Contemporaneamente a movimentação de bens, pessoas e conhecimentos alberga uma espessura jamais observada em outro estádio da biografia humana. A conduta das organizações está centrada na racionalidade e eficiência dos fluxos materiais e imateriais.

Será também profícuo afirmar que a logística tem sido um instrumento corporativo convincente de fiscalização desses mesmos fluxos, bem como um “acessório” que consagra superiores índices de competitividade às empresas, às regiões e obviamente às populações. A palavra logística germina no âmago da disposição militar, tendo sido empregue como uma espécie de estratégia para que os “vértices” teóricos e práticos estivessem prontos no tempo e no local combinado.
A realidade patenteia que as organizações foram coleccionando o vocábulo logística, edificando um moderno arquétipo produtivo através da gestão e do incremento dos fluxos. A logística empresarial compreende o conjunto de actividades de circulação e armazenagem que acabam por desimpedir o transporte de produtos e informações. Estas “torrentes” são as responsáveis por a colocação dos produtos em movimento, com a finalidade de promover, a um preço comedido, vantajosos modelos de “serviço” aos fregueses. Neste contexto, o termo logística deve ser degustado como um conceito astucioso que contribui significativamente para o aumento da competitividade e produtividade, e para a consequente e posterior internacionalização empresarial.
As movimentações produtivas no espaço geográfico estão profundamente ligadas ao planeamento e organização dos transportes. O desenvolvimento dos sistemas económico e financeiro reivindica o “alargamento” dos perímetros espaciais de produção. Neste sentido, reforça-se a indispensabilidade da existência de um efectivo plano de infraestruturas que proporcione a incorporação de todas as fases de produção, ou seja um autêntico elo de ligação entre fornecedores, empresas e consumidores finais.
Por ser um dos requisitos de produção mais importantes para a multiplicação de capital, o funcionamento do circuito produtivo está vinculado à orgânica dos transportes e à “disponibilidade” do território.
A introdução de novas portagens foi uma medida visceralmente perniciosa e inadequada para as populações. Pode mesmo ser considerada como uma veemência, um atentado ou um sacrilégio à economia. Actualmente não existem opções a estas vias rodoviárias estruturantes, uma vez que as estradas nacionais (EN) se encontram num ininterrupto estado de degradação. Em alguns casos as mesmas já não existem ou são unicamente “ruelas” de algumas localidades. Os próprios traçados de algumas auto-estradas são bastante sinuosos e agasalham declives carregados. Logo, não será justo taxar portagens em vias, que apesar de agasalharem estruturas muito superiores às EN, ainda ficam muito longe da qualidade de outras.
As empresas, sem a obrigatoriedade do pagamento das portagens, foram segmentando o seu encadeamento produtivo e procurando benefícios comparativos que a área geográfica pudesse oferecer. O desenvolvimento empresarial no espaço geográfico apela à celeridade e aos custos mais reduzidos, em detrimento do tempo “comum”.
O pagamento de portagens acarreta um significativo acréscimo do custo de vida e oferece uma tela repleta de dificuldades às empresas, agravando a conjuntura económica e social das regiões mais desfavorecidas. Por exemplo, no interior do País o poder de compra da população fica muito aquém da média nacional. O pagamento de portagens contribuiu para o aumento do desemprego nestas regiões, bem como para elevar os índices de “interioridade” e desertificação. O aumento da sinistralidade também é uma certeza, já que muitos cidadãos, mesmo não gozando de vias alternativas condignas, se sujeitam aos caminhos de cabras, uma vez que não podem de maneira nenhuma pagar valores tão exorbitantes como são os das portagens.
A coragem e o empenho empresarial vão esbarrando nas imperfeições das próprias infra-estruturas de transportes e de comunicações que ainda hoje desfilam pelo País, assim como nas políticas públicas desastrosas. Portugal necessita de efectivas políticas públicas que impulsionem, de uma vez por todas, o desenvolvimento económico, o aumento da competitividade empresarial, o incremento da riqueza e o consequente emprego.
Cavaco Silva, um dos primeiros “mágicos de cores” a vender sonhos aos cidadãos portugueses, jamais devia ter promulgado a legislação que permitiu a importação das portagens. De salientar que o Governo de Cavaco Silva coincidiu não só com a entrada de Portugal na Comunidade Europeia, como também com a chegada dos primeiros fundos estruturais. Infelizmente Passos Coelho e Cavaco Silva esqueceram-se que é de extremo mau gosto saquear ou atacar indigentes, como são os portugueses, principalmente aqueles que vivem nas regiões do interior.
António José Seguro, na altura, resistiu aos desejos de alguns antigos governantes agora disseminados na sua bancada parlamentar, no entanto mostrou-se inócuo na hora de se desembaraçar da obscura viela em que se encaixou. Seguro ficou nos “retratos” do Governo como um homem honesto e cândido.
As autoestradas que redesenham o destino dos nossos descendentes são as da pobreza, do desemprego e do afastamento. Com bastante fundamento alega-se que os políticos são eleitos, no entanto são os trabalhadores que “administram” o poder económico e financeiro, e sofrem no dia-a-dia os disparates prescritos por esses iluminados. O Estado por diversas vezes convive com ideologias completamente desacertadas, enquanto a economia e as populações convivem com a realidade. As maiores tragédias humanas foram encetadas pelo poder político, na altura em que se auto-intitulou de redentor. As populações não acreditam em milagres, todavia esperam das forças políticas elevadas doses de trabalho, dedicação, inteligência e equidade.
O Governo não reverenciou o seu próprio prospecto, na medida em que ficou definido que as portagens somente seriam implementadas caso se verificassem dois critérios: os indicadores socioeconómicos superiores ou iguais à média nacional; e a existência de vias alternativas. Os portugueses por um lado estão fartos de mentiras e de governantes incompetentes, por outro precisam de libertar o cérebro do stress das contas e das notícias agressivas.
Passo Coelho, longe de ser um líder carismático, tem constantemente apresentado caracteres de incompetência e desconhecimento da realidade. A arrogância e o “iluminismo” das maiorias absolutas provocam arrumações escarpadas. As teias da democracia apelam à íntegra comunicação e explanação das posições, assim como ao profícuo empenhamento. Caso esta condição não desabroche, a maior parte dos cidadãos acabará por se tornar presa “espontânea” dos prospectos populistas e demagógicos. As cinzas escaldantes que inundaram Portugal conjecturam a mediação e intervenção do Estado como forma de repreender as deformações “induzidas” pelo mercado económico. Com o País altamente endividado e sóbrio em recursos, é difícil entender como se custearam estas políticas tão infelizes. Convém lembrar que o alívio da pobreza reclama por medidas que não excluam os menos favorecidos.
As anomalias existentes nas “infraestruturas” rodoviárias compreenderam principalmente três tipos de arrumações: os desequilíbrios e reequilíbrios financeiros; os cânones de contratação fortemente embaraçados; e a franzina fiscalização. O aparecimento destes obstáculos está intimamente associado: à inexistência oportuna da avaliação ambiental; às inúmeras parcialidades existentes aquando das expropriações; aos parcos programas políticos; aos imperfeitos cadernos de encargos; aos acanhados calendários políticos; à franzina elaboração técnica dos concursos; à falta de amadurecimento das experiências e saberes adquiridos; às modificações unilaterais dos acordos; e às exiguidades existentes na estruturação e disposição dos serviços do Estado. Contudo, isto não revoga o que anteriormente foi escrito, reforçando mesmo a teoria, mais que confirmada, de que as “políticas de imposto” aplicadas às auto-estradas retiram competitividade a um determinado espaço geográfico, assim como aos agentes económicos e às cadeias produtivas que embelezam o mesmo.
As portagens aconchegam vestígios do tempo dos senhores feudais, período em que era obrigatório pagar às portas das urbes. Infelizmente, e de certa forma, os costumes da Idade Média têm-se conservado. A correspondência entre a mobilidade, as acessibilidades e os sistemas de transporte aconchega uma posição fundamental nas políticas de crescimento. A mobilidade, em itinerários mais extensos, veste a camisola das deslocações velozes e seguras. As acessibilidades não portajadas permitiam o crescimento de economias de “acumulação” e de escala, assim como uma superior interacção geográfica nas regiões menos favorecidas. O nível de vida das populações depende de um conjunto de partilhas, mais equitativas e equiponderadas, da riqueza e das oportunidades.
Portugal conviveu durante muitos anos com infraestruturas rodoviárias desapropriadas para um autêntico aperfeiçoamento do mercado interno e externo. O turismo, que alberga ocupações laborais directas e indirectas, não se desenvolve sem estradas ou com estradas portajadas. Com o pagamento das portagens ressuscitaram-se os longos e pardacentos períodos de estagnação que o País já saboreou.
As isenções, tão apregoadas pelo Governo, não passaram de reles rebuçados que tentaram adormecer os cidadãos, uma vez que num curto espaço de tempo deixaram de ser praticadas.
Infelizmente assistimos a um interminável número de notícias relacionado com a exorbitância das multas que são cobradas por atrasos no pagamento de portagens. As multas nas portagens saltaram para a agenda mediática. Este facto já levou a Associação Portuguesa de Direito do Consumo a comunicar que vai instaurar uma providência cautelar contra o sistema de pagamento electrónico. Há inúmeros casos em que as multas são desproporcionadamente mais altas do que a própria dívida. Os grupos parlamentares do PSD e do CDS, pressionados pelos partidos da oposição estão a preparar uma proposta legislativa que ponha um freio a esta situação lamacenta e possivelmente inconstitucional. O PS, por sua vez, retomará uma proposta já apresentada na circunferência da proposta de Orçamento do Estado para 2015, que prevê que o valor total das multas não possa suplantar cinco vezes o valor inicial da portagem. Será que o Estado não deve obrigar as concessionárias a contactar previamente o infractor, para notificá-lo da dívida e dar-lhe uma oportunidade para a regularizar, antes de o caso transitar para o Fisco? Será que é legítimo, em infinitos casos, a multa ser muitíssimo superior ao próprio valor em dívida? Será que a cobrança das portagens deve escoltar as regras do processo executivo, ou seja o mesmo que o Fisco usa para cobrar dívidas de impostos? Será que esta situação não é indigna? Será que esta conjuntura não contribui para o aumento da torrente de litígios nos tribunais? Será que o Estado não rouba desavergonhadamente? Será que as multas por pagar não podem ser anuláveis?
A população, que apela constantemente à justiça, não quer ser ludibriada, não pretende usufruir de óbolos e dispensa as constantes falácias proferidas por Passos Coelho. Está nas mãos dos portugueses, o patrocínio dos movimentos de contestação, para que os mesmos possam progredir para formatos bastante mais incisivos daqueles que já existem. Atravessamos uma época em que as pessoas desejam uma revolta a sério e a verdade é que têm toda a legitimidade para a fazer. Inconsequentes governantes nunca se esqueçam que o coração aperta e desperta quando o “soldado” sobe à boca, e que o povo português está cansado de aquecer os ouvidos com canções roucas e loucas.