A pandemia da Covid-19 tem feito despertar a vontade de muitos em viver longe das grandes cidades e procurar zonas menos densificadas no interior.

Devido à pandemia da covid-19 o Governo estima, entre diversas outras medidas, uma queda do PIB de 6,9% este ano, e um crescimento de 4,3% em 2021, segundo o PEES-Programa de Estabilização Económica e Social, aprovado na quinta-feira dia 4-junho.


A resolução do Conselho de Ministros de quinta-feira passada 4-jun que aprovou este programa foi publicada no sábado à noite 2020-6-6 no suplemento do Diário da República (DR) e inclui o cenário macroeconómico 2020-2021, que não tinha sido apresentado na conferência de imprensa que se seguiu à reunião semanal do executivo. Entretanto, na sua reunião de terça-feira, dia 9 de junho, o Governo aprovou a proposta de Orçamento Suplementar relacionada com a Covid-19 que reflete o Programa de Estabilização Económica e Social a vigorar até ao final do ano. Esta alteração ao Orçamento do Estado, imposta pela pandemia, apresenta a resposta aos problemas económicos e sociais causados pelo novo vírus, e traduz-se num grande aumento da despesa pública e num grande decréscimo da receita fiscal. Vejamos algumas das medidas do Orçamento Suplementar. Para 2020, espera-se uma forte contração da economia portuguesa, consequência do choque económico provocado pela pandemia da Covid-19 e das medidas de contenção que foram implementadas. Neste contexto, prevê-se uma queda abrupta na taxa de variação real do PIB para 6,9%, a “maior contração de que há registo nas últimas décadas”, segundo o Governo. O impacto deverá ocorrer principalmente no 2º trimestre do ano, após a quebra de 2,3% já registada no 1º trimestre de 2020. Refira-se, a este propósito, que o crescimento do PIB em 2019 foi de 2,2%, segundo dados do INE. Segundo as estimativas apresentadas no PEES-Programa de Estabilização Económica e Social, a procura interna deverá cair 5,1% este ano e subir 3,8% em 2021 (em 2019, registou-se um aumento de 2,7%). A procura externa líquida deverá cair 1,8% este ano e subir 0,4 % em 2021 (em 2019 caiu -0,6%). Em 2021 espera-se uma recuperação significativa do crescimento do PIB (+4,3%), motivada por um aumento da procura externa e um maior dinamismo na procura interna, refletindo-se num contributo positivo do consumo privado e do investimento. A atividade económica deverá recuperar para os níveis registados antes da pandemia, com a exceção de alguns setores da economia. O turismo deverá ter uma recuperação mais lenta.


O cenário macroeconómico traçado pelo Governo indica ainda uma previsão de queda, este ano, de 4,3% no consumo privado e uma subida de 3,8%, em 2021. Esta queda de 4,3% segue-se a crescimentos superiores a 2% durante 6 anos consecutivos (2,2% em 2019). Já o consumo público, outra componente do PIB, deverá registar um crescimento de 3,1% em 2020 e uma descida de 0,8% em 2021. A redução, que deverá ser mais acentuada na componente de bens duradouros, reflete a diminuição esperada no rendimento disponível das famílias. No investimento, é estimada uma redução de 12,2% este ano e um aumento de 6,1% em 2021, evolução explicada por uma contração no investimento privado parcialmente compensada por um aumento do investimento público (em 2019 o investimento cresceu 6,6%, segundo o INE). Este cenário macroeconómico 2020-2021 foi publicado no suplemento do DR de 6-6 onde vem a resolução do Conselho de Ministros que aprova o PEES-Programa de Estabilização Económica e Financeira e inclui o referido cenário macroeconómico 2020-2021. Nesse documento, o Governo estima a referida queda do PIB de 6,9% este ano, devido à pandemia, e o crescimento de 4,3% em 2021, para além de uma taxa de desemprego de 9,6% este ano e de 8,7% em 2021 (em 2019 foi de 6,5% INE). A crise económica e social provocada pela covid-19 impôs um travão na trajetória de redução da dívida pública que tinha sido iniciada, devendo agora as novas projeções indicar qual a evolução esperada para este ano e próximos. No relatório “Perspetivas Económicas e Orçamentais 2020-2022”, divulgado em 03 de junho, o Conselho de Finanças Públicas (CFP) estima que a dívida pública deverá atingir entre 133,1% e 141,8% do PIB, ou seja, um aumento do rácio da dívida entre 15,3 e 24 p.p., respetivamente, a que se seguirá uma redução nos anos seguintes. Vejamos algumas medidas discriminadas.


O Orçamento Suplementar assegura à Segurança Social o acréscimo de despesa com prestações não contributivas resultante da resposta à covid-19, bem como a perda de receita pela isenção de Taxa Social Única (TSU) concedida às empresas que recorreram ao ‘lay-off’ simplificado. Esta isenção vai manter-se até ao final do ano para as situações de lay-off, mas apenas paras as micro, pequenas e médias empresas, sendo que mesmo estas começam a pagar 50% desta taxa a partir de outubro. Com a mesma intenção foi, entretanto, anunciada a criação de uma taxa especial sobre os bancos vão ter de pagar uma contribuição de solidariedade para ajudar a pagar “os custos da resposta pública à atual crise” sobre a banca (0.02%) no valor de 33 milhões de euros.
O Programa de Estabilização Económica e Social (PEES), prevê uma isenção total ou parcial do pagamento por conta do IRC em função da quebra de faturação observada pelas empresas durante o 1º semestre deste ano. Esta medida do Orçamento Suplementar, contempla uma redução de 50% daqueles pagamentos por conta para as empresas com uma quebra de faturação superior a 20% e uma isenção para as que registem quebras superiores a 40%. Há exceções a estes limites para as empresas do setor da restauração e do alojamento local, que vão beneficiar de isenção total independentemente da ordem de grandeza da quebra de faturação no primeiro semestre deste ano. Em rigor, segundo António Costa, não se trata de uma isenção do pagamento do IRC, que é calculado com base no lucro das empresas, mas de uma isenção sobre o adiantamento por conta do imposto que as empresas fazem e que é calculado com base no exercício do ano anterior.
O início da pandemia e a declaração do estado de emergência levaram o Governo a tomar um conjunto de medidas de apoio ao rendimento das famílias e à manutenção dos postos de trabalho, lógica que se mantém com o PEES que vai vigorar até ao final deste ano, ainda que nesta nova fase algumas medidas sejam descontinuadas e outras tenham sido ajustadas a uma nova realidade em que a maioria das atividades económicas já foi retomada. O custo de todas estas medidas está refletido neste Orçamento Suplementar. Em causa estão, entre muitas outras, o lay-off simplificado que vai vigorar até julho e a versão que se lhe vai seguir na segunda metade do ano, a prorrogação automática das prestações do subsídio social de desemprego até ao final do ano, a atribuição única, em setembro, de um montante, correspondente ao valor base do abono de família, para todas as crianças inseridas no 1º, 2º e 3º escalões. Também os trabalhadores que tiveram redução de rendimento vão contar com um apoio extraordinário único, pago em julho, de valor equivalente ao que perderam num mês de lay-off, entre 100 e 351 euros.
No âmbito do reforço do SNS a proposta de Orçamento Suplementar prevê a contratação de mais 2.700 profissionais de saúde até dezembro, bem como a integração dos 2.800 profissionais que foram contratados na fase de emergência.
O PEES prevê que o Governo investa 400 milhões de euros para assegurar a universalização do acesso e utilização de recursos educativos digitais, (por ex., a aquisição de computadores, conectividade e licenças de ‘software’ para as escolas públicas, ‘priorizando os estudantes abrangidos pelos apoios no âmbito da ação social escolar’). Este processo também vai incluir a desmaterialização de manuais escolares e a produção de novos recursos digitais, assim como a capacitação digital dos professores.

O Governo vai atribuir um apoio social aos profissionais, com atividades correspondentes às artes do espetáculo, que não sejam trabalhadores por conta de outrem. Vai ainda atribuir três milhões de euros para salas independentes de atividades culturais (por ex., salas de cinema, de espetáculos e teatros) para que possam retomar a atividade e 750 mil euros para adaptação das salas ao contexto da Covid-19.


O Governo vai criar um programa de inserção social de pessoas ditas ‘sem-abrigo’ através de projetos de ‘housing first’. Vai igualmente apoiar os programas das autarquias para converter fogos de alojamento local em habitações de arrendamento de longa duração a preços acessíveis.
As expectativas são extremamente negativas para o investimento e o comércio internacional. O primeiro deverá cair 12.2% este ano e crescer 6.1% em 2021 (em 2019 cresceu 6.6%). As exportações vão cair 15.4% este ano e 8.4% em 2021 (em 2019 cresceram 8.4%). Por sua vez as importações deverão ter uma queda de 11.4% em 2020 e um crescimento de 7% em 2021 (em 2019 cresceram 5.3%).


As perspetivas para o consumo privado são sombrias, com este macro-indicador para passar dos +2,2% em 2019 para os -4,3%. Numa tentativa de mitigar o impacto da crise, o Estado deverá reforçar a injeção de recursos na economia aumentando o seu consumo em dois pontos percentuais de 2019 para 2020, para os 3,1%. Esperando-se uma contração do consumo público em 2020 (-0,8%), ano em que o consumo privado estará de regresso ao crescimento (+3,8%).


O cenário para a inflação deverá ser o de deflação, ou seja, deveremos ter umas descida generalizada dos preços que, segundo a previsão do governo aponta para uma queda de 0,2%. A previsão da inflação para 2021 continuará a ser muito modesta de apenas 0,4%.


Já sem surpresa, a previsão para a evolução da taxa de desemprego aponta para uma aumento significativa, passando dos 6,5% em 2019 para um valor ligeiramente abaixo dos dois dígitos (9,6%). A projeção para 2021 aponta para uma retração lenta: uma queda de cerca de um ponto percentual face a 2020.


Como todas as previsões estas revelam um ponto central num intervalo de probabilidades que, em ambiente de crise global, será especialmente amplo. Há demasiado fatores relevantes com impacto direto e indireto na evolução do desempenho da economia nacional, tanto mais relevantes quanto nos últimos anos ficámos mais abertos ao exterior. A resposta à crise por parte de outros países e a eficácia das medidas europeias será extremamente importante a nível interno assim como a eficácia das medidas já implementadas bem como as que agora se projetam através do PEES.

Infelizmente, numa leitura ainda superficial poderá haver alguma apreensão justificada face à complexidade de modulação de algumas medidas. Muito dependerá da capacidade dos visados em a elas reagirem, as saberem interpretar e usar, bem como ao aparelho do Estado em as conseguir operacionalizar com o maior rigor, mas também com a menor complexificação burocrática e demora administrativa possível. O papel do Estado vai continuar a ser crítico nos próximos meses para mitigar o impacto e para dinamizar uma retoma com o menor dano possível, numa contexto único onde, recorde-se, quase toda a atividade económica esteve parada e onde ainda não é certa a evolução de médio prazo da pandemia.

E no Interior, o que está previsto para os próximos tempos?
Segundo a imprensa a pandemia da Covid-19 tem feito despertar a vontade de muitos em viver longe das grandes cidades e procurar zonas menos densificadas no interior. Com esse objectivo até foram criados alguns incentivos ainda antes de rebentar a crise do Covid’19. De facto, anteriormente o Governo tinha criado um regime de novos benefícios para quem quisesse mudar-se para o interior. Como referido no actual PEES, o Governo pretende criar espaços de trabalho partilhado que ajudem a atrair novos trabalhadores para as cidades do interior. Para isso, decidiu reforçar os apoios, destinando 20 milhões de euros à criação de espaços de cowork (trabalho partilhado) no interland. Há também um apoio à contratação em regime de teletrabalho nestas zonas do país no valor de 219 euros por pessoa. Esta medida pretende reduzir as desvantagens do teletrabalho e consta do PEES. É financiada com fundos europeus, através do FEDER – Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional. Para instalar estes espaços de cowork é pedido o envolvimento dos municípios e as infraestruturas tecnológicas locais existentes. A implementação destes espaços tem (espera-se) elevado potencial de captação dos novos nómadas digitais e de millennials, entre outros, e promove a prática do teletrabalho, em especial nas cidades e regiões do Interior, refere o PEES publicado em Diário da República em 6-6-2020. Estes espaços de trabalho partilhado têm, entre outros objectivos, reduzir as desvantagens do teletrabalho, nomeadamente o isolamento, que é, frequentemente, um fator de desmotivação, e estimular a partilha de experiências, ideias, bem como dinamizar a economia local.
Depois da aprovação, na reunião do Conselho de Ministros de terça-feira dia 9-jun, a proposta de alteração ao Orçamento será discutida na Assembleia da República e na generalidade em 19 de junho. A data da votação final global do documento ainda não foi fixada, pois dependerá da forma como decorrerem os trabalhos na especialidade.