Ligados à plataforma da qualidade, e simultaneamente na caracterização do serviço público, estão os conteúdos violentos e a sua auto-regulação.

Os instrumentos que medem as audiências estão encaixilhados num mecanismo técnico pré-estabelecido pela lógica de mercado, bem como pela programação específica da oferta comercial. A verdade é que na esmagadora maioria dos conteúdos culturais e educativos as audiências são habitualmente diminutas. Esta circunstância jamais pode colocar em causa a legitimidade da existência de um autêntico serviço público de televisão.

Será que a essência do paradigma de serviço público não começa pela criação ou preservação de um verdadeiro programa cultural, assim como pela protecção de uma identidade própria face às instigações de cunho comercial? Será que não é fundamental ter uma programação diversificada e contrabalançada? Será que não é importante garantir a atribuição de um lugar de destaque às “dissertações” da educação e da cultura?


A televisão pública deve procurar ser um efectivo modelo para toda a população, assim como um instrumento de conexão social e de inclusão de todos os indivíduos e grupos; disseminar informações, esclarecimentos e observações isentas e independentes; ter um nome robusto no “departamento” da informação; contribuir, de modo dinâmico e empreendedor, para um conhecimento geral cada vez mais aprofundado, bem como para uma avaliação bastante mais sólida da multiplicidade do património cultural nacional; desenvolver programações múltiplas, criativas e variadas; contemplar com devoção os princípios éticos e qualitativos; desenvolver e organizar as grelhas de programação sem nunca descurar as solicitações e interesses dos grupos minoritários; e oferecer programas diferentes daqueles que constam nas propostas dos canais privados.


Ligados à plataforma da qualidade, e simultaneamente na caracterização do serviço público, estão os conteúdos violentos e a sua auto-regulação. No nosso País, e numa perspectiva institucional, o método que tem sido perfilhado para a prevenção das imoderações tem passado essencialmente pela assinatura de “convenções de comportamento” entre todos os canais de televisão. Será que este procedimento não está mais alicerçado na “uniformidade” de auto-regulação do que no entremetimento directo e espontâneo do Estado? Quem é o proprietário da “substância pública”? Será que a atitude de independência e liberdade não só em relação ao mercado, como também em relação ao Estado, não constitui uma das insígnias mais relevantes do ideal de televisão pública?


A compreensão de uma televisão pública somente é possível através da decomposição de conceitos tão importantes como: Estado; mercado; e “aspirações” de público. A polémica sobre as funções e ocupações de uma televisão pública embrulha o seu próprio posicionamento diante do mercado, quer no que toca a atilhos financeiros, quer à assimilação da prédica competitiva que atravessa e “recompensa” os veículos de comunicação comerciais. Quais serão as hipóteses de sobrevivência da televisão pública no chão delgado do apartidarismo e da insubmissão mercadológica?


É seguramente oportuno referir que a televisão acaba por ser uma espécie de biogeocenose social e cultural, à qual todos os cidadãos estão ligados pelo facto de incorporarem determinada cultura. Todavia, a televisão pública e a privada jamais deveriam hospedar a mesma topografia de programação, bem como idênticas antelações aquando da edificação dos alinhamentos informativos.