Vítor Simões, o eng. Paulo Mimoso e o presidente da Assembleia, o sr. Júlio Ambrósio, que transitou da anterior direcção para a actual.
Há uma promessa: estou nesta direcção com isenção, dividindo o trigo o joio, e estarei cá enquanto esta dívida existir. Serei presidente desta Cooperativa até ao dia em que não se dever mais nada ao banco. Liquidando essa responsabilidade financeira, que venha novamente a força dos agricultores do Concelho a liderar os destinos da Cooperativa, porque são eles que devem ter esse papel. A política não deve estar envolvida nesta Cooperativa.
Celorico da Beira foi um somatório de maus comportamentos nas instituições. O problema foi politizar instituições. Esta Cooperativa não tem de ser politizada, mas sim liderada por profissionais.
Eu estou na direcção apenas por um acidente de percurso, porque, caso contrário, jamais estaria aqui. Mas estou contente com o trabalho realizado e com a entrega dos colaboradores desta casa, porque o seu sucesso é a segurança do trabalho, e isso é uma coisa que deve ser privilegiada.