Estudo europeu revela lacunas na agricultura portuguesa

A agricultura portuguesa revela graves lacunas a nível da geração de conhecimento aplicado e escassez no aconselhamento técnico de qualidade aos produtores, segundo um estudo europeu que, em Portugal, foi coordenado pela Universidade de Vila Real.

O trabalho de investigação “PRO AKIS” foi liderado pela universidade alemã de Hohenheim, financiado pela Comissão Europeia e foi desenvolvido nos 28 países da União Europeia.

Coube a uma equipa da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), em Vila Real, realizar o inventário dos Sistemas de Conhecimento e Informação para a Agricultura (AKIS) em Portugal, Espanha, Chipre, Grécia Itália e Malta.

Os investigadores portugueses, liderados pela professora Lívia Madureira, coordenaram 12 casos de estudo, em vários países europeus, que observaram em detalhe fluxos de conhecimento na agricultura e o papel dos sistemas de aconselhamento.

Em Portugal, analisaram-se os casos do “‘cluster’ dos pequenos frutos” e dos “jovens agricultores” que se estão a instalar no país.

“O sistema de comunicação para a agricultura é muito fragmentado e essa fragmentação também tem muito a ver com o desinvestimento do Estado na parte da produção de conhecimento e transferência de conhecimento e no aconselhamento na agricultura”, afirmou hoje à agência Lusa Lívia Madureira.

A especialista referiu que o Estado português “transferiu essas funções de apoio técnico para as organizações de produtores, só que estas acabam por desenvolver um trabalho concentrado na ajuda às candidaturas aos subsídios europeus.

“O que nós vimos é que o sistema está desguarnecido no que tem a ver com outro tipo de apoio técnico, quer à produção, à comercialização ou à inovação. Há uma série de áreas que estão desguarnecidas porque, quando se fez essa transferência do setor público para o privado, não-governamental, essas valências não foram contempladas”, sustentou.

O trabalho destaca ainda como uma característica negativa do AKIS português a “sua fragmentação por múltiplas organizações, sem que existam estruturas de coordenação que imprimam eficácia à sua ação”.

Lívia Madureira disse que há setores, como o dos vinhos, que estão mais desenvolvidos, mas que na generalidade das áreas produtivas “isso não acontece”.

O estudo aponta outra “falha importante” que, segundo a investigadora, tem a ver com “a própria produção de conhecimento aplicado”.

Isto porque, segundo acrescentou, as universidades foram-se distanciando um pouco e produzem conhecimento mais para publicar ou produzir patentes, e “não há um sistema intermédio que produza informação aplicada às condições locais”, por exemplo, os modelos de comercialização, o clima e os produtos adequados àquela área específica.

A especialista referiu que a geração, conversão e partilha de conhecimento está muito dependente da capacidade dos agricultores se organizarem de forma a envolverem investigadores e técnicos experientes e a mobilizaram a experiencia de produtores “leaders ou pioneiros”.

“É preciso um novo investimento nestas infraestruturas de produção de conhecimento. Tem que haver alguma coordenação. Tem havido muito investimento na agricultura, mas tem sido sobretudo na área produtiva, enquanto a área do conhecimento tem sido um pouco descurada, tem ficado na mão dos próprios produtores”, salientou.

A constituição de redes de conhecimento e inovação, como o caso estudado do ‘cluster’ dos pequenos frutos mostra que estas são uma ferramenta capaz de preencher algumas das lacunas do AKIS português, mas que apenas “o fazem conjunturalmente pois são redes que tendem a dissolver-se na ausência de financiamento e que dependem do envolvimento de agentes das estruturas públicas de conhecimento e aconselhamento que não cada vez menos para as crescentes solicitações”.

Por isso mesmo, a professora disse que é “preciso capitalizar o pouco que ainda existe e redirecionar algum investimento para as “áreas do conhecimento e inovação”.

E isto, numa altura, em que os mercados são cada vez mais competitivos e é preciso estar sempre a “fazer coisas novas e diferentes”.

A especialista realçou a importância desta aposta sobretudo no caso dos “muitos novos e pequenos agricultores” que se estão a instalar no país.

As conclusões do estudo estão agora a ser analisadas pelas entidades europeias mas, segundo Lívia Madureira a resposta a esta problemática “depende de casa país”.


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