Fingir que se faz justiça é bastante mais grave e condenável do que não a conceber.

O procedimento do magistrado, na circunferência da prova, sempre constituiu, ao longo da história da humanidade, um factor de enorme preocupação, ansiedade e suspense. Quais são os factores ou circunstâncias, num depoimento prestado em tribunal, que podem influenciar desfavoravelmente ou favoravelmente os índices de credibilidade? Quais são os mecanismos que conseguem determinar com rigor se um depoimento desponta de um conhecimento directo do facto ou, no sentido inverso, se emerge da imprecisa memória em relação ao mesmo? Será que a modificação, em superfície de depoimento, de algumas configurações da realidade narrada não pode ser interpretada como um sintoma da parca credibilidade do próprio depoimento?
No ano de 2003 foi adjudicado a um consórcio alemão a construção de dois submersíveis. Imediatamente se solevaram desconfianças quanto à suavidade e delicadeza do concurso, uma vez que prontamente um dos concorrentes argumentou que o vencedor tinha sido favorecido. Salientar que este processo somente se metamorfoseou num caso duvidoso e polémico quando no seguimento das investigações sobre o caso “Portucale” se destaparam algumas acoplagens de uma empresa do Grupo Espírito Santo (GES), a Escom, ao consórcio triunfador do concurso dos dois submarinos. No decorrer da investigação rapidamente se descobriu o “acolhimento” de 30 milhões de Euros por parte da empresa Escom, pagos pelo consórcio Alemão. O parecer das autoridades indicou a inexistência de compensações ou de contrapartidas significativas para a efectuação desse pagamento.
Existiram, então, prenúncios que mencionaram e apontaram para uma espécie de exigência da comparência da Escom como intermediário, pretendido pelos representantes do Estado português, no negócio dos submersíveis.
A verba total de ‘luvas’ paga aos múltiplos medianeiros no negócio dos submarinos, adquiridos ao German Submarine Consortium (GSC) em 2004, terá rondado os 80 milhões de euros. O pagamento destas “gratificações” terá sido concretizado pela Escom através de transferências bancárias para a Escom, Ltd, sociedade offshore do GES sediada nas Ilhas Virgens, e de facturas emitidas por uma empresa de Angola. A quantia que pervagou por Angola esteve igualmente a ser escrutada no cabimento da “Operação Furacão”, por desconfiança de fuga fiscal por parte da Escom.
O Governo acabou por perder o faro a um aglomerado de documentos referentes ao financiamento da compra dos dois submarinos germânicos, entre eles destacam-se: a “epístola” que o consórcio bancário Banco Espírito Santo (BES) / Crédit Suisse First Boston (CSFB) terá endereçado, em 2004, ao então Ministro da Defesa, Paulo Portas, a solicitar para mudar não só a margem de lucro no financiamento da aquisição dos dois submarinos, “empreitada” posterior a ter vencido o concurso, como também a concernente anuência ou autorização.
Entre Junho e Julho de 2009, o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), coordenado por Cândida Almeida, efectuou múltiplos pedidos de informação ao ex-ministro da Defesa, Nuno Severiano Teixeira, sobre a aquisição dos submarinos. Um desses pedidos, que pelos vistos “aformoseia” o processo das contrapartidas, aludia-se a documentos referentes às negociações com o consórcio bancário que financia a compra dos submarinos ao GSC, o seja o BES/CSFB. Outro pedido precedente estava associado aos comprovativos de pagamento das prestações dos submersíveis. Infelizmente os documentos requisitados não se encontravam nos arquivos do ministério, uma configuração que se tornou reiterada no processo.
O DCIAP pretendeu, especialmente, compreender como foi autorizado ao consórcio ganhador, após a adjudicação, o aumento de 1,9 para 2,5 por cento da margem de lucro. Requereram-se documentos que caminhavam desde o período de selecção dos bancos até ao consentimento e despacho do ministro. O DCIAP, desafortunadamente sem êxito, procurou obter os comprovativos de pagamento das prestações dos submarinos.
As “individualidades” que mais embrulhadas tiveram com todo este processo foram: Paulo Portas, Ministro da Defesa do XV Governo Constitucional; Abel Pinheiro, dirigente do CDS/PP; Duarte Lima, advogado, suspeito de crimes de branqueamento de capitais, embuste fiscal e tráfico de influências; Vieira Matias, Almirante e chefe do Estado-Maior da Armada entre 1997 e 2002; e Rogério D’ Oliveira, Contra-almirante na reforma com acoplagens ao consórcio alemão que supostamente recebeu um milhão de euros após a assinatura do contrato.
Os EUA afirmaram que Portugal compra brinquedos dispendiosos, supérfluos e desnecessários, tendo como alicerce a vaidade. O ministério compra armamento por uma questão de orgulho, pouco interessando se o mesmo agasalha utilidade ou não. Será que o valoroso passado marítimo fundamentou a aquisição dos submersíveis?
A Polícia Judiciária (PJ) investigou o rasto de aproximadamente 24 milhões de euros que o consórcio alemão, GSC, com o qual o Estado português contratualizou a aquisição de dois submarinos em 2004, transferiu para a Escom, empresa pertencente ao GES. O Ministério Público (MP) desconfia que o negócio dos submersíveis adquiridos por Paulo Portas enquanto ministro da Defesa possa ter financiado o CDS-PP. Quais foram os serviços prestados pela Escom ao consórcio alemão que ganhou o concurso dos submarinos para que a factura apresentada tenha rondado os 30 milhões de euros em honorários? Será que os arguidos alemães e portugueses não actuaram de modo harmonizado e em combinação de esforços, com a óbvia finalidade de alcançarem vantagens imerecidas? Será que os alemães não encurtaram encargos e responsabilidades, edificando a afiguração de um cumprimento veloz, honesto e eficiente no competitivo e umbroso universo das contrapartidas? Será que a “história” das contrapartidas não lesou o Estado em vários milhões de Euros?
Infelizmente o Super Mediocre Juiz, de nome Carlos Alexandre, rejeitou a reabertura do processo referente aos submarinos. A Corrupção ou a ausência de corrupção nunca foi demonstrada, muito menos de forma incontestável. Talvez o caso dos submarinos não tivesse sido reaberto porque os mesmos têm de ser estanques e blindados para submergir e emergir. Enfim, trata-se da dualidade de critérios e de procedimentos que escolta a Justiça em Portugal. Essa triste dualidade que já se configura como a imagem de marca cá do burgo. Na Alemanha, já encontraram os responsáveis, tendo os mesmos já sido condenados a penas de prisão. Todavia, em Portugal não há arguidos e os processos perpetuam-se e acabam por prescrever, com documentos e testemunhos que convenientemente se esfumam.
O contrato de adquirição dos submarinos não foi tornado público, por motivos intimamente ligados à defesa nacional. Todos sabemos que o segredo de Estado em Portugal agasalha exíguas doses de valor, ou seja vale muitíssimo pouco. Na realidade, os submarinos penetraram, de modo impetuoso e indecoroso, nas contas públicas, hospedando demasiados e preocupantes zeros à direita. Será que os contribuintes não pagaram mais por menos? Será que não é fundamental conhecer qual é a efectiva e corpórea missão dos submersíveis portugueses? Quem esquematizou essa missão? Em que estudos se basearam para fundamentar a mesma? Quais são os exercícios combinados e conjuntos em que Portugal vai participar? Qual é a necessidade e a utilidade desses exercícios? Qual é a periodicidade dos mesmos? Quais são as áreas focais a patrulhar? Quem seleccionou essas áreas? Quais foram os critérios utilizados que fundamentaram essa escolha? Quais são as operações submarinas relevantes que vão conduzir? Como se processa a navegação oceânica e a navegação costeira? Para onde transportamos os altos valores? Será que em Portugal existem altos valores? Quais são as acções de representação nacional que necessitam de submarinos? Será que as inúmeras e infundadas “representações nacionais” não colaboraram, significativamente, para o incremento da pobreza e da corrupção em Portugal? Quais são os grupos especiais de operações que requerem sigilo e surpresa? Será que o pessoal da Armada precisava desses dois submarinos para se instruir e preparar? Quais são as perspectivas de paz, estabilidade e segurança no mundo que dependem dos Portugueses e dos seus submersíveis? Será que a posse de capacidade submarina é sinónimo de determinação de defesa autónoma e de credibilidade da imagem? Será que essa posse não significa imbecilidade ao mais alto nível? Será que não somos um País de corruptos, loucos, alienados e vaidosos?
Na verdade, e sem ingressar no campo tenebroso dos paradoxos, o mar ainda hospeda uma grande importância estratégica, tanto como via de comunicação, como manancial de recursos naturais. Talvez a capacidade submarina, pela sua polivalência, autonomia, mobilidade, seriedade, segurança e resistência, seja a que melhor satisfaz a necessidade de responder a um conjunto de situações possíveis que muito provavelmente nem foram meditadas ou conjecturadas pelos “iluminados” mentores da aquisição. Será que sem submarinos, Portugal amputaria a capacidade de projectar robustez por via marítima? Será que os submersíveis constituem o único “agente” de dissuasão credível do País? Será que os mesmos não servem unicamente a estratégia diplomática? Será que a abrangência dos mesmos não é demasiadamente reduzida? Quem delineou essa estratégia? Será que a esmagadora maioria dos factores mencionados pela marinha não é absolutamente contraproducente e incongruente? Será que a marinha constitui um fim em si mesma? Será que Portugal, naquilo que diz respeito ao seu equipamento militar, não tinha contextos bastante mais iminentes para solucionar? Onde ficaram os planos e os estudos para os helicópteros? Onde estão os diagramas que conjecturavam a beneficiação dos aviões C-130? Será que a aquisição dos submersíveis não constituiu uma oportunidade desastrosa?
A fiscalização do Estado na confecção e na administração dos delineamentos de contrapartidas devidas pela aquisição dos submersíveis alemães fracassou nos momentos decisivos do processo. Na realidade, é a interpretação que podemos fazer acerca do conteúdo da acusação do Ministério Público (MP) e da concernente exposição pericial, contra os sete gestores portugueses e os três alemães acusados de fraude qualificada e adulteração de documentos. Desafortunadamente a economia portuguesa perde centenas de milhões de euros no negócio das contrapartidas dos submarinos, conforme o relatório da Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC). O processo de compra dos submarinos à Alemanha foi elevadamente prejudicial para o Estado português, estando contaminado por logros e fraudes, assim como por documentos desaparecidos e “aditamentos” contratuais diametralmente luctíferos.
A sentença emergiu em 14 de Fevereiro de 2014. Infelizmente, sem grandes admirações, todos os arguidos foram inocentados. Os juízes absolvem os arguidos das contrapartidas dos submarinos, recomendando o Estado a dissolver o problema fora da justiça. O veredicto acaba por “promulgar” uma crítica ao MP, pelo facto de o mesmo ter fundamentado a acusação de fraude e falsificação de documentos em peritagens que violam múltiplos princípios legais. Foi esta a deliberação a que chegou o colectivo de juízes das Varas Criminais de Lisboa que ilibou de fraude e falsificação de documentos os dez arguidos no processo das contrapartidas dos submarinos, três alemães e sete portugueses. O Vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, aparecia referenciado como um dos intervenientes com papel mais “pertinente” no modo como foram negociados e atribuídos os contratos de aquisição e de contrapartidas. O MP deliberou arquivar o processo em que estavam a ser investigadas suspeitas de corrupção na adquirição de dois submersíveis pelo Estado português a um consórcio alemão. Será que é razoável o Super Medíocre Juiz, Carlos Alexandre, estar “presente” em todos os processos mediáticos? Qual é o motivo de o mesmo ter sido, durante um considerável período de tempo, o único juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC)? Será que não foi o Governo de José Sócrates que encetou a mudança deste panorama? Será que não foi no Governo de José Sócrates que se iniciou o processo de seleccionar outro juiz para este tribunal?
Realçar que o TCIC ocupa-se dos casos relacionados com a criminalidade mais grave, organizada e complexa, designadamente os crimes económicos e financeiros, tendo actualmente dois juízes de instrução. Há muito tempo que a Associação Sindical dos Juízes reivindica mais elementos para o TCIC. Para os sindicatos, a existência de apenas dois juízes titulares não garante o cumprimento da jurisprudência indispensável, nem tão pouco a aleatoriedade na atribuição de processos, que consideram configuração fundamental da justiça. Quando há necessidade, no período de investigação, de ouvir o arguido, o tribunal competente é o TCIC.
Fingir que se faz justiça é bastante mais grave e condenável do que não a conceber. Fazendo uma epidérmica comparação com o caso “Sócrates”, talvez o funâmbulo, Paulo Portas, merecesse pior tratamento que o próprio José Sócrates. Será que as medidas de coacção aplicadas pelo magistrado Carlos Alexandre a Sócrates foram adequadas? Será que essas medidas não estavam indumentadas de conveniências obscuras? Será que esse tipo de decisão não carece de uma ponderação suplementar? Será que devemos acreditar em Super-Homens? Será que não somos todos humanos? Será que as nossas capacidades são inesgotáveis? Será que os índices de competência e coragem, em relação a José Sócrates, por parte do magistrado Carlos Alexandre não estavam alicerçados em prepotência e habilidade política? Será que no caso concreto de Sócrates, não podemos afirmar quer a montanha pariu um rato?
O juiz Carlos Alexandre, do TCIC, indeferiu o pedido da eurodeputada, Ana Gomes, de reabertura do processo dos submersíveis, arquivado em Dezembro pelo MP. O juiz considerou que o requerimento de abertura de instrução que apresentou “está longe de constituir uma acusação alternativa susceptível de ser integralmente confirmada em sede de pronúncia e ulteriormente submetida a julgamento”. Divergi completamente deste raciocínio, pois os factos já apurados pelo MP, e repetidos no despacho do juiz de instrução, são de extraordinária gravidade e importância. Foram evidentemente óptimas notícias para Paulo Portas, uma vez que o negócio dos submarinos comprados aos alemães e as “luvas” de que havia indícios não iriam a julgamento.
O PS defrontou-se, e ainda defronta, embora noutros moldes, com uma situação complicada, em que um dos seus mais importantes ex-governantes tem sobre si um processo judicial histórico. A direita, por sua vez, foi aliviada do seu fantasma mais “corpóreo”. Infelizmente e “imerecidamente” o Vice-primeiro-ministro de Pedro Passos Coelho pode afirmar que nunca passou de uma simples testemunha para a Justiça. Duas particularidades no mínimo curiosas: Paulo Portas somente foi ouvido pela primeira vez em Abril de 2014; e a Justiça nunca requereu levantamento do sigilo bancário ao ministro. Além disso, os contratos de aquisição foram alvo de múltiplas transformações clausulares, algumas no que toca à equação de cálculo dos preços. Inúmeros documentos que podiam ter clarificado algumas dúvidas nunca chegaram às mãos dos investigadores. Sem se perceber muito bem porquê, nunca existiram meios ou mecanismos para contratar um perito em compras públicas que agasalhasse a capacidade e o conhecimento para explicar determinadas optações do Governo, nem tão pouco para ajustar um grupo multidisciplinar que pudesse oferecer auxílio técnico a este caso, considerado de vigorosa dificuldade jurídica, operacional, funcional, logística, técnica e financeira.
Imensas dúvidas que ficaram por esclarecer. Uma delas é referente aos factos que ocorreram na Alemanha. Os investigadores admiraram-se de a justiça alemã ter declinado o pedido de cooperação, não facultando os elementos que foram requeridos em diversas circunstâncias, designadamente informações bancárias sobre indivíduos ou empresas que interferiram directamente no processo negocial. Também não se aclarou se o cônsul honorário de Portugal em Munique, Jürgen Adolff, condenado na Alemanha por ter sido “contratado” pela Ferrostaal para promover reuniões e encontros com decisores políticos portugueses a troco de uma comissão, ficou com o dinheiro das “luvas” para si ou se o terá repartido com alguém. A sentença que condenou Jürgen Adolff, na Alemanha, deu como provado ter existido um diálogo a sós entre o cônsul e o ministro Paulo Portas. Sobre esta matéria, o Vice-primeiro-ministro português disse, no Parlamento, que se tinha deslocado à Alemanha para comparecer numa conferência anual de segurança em Munique. Neste período, Jürgen Adolff exercia as funções de cônsul honorário. Enfim, dinheiro e documentos sem rasto…
Os cerca de 27 milhões de euros que a Ferrostaal assumiu ter pago, referentes a contratos com a Escom Limited, perderam-se numa desafogada ilha de fundos e offshores. A forma como os submarinos do consórcio alemão foram ascendendo na classificação das preferências da marinha e do ministério, não esquecendo que numa primeira fase encontravam-se em último lugar, depois passaram para segundo até serem seleccionados, também não ficou nada aclarada para os magistrados que assinaram o despacho. Demasiadas pontas soltas, substância que se tivesse sido bem conduzida permitiria com toda a certeza uma incriminação consistente. Autonomamente a estes desenrolamentos internacionais, em Portugal ninguém foi condenado. No caso das contrapartidas, todos os arguidos foram absolvidos pelo Tribunal Criminal de Lisboa (TCL) e, no caso dos Submarinos nem sequer houve julgamento. Será que no caso de Portas e no caso de Sócrates, não existiu uma dualidade de critérios e de procedimentos por parte do Super Medíocre Juiz Carlos Alexandre?