O desenvolvimento do direito à greve escoltou o processo de evolução dos formatos de organização estatal, principalmente a edificação do que compreendemos presentemente como uma governação democrática. O persistente sistema de conquista, avigoramento e consolidação dos direitos sociais estabelecidos na “redacção” constitucional, conjecturados para um aperfeiçoamento civilizador da nossa sociedade, reclama uma concreta e corpórea prestação de serviços públicos, com aclimatação, eficiência, eficácia, segurança, firmeza e continuidade. Será que existem fórmulas, princípios, gráficos, diagramas ou esquemas predefinidos capazes de garantir coerência e comedimento à intrincada correspondência entre serviço público e greve? Será que inúmeros direitos não foram desregulamentados ou dissolvidos a partir do acometimento do capital sobre o trabalho? Será que essa conjuntura não representou uma enorme perda para a classe trabalhadora?
Algumas centrais sindicais metamorfosearam-se em instituições cada vez mais burocráticas e longínquas do movimento real dos trabalhadores. Em determinadas circunstâncias, assistimos a algumas mobilizações pouco expressivas, ou seja com franzina participação efectiva dos trabalhadores e com restrições a alguns centros urbanos.
A crise económica mundial; o trabalho instável; a inflação em alta; o aumento da taxa de desemprego; a precarização do trabalho; e a intensidade da jornada de trabalho são condições que requisitam movimentos sindicais estruturados. Será que as centrais sindicais não fundaram um encadeamento de pacto e compromisso com os sucessivos Governos? Será que a crescente burocratização das entidades sindicais e o seu engajamento às conveniências do Estado não pode ter contribuído para o êxito das “iniciativas” perpetuadas pelas entidades patronais? Será que em determinadas circunstâncias, o apoio das centrais sindicais ao Governo não as impossibilita de patentear exigências mais intrépidas?
As transfigurações ininterruptas no universo do trabalho e a celeridade adjacente às transformações económicas ocorridas à dimensão internacional constituem condições que acarretaram um cenário de desequilíbrio da organização dos trabalhadores, bem como um esforço para reedificar o protótipo corporativo perfilhado pelas centrais sindicais. Será que este contexto não alterou os arquétipos do sindicalismo?
O processo da globalização e a chegada de novas tecnologias criaram uma moderna configuração para o trabalho. O capitalismo elástico ou flexível empurrado pela reestruturação produtiva e a flexibilização das correspondências trabalhistas lançou uma espécie de carga de subjectividade no “temperamento” dos indivíduos. A queda das ligações sociais duradouras ou perpétuas; a incorruptibilidade e a confiabilidade no próximo que não passam de meras teorias; e o esvaziamento da experiência como estímulo de narrativas e explanações acerca da vida, constituem factores que participaram da noção de comunidade, mas foram minimizados na sociedade contemporânea. Será que este intrincado processo não requereu um reacomodação das estratégias corporativas? Será que o indivíduo não ficou rodeado, dessa forma, com novos dispositivos e mecanismos de regulação imprescindíveis para o desenvolvimento do neoliberalismo? Será que a supremacia dessa fragrância empresarial não exigiu reinterpretações e recodificações? Será que a predominância dessa silhueta empresarial não exigiu reinterpretações actualizadas, por parte dos sindicatos, sobre a conduta dos trabalhadores?
Os contextos produtivos e o fortalecimento do consumo caracterizaram o retábulo institucional do trabalho, cuja influência reincide na totalidade dos vértices de actuação do indivíduo. Os encadeamentos comerciais indumentaram-se de multilateralidade, e o trabalho passou a ser internacional e universal. Por sua vez, os projectos ao consumo e à própria produção tecnológica circunscreveram outro formato de gestão corporativa, que acabou também por influenciar algumas políticas do Estado. A central sindical é um órgão de representação que agasalha uma pluralidade de sindicatos com a finalidade de avigorar a sua actuação. Contudo, o seu envolvimento com o neoliberalismo provocou uma crescente, pardacenta e preocupante vulnerabilidade. As mudanças constantes no universo laboral e na realidade política do País nortearam os agentes sindicais a edificar estratégias flexíveis que poderiam conquistar novos imperativos do capital e as conveniências gerais das centrais sindicais. A vaga e a sinuosidade confinante às diligências tecnológicas arquitectadas para o presente século inauguraram inúmeros patamares de reptos para o próprio sindicalismo.
A crise dos sindicatos está profundamente associada à quebra das taxas de sindicalização e às greves; ao incremento dos índices de desemprego; à edificação de postos informais de trabalho; às metamorfoses ocorridas na superfície da produção; e à gradual individualização das correspondências de trabalho. As dissertações clássicas abordadas pelos sindicatos e concernentes centrais sindicais como garantia de emprego e ordenado mínimo, greves, aumento de salários, direitos dos trabalhadores e negociações colectivas constituem condições que acabaram por esbarrar no novo “padrão” de trabalhador, profundamente individualista e autónomo quanto às incalculáveis qualificações concebidas pelas descobertas tecnológicas. Será que a sociedade da informação não invadiu a contemporaneidade? Será que a mesma não deixou um deficit de produção à escala global? Será que não é necessário reflectir a crise enquanto placar da nova realidade social?
Realçar que o capitalismo sindical tem como finalidade manusear a oferta de movimentos do mercado corporativo, afastando do salário do trabalhador uma parte para ser investida em activos da sua própria entidade empregadora. Será que a economia capitalista não prevê a crise como parte do processo de desenvolvimento?
Na verdade, não se trata unicamente de afastar o Estado das conexões sindicais. O País necessita que o Estado abandone o controlo da actividade sindical, todavia deve interferir, ainda que epidermicamente, com aparelhos para contrabalançar relações estruturalmente desiguais como são as do tipo capital/trabalho. É essencial apresentar uma restruturação ou reforma que embrulhe o reconhecimento completo das centrais sindicais e das organizações nos locais de trabalho, assim como reforçar a legitimidade para negociar e eliminar a unicidade sindical. Será que o reconhecimento jurídico das centrais sindicais não está a ser historicamente negado? Será que não há um número exagerado de sindicatos? Será que não é necessária uma efectiva regulamentação para fins de negociação colectiva? Será que o sistema de liberdade sindical não apadrinhou alguns sindicatos indolentes? Será que não existem sindicatos que são autênticos tachos? Quais são os sindicatos que possuem legitimidade para negociar e assinar acordos colectivos de trabalho?
Como sabemos desfilam múltiplas incorrecções na competição, na concorrência e na direcção das empresas diante das quais a legislação que é responsável por garantir aos trabalhadores os direitos de sindicalização, convenção e negociação colectiva. A legislação pode auxiliar no restauro do equilíbrio, da harmonia e do comedimento, outorgando um “comando” mais venerado à classe trabalhadora e robustecendo a eficácia económica geral. Será que as afamadas centrais sindicais possuem natureza de entidades sindicais? Será que as mesmas não são unicamente associações de natureza civil?
Salientar que os instrumentos e agentes anárquicos sempre desfilaram em todos os campos da sociedade com reconhecida facilidade, assim como com a conivência e a impassibilidade displicente das instituições. Será que as diligências, mesmo quando se pretenderam fecundas, não foram incessantemente no sentido de desunir os homens? Será que os novos itinerários para o sindicalismo não solicitam e requerem que os sindicatos reformulem os seus comportamentos representativos?
A despolitização da população acabou por separar as conveniências públicas das missões e das metas promovidas pelos órgãos representativos da sociedade civil. Os sindicatos estão programados maioritariamente para operar com o empresariado e o Governo, congregando, desse modo, benefícios para a abóbada do poder. Descontente e insaciado, o trabalhador não identifica o sindicato como uma verdadeira entidade de defesa dos seus interesses, não se embrulhando nas mobilizações sindicais, por acreditar pouco na capacidade de negociação sindical reivindicatória.
O processo da globalização e a chegada de novas tecnologias criaram uma moderna configuração para o trabalho.