A maior parte da população presidiária encontra-se embrulhada numa complexa e espessa rede de poder.

A actuação do Estado e as políticas públicas de segurança raramente tiveram em consideração as transformações que as organizações criminosas sofreram, provocando inúmeros enganos e contratempos na peleja ao crime organizado. Será que esta conjuntura não contribui para que os Governos perfilhem estratégias com carácter de emergência?
Em Portugal, a população presidiária sempre sofreu de um certo abandono, ficando, em diversas ocasiões, ao arbítrio de regulamentações franzinas, irregulares e defeituosas. Quantas leis, decretos-lei e regulamentos administrativos não foram intencionalmente ignorados? Quantos trajes umbrosos e pardacentos indumentam as correspondências sociais existentes nos sistemas prisionais? Será que os correctivos e as prerrogativas não constituem elementos negociáveis e subordinados às conexões informais fundadas entre os reclusos e os guardas prisionais?


Os presidiários que agasalhavam maiores índices de notoriedade, proveniente muitas vezes da manifestação de vigor, resistência e capacidade para a prática de actos violentos, avassalavam os outros, reprimindo e subjugando, física e moralmente, os detidos mais desvigorosos. A maior parte da população presidiária encontra-se embrulhada numa complexa e espessa rede de poder. Esta população acaba por ser macerada com a disputa entre algumas organizações criminosas e o próprio Estado. Será que existe poder sem oposição?


Marginalizados e suprimidos em formato duplicado, alguns reclusos tornam-se autênticos desprotegidos, sem direitos perante o Estado e a contemplar uma justiça que os sentenciou. Será que o Estado alberga capacidade de lhes garantir existência jurídica e sobrevivência física? Será que os seres humanos não são dissemelhantes entre si? Será que os mesmos não são regulados e inventariados por uma heterogeneidade social? Será que esta heterogeneidade não constitui o sustentáculo da formação e disposição das elites? Será que a igualdade não pode mobilizar os actores sociais a actuar?


Na realidade, e autonomamente ao regime que desfilava no poder, a sociedade foi permanentemente governada por uma minoria, ou seja, uma elite. A elite representa, embora por vezes de modo distorcido, aqueles que são qualitativamente superiores. As elites existiram na totalidade dos vértices que compõem a sociedade, ou seja, em todas as superfícies da actuação humana. Será que nunca distinguimos ricos de pobres? Será que nunca distinguimos simpáticos de antipáticos? Será que não podemos distinguir a elite da plebe? Será que não podemos distinguir a parte aristocrática da parte vulgar? Será que o conceito de elite não está subordinado às qualidades que se procuram no mesmo? Será que não pode existir uma aristocracia de anjos, uma aristocracia de bandidos ou uma aristocracia de eruditos? Será que a ideia de elite não desponta segundo o critério natural, qualitativo e meritocrático? Será que as elites alcançam sempre o poder por mérito? Será que as mesmas estacionam sempre no poder por um equilíbrio e coerência relativamente segura? Será que as elites não circulam e rodopiam? Será que a história não é o sepulcrário dos aristocratas?