AR discute aumento da margem de endividamento dos municípios para acelerar execução do PRR

O parlamento iniciou hoje o debate de uma proposta do Governo para aumentar o limite de endividamento municipal para acelerar a execução do PRR, considerada necessária pela generalidade da oposição, embora um “remendo” à Lei das Finanças Locais (LFL).

A proposta do Governo, aprovada na generalidade, baixou à comissão para ser discutida na especialidade, com os votos a favor de PS, PSD, PCP e BE e abstenções do Chega, Iniciativa Liberal (IL), PAN e Livre.

Juntamente com esta proposta, também o PCP apresentou um projeto para reforçar a capacidade financeira dos municípios, que foi rejeitado, tal como uma outra proposta do PAN “para garantir o reforço das verbas na dimensão do apoio dos municípios na gestão das áreas protegidas”, como apresentado pela deputada Inês Sousa Real.

O PAN apresentou ainda um outro projeto para um regime excecional de endividamento municipal para as despesas dos municípios com os prejuízos causados pelas cheias ocorridas em dezembro, que desceu à respetiva comissão sem votação durante 30 dias.

O mesmo aconteceu à proposta do Chega que defende o fim da cobrança pelos municípios da Taxa de Ocupação do Subsolo imputada aos consumidores nas faturas de bens essenciais, como o gás natural.

No parlamento, a ministra Adjunta, Ana Catarina Mendes, justificou que a proposta do Governo tem em conta o aumento do custo de vida, depois de uma crise sanitária e no meio de uma guerra na Europa, e a necessidade de execução de um conjunto de projetos, nomeadamente no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Por isso, propõe “alterar o prazo de utilização do capital de empréstimos a médio longo prazo contraídos pelos municípios, cujo prazo estava até ao final de 2023”, pelo que “todos os empréstimos a médio e longo prazo contraídos até ao final de 2022 veem o prazo estendido até dezembro de 2026”.

“Por outro lado, prevê-se intervir no tema das margens de endividamento das autarquias, para que seja aumentada não apenas para os projetos cofinanciados, o que resulta já do Orçamento do Estado [de 2023], mas também para aqueles que não são cofinanciados, o que significa um aumento não de 20% mas de 40% de endividamento, garantindo a capacidade de execução das autarquias locais”, acrescentou.

Inês Sousa Real, do PAN, mostrou-se disponível “para trabalhar na especialidade” nesta proposta, mas defendeu a aprovação de um regime excecional de endividamento municipal semelhante ao adotado aquando da crise da covid-19, aplicável às despesas com os prejuízos registados no âmbito de fenómenos como as cheias de dezembro ou os incêndios, permitindo que “os valores aplicados neste contexto pelos municípios não contem para o endividamento municipal”.

A deputada única do PAN defendeu a necessidade de “um Simplex de procedimentos, de eliminação da carga burocrática” para que existissem “mecanismos de compensação que permitam uma ação mais eficaz na reparação desses danos” aos municípios, famílias e empresas afetadas.

Bruno Nunes, do Chega, apresentou uma proposta “Pelo fim da cobrança da Taxa de Ocupação do Subsolo aos consumidores”, uma taxa cobrada pelos municípios para que os operadores de bens essenciais, como o gás, possam usar o subsolo e que acaba por se refletir nas faturas dos cidadãos, numa altura em que “muitas famílias têm de decidir entre pagar a renda da casa ou ir ao supermercado” e em que “todos os cêntimos contam”.

O deputado criticou ainda a baixa taxa de execução de projetos pelas câmaras municipais, considerando que “as câmaras municipais em Portugal estão falidas, endividadas”.

“E o que é que vem propor o Governo, o que vem propor o PAN? Permitir ainda maior endividamento”, considerou.

O projeto do PCP, que foi rejeitado, defendeu o reforço da capacidade financeira do Poder Local, nomeadamente o aumento da “participação das autarquias nos impostos do Estado”.

Quanto à proposta do Governo, “está muito aquém do que é necessário”, o que “dá maior relevância às propostas do PCP”, afirmou a deputada Paula Santos.

O PSD assegurou acompanhar “sem reserva” a iniciativa do Governo, mas apontou exemplos de “atitudes de secundarização” das autarquias pelo Governo na discussão de um PRR “marcado pelo centralismo, num Governo que se diz descentralizador, mas que reservou para Lisboa 2.225 milhões de euros, o mesmo valor de 284 concelhos juntos”.

“A iniciativa legislativa que o Governo submete ao parlamento merece ser acompanhada e nós vamos acompanhá-la. Mas todas as iniciativas e atitudes que acabei de exemplificar só podem merecer – e merecem mesmo – a nossa mais veemente reprovação”, disse o deputado social-democrata João Paulo Oliveira.

Joana Cordeiro, da Iniciativa Liberal (IL), considerou que a proposta do Governo “é mais um remendo no financiamento das autarquias” e defendeu a necessidade de, “de forma célere e competente”, se reformar a Lei das Finanças Locais (LFL).

“Estamos perante remendos que vão alargar a capacidade de endividamento das autarquias locais, mas que não alargam ou alteram a capacidade de receita ou a autonomia sobre essa receita por parte dos municípios”, disse, acrescentando que “os empréstimos de hoje serão sempre a dívida de amanhã e, com a liberdade de contração de dívida, virá sempre a responsabilidade para o seu pagamento”.

Rui Tavares, do Livre, considerou que “há alguma virtude” na proposta do Governo, mas “é preciso uma reforma mais estrutural do financiamento das autarquias, nomeadamente para as deixar menos dependentes do imobiliário feito com pouca qualidade e à pressa, embora se diga que este não é o momento para o fazer”.

Também o BE acompanha na generalidade a proposta, salientando que “o regime de financiamento das autarquias locais e entidades intermunicipais merece uma reflexão mais profunda”, como os municípios têm exigido, embora nos “últimos anos” tenham existido “melhorias pontuais”, segundo a deputada Isabel Pires.

Carlos Ferraz, do PS, sublinhou que oportunamente “será discutida a revisão da LFL com os municípios”, mas “por hora estas medidas são essenciais” para fazer face a uma situação de emergência e para aproveitar a “oportunidade única” que é a execução do PRR.

“Estamos a garantir que as autarquias, perante o aumento do custo de vida, que não foi provocado pelo Governo, mas por fatores externos, como a inflação com que estamos a deparar-nos, possam continuar a responder” às necessidades das populações, concluiu a ministra Ana Catarina Mendes.


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