As freguesias rurais constituem uma “autenticidade” consagrada e legitimada na Constituição, abrigando mais-valias culturais, sociais e geográficas.

Qualquer região agasalha atributos próprios, realidades distintas e necessidades díspares que variegam fundamentalmente com a “conjunção” em que estão inseridas. A geografia, a etnografia, o património, as potencialidades, a topografia, a sociologia, a geologia, as características da população e a arquitectura constituem ilustrações que devem estar incluídas aquando da edificação das matrizes de ordenamento. Cada lugar deverá ser contemplado como uma “entidade” autónoma. As dinâmicas de desenvolvimento dos aglomerados, a administração dos recursos naturais e a correspondência das acções produtivas com o ambiente constituem texturas essenciais para o entendimento das “apropriações” humanas existentes em cada região.


Contemporaneamente existe uma espaçosa unanimidade em relação à necessidade de reestruturar o poder local e reformar a administração do território. A Reforma Administrativa do Território de 2013, sob a responsabilidade do então Ministro Miguel Relvas, nunca apresentou um efectivo estudo sobre a heterogeneidade do território geográfico e respectiva população. Realçou em demasia os números e pouco as pessoas. Enfim, uma reforma concebida a régua e esquadro, por quem não degustou a realidade, a população, bem como as particularidades e “vivências” dos territórios.


Torna-se imperioso perceber que uma aldeia não é unicamente um exíguo aglomerado e que uma vila não é uma cidade de tamanho reduzido, mas sim “colonizações” de espaços que albergam singularidades de existência. São estas vivências singulares que inscrevem a qualificação e a legitimação dos locais. A disposição de um determinado lugar está intimamente ligada à sua fundação, configuração, organização e fixação, bem como ao conjunto de actividades e movimentos que ocorrem no mesmo.


As freguesias rurais constituem uma “autenticidade” consagrada e legitimada na Constituição, abrigando mais-valias culturais, sociais e geográficas. No seio da Administração Pública, são as Juntas de Freguesia o elo de ligação mais contíguo aos cidadãos, procurando o progresso e o direccionamento das melhores deliberações para afranzinar os dilemas dos seus cidadãos. Quase sempre com conjunturas moderadas em recursos financeiros e humanos, boa parte dos Presidentes de Junta de Freguesia, principalmente os das freguesias rurais, desenvolve um labor desinteressado, rigoroso e árduo. Há muito tempo que está comprovado que a Junta de Freguesia faz muito com pouco, sendo simultaneamente o primeiro palanque da democracia, a quem a população recorre “espontaneamente”. Depois da “exportação” da escola primária e do posto dos correios, o único serviço público que ainda subsiste nas freguesias rurais é aquele que é desempenhado pelas Juntas de Freguesia. Estas funcionam como factor de ligação territorial e social, defendendo as pessoas com a sua perseverança. Será que as Juntas de Freguesia não são o único, ou o principal, vínculo dos habitantes com o Estado?


É fundamental agrupar e metodizar, com o propósito de garantir o saudável funcionamento das disposições das freguesias, os conhecimentos, os entendimentos e os paradigmas de interposição no espaço administrativo das freguesias, considerando as reivindicações arroladas com proficiências, regulamentos dos eleitos locais, contratação pública, administração de recursos humanos e sistema de controlo financeiro. Torna-se essencial recuidar de uma forma inclusiva e participativa, através de observações e estudos apropriados, os arquétipos de gestão para as freguesias rurais, com o cristalino objectivo de o interior não ficar cada vez mais abandonado.


A fundamentação exposta em 2013 pelo Governo PSD/CDS, no que respeita ao combate à desertificação, nunca foi verdadeira, uma vez que o efectivo motivo foi o de cortar na despesa. Com a fusão das freguesias, muitos Presidentes de Junta passaram a ostentar as “insígnias” do estatuto de profissional e concomitantemente também foram contratados funcionários para as “novas” Juntas de Freguesia. Logo, os custos tornaram-se mais elevados e o apoio às populações foi dilacerado.


O pardacento Documento Verde, que era palpavelmente contra a regionalização, agasalhou quatro grandes finalidades: as empresas locais; a organização do território; a administração municipal e intermunicipal; e a renovação do sistema político local. Porém, a verídica caixa de Pandora foi a limitação do número de freguesias. Será que em 2013 a regionalização democrática não foi substituída por a prepotência governativa?