Miguel Relvas contraria assim a decisão de travar a obra tomada pelo ex-secretário de Estado do Ambiente Pedro Afonso de Paulo, substituído no final da semana passada por Paulo Lemos, um homem ligado ao PSD.
Miguel Relvas acaba de dar um empurrão à construção da barragem de Ribeira das Cortes, na Covilhã, contrariando a decisão tomada pelo ex-secretário de Estado do Ambiente Pedro Afonso de Paulo, substituído no final da semana passada por Paulo Lemos, um homem ligado ao PSD. O ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares invocou um «grave prejuízo para o interesse público», ao abrigo da lei, para desbloquear o processo pendente em tribunal por uma providência cautelar interposta pelos proprietários de parte dos terrenos para onde a barragem está projetada. Isto vem permitir prosseguir com a execução do projeto e com o processo de expropriação em marcha por parte da Icovi – InfraEstruturas e Construções da Covilhã, a empresa 100% municipal encarregada da obra. Miguel Relvas justifica o interesse público por a suspensão da execução da obra pôr em causa o financiamento comunitário, essencial para a construção da barragem, bem como uma séria de outras operações e negociações, nomeadamente concursos públicos. O braço-de-ferro entre o presidente da Câmara da Covilhã, Carlos Pinto, e os proprietários de parte dos terrenos em causa, Luís Alçada Baptista, mãe e irmãos, dura há anos e a questão parece ter passado definitivamente para os gabinetes do poder. Luís Alçada Baptista e família não se opõem à construção da barragem, apenas defendem que esta pode ser construída na mesma propriedade mas uns metros acima, minimizando os efeitos sobre o ambiente e preservando um património único, que inclui duas casas do arquitecto Alçada Baptista e um complexo sistema de levadas com interesse histórico e cultural, atestado por diversas entidades, públicas e privadas. O processo parece ter nascido torto e motivou desde o início processos em tribunal, cartas, pareceres e declarações de toda a espécie. Até que tudo parecia resumir-se à revogação ou não de uma declaração de impacte ambiental (DIA). Para ser construída, a barragem que Carlos Pinto defende há 20 anos precisa desta declaração, emitida pela primeira vez em 2006 e que foi sendo alvo de sucessivas prorrogações. A última, válida até setembro de 2014, foi anulada no final do ano passado pelo secretário de Estado do Ambiente Pedro Afonso de Paulo. A revogação foi assinada a 28 de novembro e teve por base as recomendações de uma equipa multidisciplinar do processo de contencioso da Secretaria-Geral do Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território, emitidas a 23 de Novembro. Numa reunião com Luís Alçada Baptista, o ex-secretário de Estado garantiu que faria aquilo que fosse recomendado pelo seu departamento jurídico. A equipa em causa concluiu que «existem dúvidas significativas relativamente a determinados elementos e incidências, sobretudo em momentos supervenientes à decisão final de prorrogação do prazo de validade da DIA». Em quatro alíneas, as dúvidas são sintetizadas em «fundamentação insuficiente do requerimento apresentado pela Câmara Municipal da Covilhã», «novos elementos respeitantes ao património cultural», «possível incêndio no local identificado como alternativa B» e «alegada redução das necessidades de água na região, acrescida à informação da ERSAR [Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos] relativamente à qualidade da água, bem como à não existência de fundamentos respeitantes à necessidade de construção desta infraestrutura para resolver problemas de qualidade da água». A estrutura projetada, com um custo estimado de 28 milhões de euros, permitirá armazenar 2,5 milhões de metros cúbicos de água, respondendo às necessidades de abastecimento de 70 mil pessoas – embora a própria câmara admita, no âmbito do Programa Rede Social, promovido por si e financiado pela União Europeia e pelo governo português, que a população residente está a diminuir: «O Concelho da Covilhã é habitado por 51 770 mil pessoas […] uma redução de 2735 indivíduos relativamente ao censo de 2001». A candidatura ao programa QREN-POVT, entretanto aprovada, baseou-se na falta de água e na deficiente qualidade desta para consumo humano, mas os números e a ERSAR parecem deitar estes argumentos por terra. O jornal i quis saber junto do novo secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do Território o que pode levar uma decisão técnica fundamentada a ser posta em causa, mas do seu gabinete foi-nos dito que Paulo Lemos «não estará disponível para falar». Esta indisponibilidade não é só para o jornal i. A Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza também já questionou o governo sobre este assunto, mas não recebeu «qualquer resposta da SEAOT, Secretaria de Estado do Ambiente e Ordenamento do Território», pelo que voltou a insistir, estando neste momento a aguardar.